Dia 15 de setembro é o Dia do Cliente, data importante para refletir sobre a inclusão e o respeito às diversidades. Reconhecer que cada cliente vem de uma origem única é fundamental. A diversidade enriquece nossas interações e nos ajuda a entender melhor as necessidades de todos.
Portanto, celebrar o Dia do Cliente é reconhecer que cada pessoa tem suas próprias necessidades e expectativas. Vale lembrar que as empresas que adotam uma abordagem inclusiva não apenas conquistam a confiança de seus clientes, mas também promovem um ambiente mais equitativo. É fundamental entender que cada interação comercial é uma oportunidade para valorizar as singularidades de cada grupo, criando laços mais fortes e duradouros.
Do lado das empresas, essas devem se esforçar para ouvir e compreender as demandas de todos os seus clientes, desenvolvendo produtos e serviços que atendam às particularidades de cada grupo. Da parte dos clientes, é fundamental que esses exijam práticas que garantam a igualdade de tratamento a todos, independente de raça, origem ou condição social. E da parte governamental, o que está sendo realizado?
Clientes negros
No ano passado, a Secretaria Nacional do Consumidor (Senacon) emitiu a Nota Técnica nº 14/2023. O documento estabelece diretrizes relacionadas à proteção dos consumidores negros.
Em suma, a Nota Técnica aborda a definição de racismo estrutural, com uma contextualização histórica e exemplos práticos de situações envolvendo racismo e clientes, citando precedentes judiciais que tratam da responsabilidade civil nas relações de consumo em casos de racismo estrutural.
Em entrevista à Consumidor Moderno, a advogada Thais Matallo, sócia da área de Direito das Relações de Consumo do Machado Meyer Advogados, explica o teor da norma. “A Nota Técnica nº 14/2023 analisou as consequências do racismo nas relações de consumo e trouxe uma série de diretrizes que o Ministério da Justiça deve observar na edição de eventual portaria, a fim de ampliar a discussão do tema na sociedade brasileira. Não se trata, portanto, de lei que vincula o Poder Público ou empresas a determinadas ações, mas de recomendações e diretrizes. O objetivo, portanto, é dar melhor tratamento ao tema”.
O referido documento coloca que o desenvolvimento da população negra no Brasil se deu no contexto da escravização mercantil e, mesmo após a sua abolição, as raízes de um Estado escravocrata fundado na desigualdade entre raças não desapareceram completamente.
Racismo estrutural
Danielle Iglesias, também especialista em direitos do consumidor e sócia da área de Direito das Relações de Consumo do Machado Meyer Advogados, comenta que o racismo estrutural, portanto, é uma realidade da sociedade brasileira. “E é nesse contexto que é reconhecida a vulnerabilidade da população negra. Essas pessoas têm sido destinatárias de políticas públicas que visam justamente reduzir a desigualdade que afeta essa parcela da população. Só para exemplificar, destaque para a criação das cotas raciais nas universidades públicas”.
Nesse cenário, tanto Danielle quanto Thais pontuam que o racismo, como estrutura, pode afetar, também, as relações empresa-cliente e cliente-empresa. Portanto, elas consideram de suma importância reconhecer a vulnerabilidade dos consumidores negros. “Em suma, isso traz ao Poder Público a responsabilidade de tomar medidas que busquem garantir os seus direitos básicos. E não somente aos negros, mas também para outros segmentos vulneráveis da população, como idosos, crianças, pessoas portadoras de deficiência, indígenas, mulheres, LGBTQIA+, entre outros”.
Direitos do consumidor
A norma governamental estipula que as empresas devem contar com a participação efetiva da pessoa negra consumidora nas decisões, sendo essencial que essas pessoas sejam representadas e tenham voz ativa em órgãos e instâncias de defesa dos direitos provenientes das relações de consumo. Segundo o governo, isso assegurará que as políticas de proteção sejam sensíveis às necessidades e interesses dessa parcela da população.
Além disso, a regra estipula uma comunicação publicitária que não promova o racismo. Ao ser questionada se, do ponto de vista legislativo, essas diretrizes são suficientes para coibir o racismo nas relações de consumo, Thais Matallo é enfática: “Tais diretrizes certamente são importantes como um passo para garantir que a população negra se veja representada em órgãos de defesa dos direitos do consumidor e sua opinião seja efetivamente considerada na implementação de políticas que visam coibir o racismo e a discriminação racial”.
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Ela considera que a Norma, portanto, dialoga com a necessidade de comunicação publicitária que não incite ou reforce o racismo, sendo esse apenas mais um dos cenários em que a população negra pode ser afetada. “Contudo, como essa não é a única área em que a pessoa negra pode sofrer discriminação, é necessário que sejam observadas também outras diretrizes. O ideal é buscar garantir o pleno conhecimento da pessoa negra à respeito de sua posição na sociedade, a observância de seus direitos constitucionalmente previstos, principalmente à igualdade e à dignidade, e a implementação, pelos órgãos de proteção do consumidor (aqui também compostos de pessoas negras), de ações afirmativas para fomentar a igualdade e o combate à discriminação racial nas relações de consumo”, pontua Thais.
Já Danielle Iglesias, ao complementar o raciocínio da sócia, enfatiza que, nesse cenário, e do ponto de vista das empresas, se faz importante que elas adotem, quando aplicável, paralelos que se adaptem às suas políticas internas. “O propósito é fomentar a participação de pessoas negras em seus processos seletivos. Isso além de garantir, no caso de fornecedores de produtos ou serviços, condições igualitárias de acesso e preço justo“.
Por fim, elas chamam atenção para que o Dia do Cliente sirva como um lembrete para todos nós. “Ao valorizar a diversidade, estamos também construindo um futuro mais inclusivo e capaz de respeitar a pluralidade que compõe nossa sociedade”.