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CM Entrevista: “A IA deve amplificar o melhor, e não apenas o mais frequente da humanidade”

CM Entrevista: “A IA deve amplificar o melhor, e não apenas o mais frequente da humanidade”

Benito Berretta, diretor geral da Hyper Island nas Américas, traça uma análise profunda sobre os avanços da IA em personalização emocional

“Uma IA que erra parece uma contradição, mas talvez seja o único caminho para seguirmos em frente.” Essa é afirmação de Benito Berretta, diretor geral da Hyper Island nas Américas, sobre o potencial das IAs emocionais para o Customer Experience (CX).

Especialista em inovação, neurociência do aprendizado e gestão de mudanças, Benito entende que o grande desafio sobre os avanços da Inteligência Artificial generativa em personalização, não é apenas entregar respostas certas, mas interpretar emoções.

Dito isso, Benito ressalta que sistemas de IAs emocionais criam um paradoxo. “Ao adotar performances algorítmicas de empatia, arriscamos amputar exatamente o motor da evolução coletiva: a falibilidade humana. Não há aprendizado sem ruído.”

Empresas não serão construídas apenas com dados

Utilizando-se do termo “Lei da Adaptabilidade” – no qual Benito descreve a importância da adaptação, com bases em neurociência, gestão empresarial e biologia –, o especialista provoca o pensamento amplo sobre o futuro que queremos com a IA.

Um futuro que, segundo ele, empresas pressionadas pela eficiência e escalabilidade podem se ver tentadas a substituir a imperfeição vibrante da comunicação humana por avatares emocionalmente corretos, porém, emocionalmente vazios. “A construção de empresas modernas, competitivas e significativas não será feita apenas com dados, mas com espaços de confiança, vulnerabilidade e inovação coletiva.”

A seguir, Benito aprofunda a sua análise sobre o impacto das IAs emocionais na construção de estratégias significativas para CX. Confira!

Autenticidade emocional da IA

Consumidor Moderno: Como você avalia os principais desafios com IAs avançando em personalização emocional?
Benito Berretta, diretor geral da Hyper Island nas Américas.

Benito Berretta: O avanço da personalização emocional por sistemas de IA representa, ao mesmo tempo, uma inflexão estrutural nas relações entre humanos e máquinas. É um paradoxo que muitas vezes nos deixa perplexos. Avançamos para uma era em que o desafio não é apenas entregar respostas certas, mas interpretar emoções, modular o tom, simular empatia.

Esse movimento, embora fascinante do ponto de vista técnico, tensiona uma fronteira essencial: a da autenticidade. Quando escrevi a “Primeira Lei da Adaptabilidade (‘se você contribui, pode ficar’)”, o ponto central da verdadeira adaptabilidade reside na coexistência entre conexão e contribuição. 

Ou seja, a IA, ainda que reconheça padrões emocionais, não supera o território de uma conexão simulada, sem a substância histórica da contribuição real. O principal desafio não é apenas gerar respostas “aparentemente” afetivas, mas preservar o espaço para o encontro humano autêntico, que carrega não apenas sinais emocionais, mas também memória, cultura e contradição.

CM: O caso da Yepic AI (com avatares que reconhecem emoções faciais para personalizar interações com humanos) sugere que a autenticidade é o novo critério de qualidade em IA?

O caso Yepic AI materializa de forma clara essa nova fase. Avatares emocionalmente responsivos, capazes de interpretar microexpressões e adaptar sua comunicação em menos de 500 milissegundos, marcam um avanço na qualidade. Mas, ainda não chegam a passar o limiar da autenticidade. Ou seja, a simulação convincente pode se tornar um critério de qualidade maior. No entanto, é fundamental entender em termos sistêmicos: Yepic AI atinge a condição necessária para parecer autêntico, mas não a condição suficiente para ser autêntico.

A Segunda Lei da Adaptabilidade esclarece: estamos fadados ao fracasso individual e ao sucesso coletivo​. A autenticidade emocional real é construída no tempo, no tecido imperfeito que forma nossa fábrica ontológica, em redes de relações significativas, não em respostas programadas ou preditivas. Yepic AI resolve o problema do “sinal”, mas a “realidade” emocional permanece fora de alcance. O significado vai além da interação, ele fica intransmissível.

