A transformação digital requer evidentemente mudanças culturais profundas que demandam novos modelos de liderança. Não há mais espaço para o modelo clássico baseado em comando e controle, burocracia e centralização baseada em um “chefe” desconectado da equipe. O digital está cultivando uma nova cultura de liderança que valoriza a motivação, a liberdade de pensamento e a transparência para construir confiança nas equipes, retirando a empresa da inércia.
Painel no SXSW, o maior evento de comportamento, tecnologia e inovação, que ocorre em Austin (EUA), reuniu lideranças do calibre, como Rob Charter, Presidente do Grupo Caterpillar; Bruno Guicardi, Presidente e co-fundador da CI&T; Swan Sit, Vice-Presidente Global de Digital da Revlon e Lizzie Wiedhelm, Sênior Vice-Presidente de Inovação da Pandora, para falar sobre elementos estratégicos para criar ambientes vencedores e prontos para criar a inovação digital.
“A única coisa que não muda é a trilha de mudança incessante que vivemos”, proclamou Bruno Guicardi, da CI&T. Como as lideranças podem enfrentar o dilema entre a velocidade e a necessidade de inovar em tempos de transformação digital? As empresas têm lideranças habilitadas a equilibrar essas duas prioridades? E como a cultura pode conciliar a necessidade de inovar com a aversão a risco tão própria de quem está no mercado há décadas?
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Liberando a energia criativa
Para Swan Sit, é necessário trabalhar uma cultura que permita às pessoas serem participativas, um espaço que permita às pessoas falarem e serem ouvidas. Um líder não deve se basear somente nas métricas de entrega de resultados. É necessário haver espaço para fomentar a criatividade e a experimentação. Isso quer dizer que as empresas precisam ser tolerantes ao risco, ainda que minimamente calculados.
Charter, da Caterpillar, diz que falhas podem ser celebradas e é por isso que a inovação não é prioridade de um departamento. “Inovação tem que ser um processo constante e permanente de todos na empresa”. Na Pandora, segundo Lizzie, a energia criativa é muito latente e talvez isso se deva ao fato de que a empresa é pequena em relação a outros apps globais de música. “A companhia foi criada com uma visão de customer centric (centralizada no cliente) e com muita transparência sobre os objetivos e as metas a serem atingidas, o que facilita o engajamento interno”. A transformação digital passa necessariamente pela inserção do cliente no centro do negócio.
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Processos e métodos
Os executivos ressaltaram que é importante trabalhar de forma padronizada, procurando estabelecer prioridades reais, procurando responder a questões essenciais antes de decidirem por um projeto: “vai fazer a vida dos clientes melhor? Vai fazer bem para a sociedade? Vai facilitar a vida da empresa e dos colaboradores? Em que nível? Não adianta simplesmente estabelecer que um projeto é prioritário. Ou ele passa por escrutínio ou é descartado”, sintetizou Sit.
Definir processos e réguas de validação de projetos é um caminho mais consistente para inovar. E como a liderança deve se portar diante do ritmo intenso e vertiginoso da inovação digital, que parece levar a empresa a sempre se debater com a inovação ou tendência mais recente?
Lizzie diz que a liderança precisa compreender que hoje as empresas não trabalham para elas e sim para consumidores extremamente poderosos e cientes de suas expectativas. Essa é a premissa. Nem sempre o que é bom para o CEO é para a audiência, para os grupos de clientes e os dados mostram isso.
“As empresas estão sempre discutindo sobre qual a melhor direção para tomar diante das escolhas que devem ser oferecidas para os clientes? Mas os varejistas exercem pressões, às unidades de negócios exercem suas pressões, a alta gerência exerce suas pressões. E então, que direção seguir? Novamente, ter em mente a jornada e o plano definido para o ano como guia para tomada de decisões. A ideia intempestiva só traz confusão e gera disputas internas intermináveis. Planos, metas, trilhas e jornadas precisam ser buscados e atingidos, com alguma flexibilidade, mas sem manobras radicais.
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Aprendizados
Criar comitês de conexão entre lideranças e colaboradores de áreas diferentes, nos quais se discutem o que foi atingido, o que falhou, o que precisa de esforço maior, funcionam como momentos de coach, nos quais os líderes mostram que se importam e geram proximidade com a equipe. Outro processo válido é gerar dispersão. As empresas fomentam esquadrões para fazer imersões, mas nem sempre eles geram bons resultados.
Nesse momento, o caminho é fazer todos irem para suas casas, refletirem individualmente e então trocarem suas ideias alguns dias depois. Para Charter, é essencial que a liderança cultive diversidade de opiniões. Grupos devem ser heterogêneos, para que ideias não sejam pasteurizadas.
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Meu jeito de trabalhar
Outro aspecto que a liderança precisa observar é ter sensibilidade de aceitar formatos distintos de trabalho. Há profissionais que rendem melhor sob determinadas condições de trabalho. Lideranças precisam aceitar que talentos trabalhem com algum padrão de flexibilidade para gerar resultados.
A ideia geral é motivar e estimular as equipes, dar voz e autonomia a elas. Lizzie afirma, com razão, que “as pessoas adoram desafios, querem propor soluções e esperam que as lideranças lhes deem essa confiança e não interfiram na sua maneira de fazer o próprio trabalho”.
A liderança não pode focar no que ela acredita que deve ser dito, mas sim no que a equipe espera que seja dito. “O digital democratizou a discussão de todos os assuntos. Não existe mais a prerrogativa de gênero, de idade, de competência sobre um assunto. Todos podem participar da conversação de praticamente qualquer assunto”, enfatizou a executiva da Revlon, Swan Sit.
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Nativa digital ou renascida digital?
É mais simples ser líder de uma empresa nativa digital ou de uma empresa em transformação digital? Lizzie diz que não há preferência aqui. O líder de uma empresa na era digital precisa ter instintos e força, “tripas e bolas” para entender que uma empresa hoje em dia precisa entender que o cliente está no centro, que os dados mostram diariamente como o cliente é volátil e volúvel e que o negócio precisa mudar o tempo todo. Há oportunidades demais para serem aproveitadas em qualquer tipo de negócio, startup ou não.
O cliente, sempre o cliente, hoje é o protagonista dos processos de inovação. Isso quer dizer que os sucessos do passado não têm mais validade. As regras foram reescritas e as lideranças precisam escrever novas regras. Os consumidores também veem mudanças em suas vidas e isso os deixa inseguros. As lideranças precisam responder à essas inseguranças.
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