Os consumidores, em âmbito global, enxergam a evolução da tecnologia, particularmente da automação, com ceticismo. Millennials à frente, não são poucos os que acreditam que qualquer nova tecnologia traz mais armadilhas que praticidade e benefícios reais. Nesse contexto, faz sentido para o varejo buscar aplicar tecnologia de ponta em suas operações de tal forma que a promessa de melhorar a experiência e aumentar a satisfação do cliente se concretize? Daniel Kolesnikov, Head de Marketing da Yandex, que desenvolve a assistente pessoal Alice, Eoin Harrington, Vice-presidente sênior da Pearl, Deborah Weinswig, CEO da Coresight Research e Ken Wong, diretor geral da Chow Tai Fook enfrentaram essa polêmica no World Retail Congress e mostraram que a combinação de arte e ciência pode inocular humanidade na tecnologia, particularmente nos sistemas de IA e comando de voz.
Poucas empresas estão mais habilitadas a falar sobre esse assunto do que a Pearl, de Eoin Harrington. Ele é um dos maiores especialistas em plataformas digitais do mundo. Seu time ajudou empresas como Apple, Google, Uber e Square e hoje se dedica a construir o maior showroom global de tecnologias que permitam aos consumidores resolverem suas necessidades de consumo com apenas um clique. Kent Wong está à frente da operação de uma rede de joalherias sediada em Hong Kong e com filiais no Sudeste Asiático, todas elas embarcadas com alta tecnologia. Segundo o executivo, seus clientes podem fazer compras de joias – artigos de grande complexidade e alto valor – comprovando proveniências das matérias-primas e tornando o desejável acessível on-line.
Já Daniel Kolesnikov, é um entusiasta das soluções de voz, que estão no momento de adoção inicial. Somente 3,9% dos consumidores americanos que já fizeram compras usando assistentes de voz, repetiram o procedimento. Isso porque ainda existem lacunas significativas na compreensão desses dispositivos para facilitar as compras. O entendimento da linguagem ainda não é totalmente natural e não responde às mesmas requisições feitas de maneira diferente, diz o executivo. Uma coisa é pedir uma compra, outra é pedir a mesma compra limitando o valor a ser pago. Essa simples adição de informação inibe o desempenho dos assistentes de voz.
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Personas e personalidades
A Chow Tai Fook utiliza sistemas avançados de Inteligência Artificial para identificar corretamente as necessidades dos clientes, trazendo informações que permitem refinar continuamente a jornada do cliente, para que ela se amo-lhe cada vez mais à uma atitude natural e intuitiva. Esse patamar de uso de tecnologia é parte do core business da Pearl. São os sistemas da empresa que permitem escolher quartos de hotel e mudar reservas de maneira simples, colaborando para que os colaboradores das empresas trabalhem melhor. A personalização prometida pelos sistemas digitais não abre mão de sentidos humanos, dos insights pessoais, das sensações particulares que caracterizam o fator humano.
Daniel afirma que essas dificuldades fazem parte do cotidiano do desenvolvimento de Alice. Um assistente de voz precisa na verdade assumir personas diversas, que emulam personalidades diferentes, com vozes próprias, particularidades, senso de humor, gradações emocionais para se amoldar ao cliente. Alice hoje possui um cardápio de 8 vozes à escolha do cliente o que abre muitas oportunidades no mercado varejista. Na maior parte do tempo, o consumidor faz questão de expressar alguma emoção quando fala com uma empresa. Kent Wong destaca como agimos quando acessamos um call center: queremos que o agente humano entenda nossa demanda e nosso estado de espírito. Para ele, sistemas de automação podem realmente ser treinados para “demonstrar empatia” ao identificar a emoção do cliente.
Automação emocional
É interessante especular como será o futuro dos espaços públicos, organizados e monitorados por sistemas de automação, o quanto as pessoas poderão se sentir seguras, obter informações mais facilmente ou então, simplesmente serem vigiadas. Colocando o consumidor mais jovem em perspectiva, é evidente que esse grupo passa mais tempo no smartphone do que dormindo e que seu comportamento de compra on-line se reflete nas lojas físicas.
A Chow Tai Fook instalou um quiosque com um monitor gigante no fundo das lojas. Ele traz produtos que só podem ser vendidos on-line e adquiridos nesse quiosque. Dessa forma, com o auxílio humano ou de modo automático, um cliente pode ter uma experiência intensamente digital dentro do espaço da loja física. A tendência inevitável é que a automação e a tecnologia se desenvolvam assimilando a compreensão das emoções humanas nos diferentes pontos de contato. A jornada do cliente será redesenhada contemplando pontos nos quais, a assistência de robôs será preponderante enquanto houver outros onde a empatia humana será decisiva. Sistemas automatizados poderão recriar o mundo real, enquanto a atividade humana trará o contato confortável que precisamos em situações que envolvam maior alcance emocional. Falamos de uma automação emocional, capaz de entender e responder às nossas inquietações.
Quando olhamos para o cenário geral das empresas, no qual a maior parte das interações são repletas de pequenas falhas que comprometem a satisfação do cliente, é desafiador imaginar o salto representado por robôs e humanos que trabalhem juntos para oferecer uma experiência mais imersiva, gratificante e empolgante. Talvez a pergunta não seja o quanto a tecnologia pode ser humanizada, mas sim o quanto nós, humanos, estamos dispostos e somos capazes de evoluir para lidarmos com IAs em nossa vida.
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