Em tempos cada vez mais digitais, existe um bom questionamento sobre o atendimento ao cliente: será que, hoje, toda e qualquer demanda do consumidor poderia ser resolvida em um canal digital automatizado? Ou o ser humano é (e continuará sendo) um elemento imprescindível na resolução de demandas? Seria possível unir os dois?
As perguntas e dúvidas sobre a automação no atendimento se acumulam conforme a sociedade avança para o consumo digital. Alguns desses dilemas foram discutidos no painel “O poder da voz para ampliar a resolutividade das demandas dos clientes”, durante o evento Customer Voice Experience (CVX), uma iniciativa do Grupo Padrão.
Momento da experiência por voz
O fato é que o atendimento puramente humano caminha vem passando um profundo processo de transformação, inclusive este ano.
Uma delas é a recente aprovação do decreto do SAC, norma que existe desde 2008 e foi atualizada este ano. Em linhas gerais, o decreto diminui a obrigatoriedade do atendimento telefônico humano no SAC e prestigia o relacionamento digital.
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Outra mudança é comportamental. Um número cada vez maior de pessoas de diferentes idades e classes sociais tem utilizado canais digitais para realizar compras, principalmente a partir da pandemia. Vivemos um dos maiores movimentos de comunicação da história da humanidade.
Não é preciso dizer que esse cenário é desafiador para as empresas. Empresas passaram a adotar robôs no atendimento, mas será que eles são eficientes?
Existem ainda questões relacionadas a confiança de um ser humano para uma máquina. Um robô pode imitar um humano, mas dificilmente vai se comportar como uma pessoa. Existem manias e cacoetes que transformam pessoas em seres únicos neste planeta. É o que alguns cientistas chamam de Vale da Estranheza, uma hipótese no campo da estética, robótica e computação gráfica que diz que quando réplicas humanas se comportam de forma muito parecida — mas não idêntica — a seres humanos reais, provocam repulsa entre observadores humanos.
Agora, imagine um robô falar com milhões de consumidores de uma maneira customizada. É um cenário realmente desafiador.
“Temos 100 milhões de produtos instalados nas casas, e isso tem gerado 4 milhões de contatos por ano. É um cenário desafiador, mas temos usados ferramentas digitais para aprender e antecipar demandas dos nossos consumidores. E elas tem ajudado a companhia”, explica Renato Cerri, consumer care diretor da Whirlpool Corporation.
“O nosso cenário de atendimento é bom um exemplo. Quando olhamos para a América Latina, falamos com 15 milhões de contato ano. Eles nos demandam com temas financeiros, assuntos relacionados as consultoras de vendas. Há ainda um desafio adicional: temos pessoas com dificuldades de ler e escrever. O desafio é como criar uma tecnologia que realmente seja para o consumidor da ponta”, explica Paula Pimenta, diretora de customer care da Natura & Co.
Voz: o caminho para a automação do atendimento?
Voz e automação podem ser os pilares de uma comunicação em massa eficiente e de custo acessível para as empresas no atendimento ao cliente.
Em países como os EUA, por exemplo, esse processo já começou e tem popularizado tecnologias como a Alexa, da Amazon, ou Siri, da Apple.
“40% da população americana já usa assistente de voz uma vez por mês. No Brasil, entre aqueles que possuem esse dispositivo, o uso estaria em 37%”, explica Fernando Moulin, partner da consultoria Sponsorb e professor da ESPM.
Além do assistente de voz, o robô no atendimento está ganhando espaço nos aplicativos de mensagens e chats das empresas. E os primeiros resultados são animadores.
É o que explica Bruno Marinho, CIO do Grupo Services. “Temos um processo customizado de machine learning, que tem um aprendizado constante. Estamos no caminho. Hoje, 50% das nossas transações ocorrem 100% automática, seja via texto ou voz. Além disso, por meio da tecnologia, tivemos um cliente que reduziu a rechamada (nova ligação após queda da primeira ligação) de 14% para 8% pela voz de um robô. Usamos a tecnologia para transformar a experiência daquele cliente”.
Segundo Cerri, o atendimento por voz automatizado está em um estágio embrionário na companhia, principalmente porque a empresa tem respeitado o momento tecnológico do consumidor. Neste momento, a companhia tem estimulado a adesão digital.
“A gente o convida (consumidor) para conversar no digital. Hoje, 30% ainda opta pelo humano na companhia”, afirma o executivo da Whirlpool.
Momento e reflexões
Entre as empresas, a fala é quase unânime: o momento é de adesão digital, o que inclui de consumidores a empresas.
A pandemia foi a ignição de uma massificação digital, mas o fato é que ainda vivemos em um momento inicial de uma era que chamamos de phygital. Que a gente não se iluda: a digitalização do consumidor começou, mas esse é um processo de aprendizado que vai durar um bom tempo, principalmente porque precisamos falar de inclusão digital.
Nas empresas, o processo de digitalização já começou, mas as empresas ainda estão longe de serem chamadas de digitais. “As engrenagens (da tecnologia) estão começando a se encaixar (nas empresas). Existem ainda discussões sobre o que é possível terceirizar do ponto de vista da tecnologia e o que poderia ser internalizado. É um processo”, afirma Bruno, do Grupo Services.
Entre as empresas que lidam diretamente com consumidor, o momento é aprendizado sobre o que realmente funciona e o que pode ser descartado – considerando, claro, as particularidades de cada negócio.
“O importante é experimentar um pouco de tudo, mas sempre mantendo o cuidado quando começar. Precisamos subir rápido no ônibus, mas também desça rápido se necessário.”, afirma Cerri.
“Se eu pudesse voltar, eu não teria investido em ferramentas de áreas de atendimento. O nosso foco é a digitalização, incluindo as ferramentas de core da companhia. Vamos focar na ferramenta que vai levar para outro lugar (no digital). Hoje invisto em bot, analytics voice, ferramentas preventivas. O meu foco é reduzir o volume de contato”, afirma Paula, da Natura.
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