Já não é mais nem novidade: o uso da Inteligência Artificial no trabalho veio para ficar. A tecnologia está cada vez mais presente no mundo corporativo, transformando processos e criando novas oportunidades de negócio. No entanto, junto com sua ascensão, surgem também muitos mitos e até mal-entendidos sobre como ela funciona e sobre seus reais impactos para profissionais e gestores.
Estas percepções errôneas podem ir desde a crença de que a Inteligência Artificial irá substituir os humanos totalmente até a ideia de que ela não gera retorno financeiro. E isso demanda cuidado: o que poderíamos colocar como uma hostilidade à nova tecnologia pode gerar não só burburinho de corredores, mas também resistência à inovação, receios infundados e bloqueios nas empresas que poderiam se beneficiar de sua implementação.
Aqui, listamos os 7 maiores mitos sobre o uso da IA no ambiente de trabalho e ajudamos a desmistificá-los com Dora Kaufman, professora do programa em Tecnologia da Inteligência e Design Digital (TIDD) da PUC-SP, especialista nos impactos éticos e sociais da IA.
Mito 1: A IA vai substituir os seres humanos
“Os modelos de IA atuais, embora nos encantem, são bastante limitados”, tranquiliza Dora Kaufman sobre a preocupação de uma substituição total dos seres humanos pela IA. Segundo ela, não existe nenhum indício científico de que a tecnologia possa atuar exatamente como nós.
O que acontece hoje é que a Inteligência Artificial vem assumindo cada vez mais inúmeras funções específicas, particularmente as que envolvem grandes volumes de dados. Pelo lado positivo, isso pode ajudar na automação de tarefas repetitivas e rotineiras, permitindo que os profissionais se concentrem em atividades mais estratégicas e criativas. Ou seja, ela é muito mais uma ferramenta de suporte do que uma substituta humana.
Mito 2: A IA é 100% autônoma
Longe disso: no estágio atual de desenvolvimento, as decisões humanas permeiam toda a cadeia de desenvolvimento e uso dos modelos de IA. A supervisão da tecnologia é, inclusive, bastante necessária, a fim de validar os resultados gerados pelos sistemas. E isso tem uma explicação.
“A maior parte dos modelos atuais é baseada em uma técnica específica de redes neurais profundas (em inglês, deep learning), que é um modelo estatístico de probabilidade. Sendo uma probabilidade, as respostas dos sistemas têm sempre uma variável de incerteza. Além disso, a matéria-prima dos modelos são os dados. Em muitos casos, dados pessoais gerados por humanos, que contêm todas as nossas idiossincrasias”, comenta a professora.
Mito 3: A IA é imparcial
No mesmo sentido do mito anterior, é importante lembrar que os modelos de IA são treinados com dados. Se os dados de treinamento forem de baixa qualidade ou contiverem vieses, a Inteligência Artificial pode replicá-los e se tornar tendenciosa, tomando decisões menos precisas e, sim, parciais.
Por isso, a especialista Dora Kaufman reforça que o uso da IA no trabalho requer supervisão e correções humanas ao longo de todo o processo de desenvolvimento e adoção, afinal, ela não é infalível e pode cometer erros.
Mito 4: A IA é cara e não traz ROI
Nesse caso, tudo depende de como a tecnologia está sendo adotada e aplicada e quais soluções se buscam com ela.
“Os custos são distintos para os desenvolvedores da IA e os usuários. O retorno igualmente depende da execução de qual tarefa ela está sendo adotada. Também é importante analisar a equação custo x retorno, se justifica ou não usar a IA. Às vezes, soluções estatísticas mais simples resolvem o problema a um custo menor e com menos riscos”, opina.
Embora o retorno possa não ser imediato, muitas empresas que optam pela implementação da IA conseguem ver ganhos em eficiência, redução de custos, personalização e inovação, em especial se a tecnologia é integrada corretamente às operações. Áreas particularmente beneficiadas costumam ser as que envolvem automação de processos, personalização de CX, previsão de demanda, otimização de campanhas, entre outras.
Mito 5: Para usar IA, é necessário ser um especialista
Esse mito é um dos que mais assusta profissionais e gestores, principalmente aqueles que têm pouca familiaridade com a área tecnológica ou não contam com equipes robustas de TI. No entanto, hoje em dia, diversas ferramentas de IA são projetadas para serem acessíveis a usuários não técnicos, com interfaces amigáveis e intuitivas. Isso permite que pessoas de áreas como marketing, vendas, RH, finanças e diversas outras possam utilizá-las sem grandes problemas.
De qualquer forma, a dica da professora Dora Kaufman é buscar entender a lógica e o funcionamento da Inteligência Artificial. “A partir daí, pode-se especializar nos requisitos da função que deseja exercer”, indica.
Mito 6: A IA não respeita a privacidade dos dados
A ideia de que a Inteligência Artificial não respeita a privacidade dos dados está frequentemente associada a um medo de que a tecnologia possa acessar ou usar informações pessoais de maneira indiscriminada ou irresponsável. Mas aqui cabe um alerta em relação a esse conceito.
“A IA é apenas um modelo estatístico, ou seja, o respeito à privacidade dos dados é atribuição dos seres humanos, são os desenvolvedores e usuários que precisam estar atentos à LGPD”, reforça a especialista sobre de quem é a responsabilidade de seguir as obrigações que as legislações impõem sobre como os dados devem ser coletados, armazenados e compartilhados.
Portanto, a privacidade dos dados deve sempre ser uma preocupação central dos desenvolvedores de IA. Dessa forma, ela pode até ser projetada para respeitá-la e promovê-la, desde que as empresas adotem as melhores práticas de segurança e estejam em conformidade com as leis vigentes.
Mito 7: A IA é uma ameaça para todas as profissões
“No estágio atual da tecnologia, não a vejo substituindo nenhuma profissão, mas, sim, automatizando tarefas e funções em praticamente todas elas”, afirma Dora Kaufman.
Claro, alguns setores são mais impactados que outros com o uso da IA no trabalho, como atendimento ao cliente, TI, marketing e vendas, logística e transportes, etc. Mas, uma vez que nada indica que o reinado dessa tecnologia esteja perto do fim, a recomendação para se preparar para as transformações decorrentes de sua adoção, mesmo que em atividades específicas, vale para todos.
“Todos os profissionais precisam estar atentos e analisar quais tarefas de sua área de atuação têm potencial de serem automatizadas. Então, se capacitarem para exercer as que continuam reservadas aos humanos”, deixa a dica.