Se em um passado recente o mais importante para as empresas era coletar os valiosos dados em grandes volumes, o paradigma atual mudou. O importante é obter valor dessas informações, ou seja, transformá-las em valor prático para colaboradores e cliente final – o que tem desafiado gestores de diferentes áreas das empresas, inclusive CX.
O tema foi tratado em um painel realizado durante o CONAREC 2024, em São Paulo, capital. Chamado “O engajamento começa nos dados: transformando insights em ações”, o debate foi mediado pelo professor Samir Nassif Palma, da ESPM.
Um exemplo bem prático foi dado por Evaristo Mascarenhas, CEO da Robbyson, empresa dona de uma plataforma que coleta dados sobre engajamento de colaboradores e é usada principalmente por departamentos de recursos humanos. “É uma informação importante para saber como está um time técnico de campo ou de call center, por exemplo. Com outros dados da operação que podemos colocar nessa panela descobrimos uma série de coisas, como absenteísmo e turnover”, explicou.
Rodrigo Villela, VP de dados da Mastercard Brasil, chamou atenção para outra questão fundamental. Saber que dados coletar e como usá-los passa por ter um objetivo de negócio bem definido. “Se olhar para tudo você vai se perder”, disse ele.
Na Mastercard, os dados têm sido usados de diversas formas, mas a aplicação de maior destaque é o combate à fraude. “Usamos [os dados de] transações, e aí conseguimos ver padrões bons ou ruins. Temos o trabalho de entender o comportamento [dos consumidores] e identificar as operações fraudulentas”, explicou o VP, que tem usado dados em projetos também com clientes.
Vitor Miguel, VP de Data & Business Growth da agência de publicidade WMcCann, fez coro com os outros painelistas. Para ele, os dados precisam gerar “acionáveis” para terem valor. E ter a capacidade de identificar um dado e gerar resultados é, para ele, o que caracteriza um bom profissional. Mas isso não pode ser atribuição de uma única pessoa ou área.
“O dado não tem que ser da área de BI ou mídia, mas de todo mundo. Como saber que o texto A funciona com B ou carro azul com verde? Essa interação multidisciplinar consegue transformar uma a empresa em data driven. Eu estou muito bem na minha área, obrigado, mas como espalhar essa cultura para todo mundo?”, questionou.
A questão da cultura apareceu fortemente no debate. Evaristo Mascarenhas diz que alcançar o data driven corporativo é uma missão atual tanto para a Robbyson como para os clientes. E que o primeiro passo é respeitar a legislação local, algo “inegociável”, e depois dar aos colaboradores a possibilidade de usar dados no dia a dia.
“Não pode haver uma área da empresa concentradora de todos os dados e que vai iluminar a empresa. Todo mundo precisa fazer pequenos experimentos, usar IA generativa, que hoje dá possibilidade de analisar alguns dados. Isso tem que permear a organização como um todo”, ressaltou.
O executivo da WMcCann concordou e deu exemplos do trabalho que vem fazendo na agência. Segundo Miguel, o objetivo atual é usar dados preditivos, ou seja, para “entender quanto vou vender amanhã, na Black Friday e no ano que vem”. A empresa trabalha em modelos e os está disseminando em diversas áreas.
“O outro [caso de uso] é usar o dado em mídia e ativação para personalizar a jornada. Com a Chevrolet, começamos a entender o momento de vida de cada cliente para personalizar a comunicação de um carro. Para um casal que vai ter um filho, vou oferecer um SUV enfatizando espaço interno e o porta-malas, por exemplo”, explicou. “Eu sozinho em dados e mídia não consigo, preciso disseminar isso para a criação e outros departamentos.”
Treinamento e capacitação
Outro ponto crítico na criação de uma cultura data driven é capacitar os profissionais para que possam de fato fazer uso prático de dados. Mascarenhas tem investido em trilhas de desenvolvimento para pessoas que lidam especificamente com dados, o que é, segundo ele, “complexo e precisa ser completo”. “Temos que ir muito no detalhe”, disse.
Além do treinamento, a Robbyson tem apostado em contratar profissionais com qualificação, mas mesmo esses precisam de treinamento sobre os usos internos dos dados que a companhia tem feito. Um trabalho de cultura de dados com o resto da companhia também tem sido executado.
“Temos uma equipe diversificada de dados muito vinculada a BI, mas também temos engenheiros, cientistas de dados, profissionais de social para entender o comportamento do usuário. (…) Mas o que todos têm em comum é a curiosidade. É mais sobre fazer as perguntas certas”, disse o VP da WMcCann.
Rodrigo Villela, da Mastercard, concorda com o tamanho do desafio. Segundo ele, o time que mais crescer na empresa nos últimos anos foi o de dados. “Temos uma necessidade técnica (…). Esse time foi o que mais cresceu, o que presta serviços de dados, olhando os nossos e os clientes”, disse.
Mas ele também ressaltou o papel da curiosidade e do entendimento do negócio. “Se [o profissional] entende do negócio, ele faz as perguntas certas e faz o time especialista buscar as respostas certas”, ponderou.