As pessoas reclamam da falta de dinheiro e trabalho. Mas elas vão a shows caros,continuam se vestindo, comprando ou trocando de smartphones, comendo em restaurantes, indo ao shopping center, viajando para lugares incríveis e por lá fazem compras. Todos possuem uma hierarquia de gastos pautada naquilo que lhes é ou parece ser essencial. Essa escolha, esse critério é medido pelos seus valores culturais e também pelo contexto em que se vive.
As pessoas também pechincham o valor que as faxineiras cobram, assim como o pagamento de outros serviços e profissionais quando parte delas a divisão do orçamento, mesmo quando o bugdet é de uma empresa.
As pessoas se justificam para si mesmas e para o mundo que gastam em viagens, roupas, smartphones e outras “indulgências” porque merecem ser autopresenteadas, mimadas, recompensadas. Esse é um gatilho interessante que nos aponta como o consumo ainda é percebido como um vilão dentro do mercado produtivo. Podemos passar horas trabalhando, mas é impensável assumir para a sociedade que passamos horas consumindo, parece que nem nos sentimos donos do nosso próprio dinheiro. Então partimos para o gatilho emocional: somos todos carentes e precisamos de pequenas recompensas, entendi.
Confira a edição online da revista Consumidor Moderno!
Convido o leitor a fazer uma ponderação e chamo a atenção para algo muito além dessa relação direta entre produção e consumo. Pensando bem… parece que olhamos tudo a curto prazo.
Não há problema algum na fruição de bens e serviços, o critério e a hierarquia do que é mais valioso e preferencial é só seu, e só a você deve fazer sentido. Explicado isso levanto um dilema da sociedade moderna, do novo modus operandi no campo do trabalho: a vida do autônomo ou freelancer.
Quando você negocia o valor de um bem ou serviço de um autônomo, de um freelancer ou de um produtor local, se cria uma relação assimétrica de poder. Você estabelece ali o quanto ele ou seu serviço vale. E ao pechinchar você “grita” para ele que é menos. Você o coloca em uma posição injusta de questionar a sua própria importância. Você cria nele um medo de ser substituído que impacta na sua percepção de mundo. Você dá as certezas que nem sempre são reais e eles acreditam. O que cria uma aura de incapacidade, ineficiência, desvalorização.
Isso pode parecer uma bobagem, mas, dentro da ética do trabalho que construímos como bases estruturais da sociedade, somos o que fazemos, o que se torna um preceito mordaz em tempos atuais. Se sou o que faço e meu trabalho é diminuído pelo valor que lhe é atribuído, eu sei que pouco sou, pouco valho e pouco mereço.
É hora de atentarmos para pequenos atos que podem virar a chave dessa relação por vezes injusta e corrosiva. Trazer pequenos tsunamis que podem e vão impactar na vida daqueles que estão ao seu redor deve ser uma prática constante, há de haver um esforço em mudar as lógicas predominantes.
Relações
Não adianta apelarmos para argumentos do tipo “trato bem, pago em dia”, tratar bem não é e nem pode ser tomado como uma vantagem, é um dever. Assim como pagar o justo e em dia. O nome disso é respeito. É lei.
Quando você paga o razoável a quem te serve ou trabalha com você se muda a história dele. A relação de trabalho é impactada de forma positiva, se estabelece um lugar de prestígio, valorização e reconhecimento.
Por que não diminuir as idas a restaurantes fancy e aumentar o salário da sua empregada? Por que não batalhar por divisões mais justas no orçamento das empresas e valorizar profissionais? Por que não subverter essa ordem que oprime e desmerece?
Por que não sermos disruptivos dentro das nossas relações próximas, as de trabalho e as de casa?
Este é um passo rumo a uma nova economia onde a moeda social precisa valer mais que a gana por obter cada vez mais vantagem.
A moeda social te dá infinitas e imensuráveis vantagens. O problema é que você (e a maioria das pessoas) sofre de miopia. Acredite e aposte no humano. Isso fará o seu mundo melhor.