Estamos iniciando um novo ano com diversos questionamentos sobre o futuro com incertezas decorrentes da pandemia. Nunca o acrônimo VUCA (Volatilidade, Incerteza, Complexidade e Ambiguidade), originalmente utilizado durante a Guerra Fria no ambiente militar, representou tão bem as mudanças da nova realidade, que continuam nos forçando a prever o futuro.
Há mudanças em todos os setores da economia, sobretudo em alimentos e bebidas, com 2020 representando um retorno às origens e muitas famílias e indivíduos retornando para casa e se unindo para combater um inimigo invisível, comum e sem precedentes.
Nova relação com a comida
O lar passou a ser o novo centro, o isolamento representa a proteção e o setor de alimentos e bebidas passou a ser reflexo direto de uma “guerra social” que se iniciou com o esvaziamento de prateleiras nos supermercados no mundo todo.
Inicialmente muitos consumidores optaram por estoques de alimentação, higiene e saúde. Com o tempo, houve o uso intensivo de tecnologias. “Delivery” e “click-and-collect” saíram dos conceitos e se tornaram realidade no consumo de alimentos e bebidas.
Há estatísticas que reforçam esta análise. De acordo com a pesquisa que conduzimos “When luck is not a strategy”, para 67% dos respondentes, o hábito de consumir ou preparar refeições em casa continuará mesmo após as medidas restritivas. Houve ainda uma preferência pelo delivery, com 33% que estão recebendo assim os alimentos e 28% que preferem retirar alimentos em loja. Além disso, 63% dos que trabalham em casa têm menor probabilidade de preparar refeições.
O “Mindful Eating”
A pandemia também fez muitos conviverem com limitações econômicas. Faz sentido retomar a pirâmide de Abraham Maslow, a qual indica que, se satisfeitas as condições básicas de sobrevivência, a tendência “Mindful Eating” (alimentação com atenção plena) se fortalece na mente do consumidor de alimentos e bebidas.
Além das mudanças de hábitos de consumo, 2020 escancarou a degradação do Planeta Terra e os impactos das mudanças climáticas com incêndios e catástrofes. Os consumidores estão mais conscientes e priorizando marcas com propósito que protegem meio ambiente, colaboradores, parceiros e o planeta.
A alimentação passou a fazer parte do todo e os consumidores começaram a questionar se suas escolhas fazem bem para eles próprios e para o planeta. Estes questionamentos passaram a influenciar as diversas opções de consumo: estou escolhendo alimentos que protegem o meio ambiente? São seguros? As embalagens são adequadas? Causam danos? Como são escolhidas as matérias-primas? Como são armazenados e distribuídos? São marcas locais? Há ingredientes naturais? As embalagens são sustentáveis? Consigo rastrear? O propósito é claro e a marca adota práticas de ESG?
Estes questionamentos passaram a influenciar as decisões de consumo. As tendências de “Mindful Eating”, já observadas, ganharam impulso especial agora. Sim, países pobres e emergentes ainda passam pela problemática da pirâmide de Abraham Maslow. Entretanto, quando sobrepostas as necessidades básicas, o “Mindful Eating” tende a se fortalecer. E cabe refletir sobre as ações esperadas na indústria de alimentos e bebidas.
Ações importantes
Entre os exemplos, estão: fornecedores que valorizam transparência e rastreabilidade; investimentos em tecnologia para rastrear ingredientes na cadeia de suprimentos; fornecedores certificados que garantem direitos humanos e protegem meio-ambiente e sociedade.
Não bastassem estes, seguem outros exemplos: avaliar ética da marca e como ela garante ingredientes sustentáveis; processo produtivo ecologicamente correto; pesquisa e desenvolvimento com produtos que privilegiem saúde e bem estar; embalagens que protegem o meio ambiente.
Para superar os desafios da pandemia, os executivos de alimentos e bebidas precisam investir em estratégias mais disruptivas e modelos operacionais mais inovadores. Considerando todas as mudanças de consumo no setor, as empresas que forem mais assertivas terão a oportunidade de se diferenciarem no mercado e atingirem mais sucesso nos negócios.
* Mauricio Godinho é sócio-diretor líder de Alimentos de Bebidas da KPMG no Brasil
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