CM: Isso aponta um risco real de as empresas substituírem a autenticidade humana por performances algorítmicas de empatia?

Mais do que um risco. Trata-se de uma tendência silenciosa. Empresas, pressionadas pela eficiência e escalabilidade, podem se ver tentadas a substituir a imperfeição vibrante da comunicação humana por avatares emocionalmente corretos, porém emocionalmente vazios. Ao adotar performances algorítmicas de empatia, arriscamos amputar exatamente o motor da evolução coletiva: a falibilidade humana. Não há aprendizado sem ruído. Não há profundidade sem hesitação. A Terceira Lei da Adaptabilidade é clara: adaptabilidade é um jogo de volume​. O sucesso não é função da precisão isolada, mas da repetição, da falha e da reconstrução inteligente.

Sobre ética e os novos parâmetros com IA

CM: O ser humano, muitas vezes, falha individualmente. Mas, na grande maioria das vezes, prospera coletivamente. Como isso se aplica ao desenvolvimento de IAs que replicam vieses humanos e estão sendo cada vez mais adotadas em áreas como recrutamento e gestão de desempenho?

A replicação de vieses em sistemas de IA é o espelho tecnológico das falhas humanas. Quando sistemas de IA são treinados com dados históricos, eles herdam e às vezes amplificam nossos preconceitos inconscientes. Superar isso exige mais do que ajustes técnicos. Exige inteligência coletiva, curadoria ética contínua, diversidade real nas equipes que constroem e auditam esses sistemas. É no enfrentamento intencional dessas falhas, em coletivo, que reside a esperança de uma IA que amplifique o melhor, e não apenas o mais frequente, da humanidade. 

Dilemas na liderança com IA

CM: Como preparar líderes Baby Boomers e da Geração X para gerenciar equipes que operam em simbiose com a IA generativa, enquanto Millennials e GenZs demandam uma ‘human-first tech‘? Você vê risco de um “apartheid digital” nas organizações?

A transição necessária é mais profunda do que treinamento técnico. Trata-se de uma reconfiguração ontológica da liderança. A Primeira Lei da Adaptabilidade lembra que a permanência em sistemas vivos depende da capacidade de contribuição​. Líderes que não forem capazes de integrar conexão emocional genuína e contribuição cognitiva relevante terão dificuldades progressivas, não por decreto, mas pela dinâmica inevitável dos sistemas adaptativos.

Porém, o risco de um apartheid digital, do meu ponto de vista, é baixo, mas possível. Um fosso entre líderes que entendem a IA como extensão da capacidade humana e aqueles que a veem como ameaça ou mera ferramenta me pareceria um evento surpreendente, mas esse mundo atual é imprevisível.

CM: Um dos grandes desafios para a próxima década será conciliar algoritmos e humanização. Como isso impacta o líder empresarial hoje, e como deve ser a sua abordagem na construção de empresas modernas, competitivas e mais significativas para seus clientes?

O impacto é profundo e definitivo. A Terceira Lei da Adaptabilidade oferece o melhor guia: adaptabilidade é um jogo de volume​. Não vencerá o líder que tentar controlar todas as variáveis. Vencerá aquele que fomentar ciclos rápidos de aprendizado, que aceite o erro como parte constitutiva da evolução.

O líder moderno precisa construir empresas onde algoritmos ampliem capacidades humanas, sem tentar substituí-las. Onde a eficiência seja um meio, mas o valor humano seja o fim. A construção de empresas modernas, competitivas e significativas não será feita apenas com dados, mas com espaços de confiança, vulnerabilidade e inovação coletiva. Onde a inteligência das máquinas organize o caos, mas onde o caos humano continue sendo a semente da reinvenção.

CM: Temos um futuro com IA intrigante pela frente.

O futuro da Inteligência Artificial não será definido apenas pelo que conseguimos ensinar às máquinas, mas pelo que conseguimos lembrar sobre nós mesmos. Adaptar-se não é imitar a perfeição algorítmica. É aceitar que a nossa imperfeição – coletiva, mutável, contraditória – é nossa única verdadeira vantagem evolutiva. A IA poderá escalar sinais emocionais. Mas só nós, humanos, podemos escalar significados.

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