A polarização ideológica é um fato e ela tem se concretizado em instabilidade política em vários lugares do mundo. E, para muitos, redes sociais como o Facebook têm boa parcela de culpa nisso.
Um estudo feito pela Diretoria de Análises de Políticas Públicas (DAPP) da Fundação Getulio Vargas chegou a tentar desenhar qual seria a cara dessa polarização nas redes, caso ela tivesse forma. Seria algo como o gráfico abaixo, feito à época das eleições presidenciais de 2014 (em que Dilma Rousseff e Aécio Neves disputaram o segundo turno).
Ele mostra as interações entre perfis e posts feitas no Twitter: cada ponto representa um perfil (o tamanho é proporcional à quantidade de seguidores), e cada linha entre eles representa um compartilhamento ou resposta às postagens. Em vermelho foram colocados os perfis com maior número de postagens favoráveis ao então governo (medido por softwares); em azul aqueles favoráveis à oposição e, em amarelo, os perfis de “mediadores”, como veículos de comunicação. Quer dizer: nenhum grupo está conversando com o outro.
No Facebook, em que um algorítimo prioriza na linha do tempo dos usuários temas que já são de seu interesse prévio em detrimento da ordem cronológica, esse efeito seria ainda mais forte.
Mark Zuckerberg, pai da rede, deve saber disso. E por isso resolveu ele próprio fazer uma postagem sobre a necessidade de harmonia entre as diferentes comunidades. “O progresso hoje demanda que a humanidade se una não só como cidades ou nações, mas também como uma comunidade global”, escreveu o executivo em sua página pessoal no Facebook, em um texto como nada mais nada menos do que 35 mil toques (algo como um documento de 20 páginas).
“Em tempos como estes, a coisa mais importante que o Facebook pode fazer é desenvolver uma infraestrutura social que dê às pessoas o poder de construir uma comunidade global que funcione para todos nós”, continua.
Apesar de longa e bastante questionadora, a carta de Zuckerberg dá poucas indicações práticas de como isso seria feito e mal cita as novas opiniões como uma resposta direta à polarização da sociedade, a suposta culpa de sua companhia nisso ou mesmo a proliferação de notícias falsas em redes como a sua, um debate que a muito custo começou a conseguir convencer ele e outras gigantes da internet, como o Google, a tomarem uma posição.
Mas a carta aparece em um momento em que o debate sobre o “isolacionismo”, como definiu o jornal The New York Times, e a rejeição espraiada a efeitos da globalização está aquecido.
A declaração fala da necessidade de a sociedade como um todo, e o Facebook dentro do papel de seu alcance, trabalhar para a criação desta “comunidade global”, isto é, um espaço não fisicamente definido onde o ser humano possa reconstruir o seu senso de coletividade, compartilhamento e convívio comum. Estas comunidades, define Zuckerberg, devem ser pensadas em cinco grandes frentes: apoio, segurança, informação, engajamento civil e inclusão (veja os principais pontos abaixo).
“Nossas grandes oportunidades hoje são globais – como espalhar prosperidade e liberdade, promover paz e entendimento, tirar pessoas da pobreza e acelerar a ciência. Nossos grandes desafios hoje também são globais – acabar com o terrorismo, combater as mudanças climáticas, prevenir-se das pandemias”, escreveu. E é por isso, conclui, que o Facebook deve agora trabalhar em prol de interesses globais também.
A carta completa, em inglês, pode ser lida aqui. Veja o trecho em que Zuckerberg resume as cinco principais questões para as quais está se propondo buscar soluções:
“Unir todos em uma comunidade global é um projeto maior que qualquer organização ou empresa, mas o Facebook pode contribuir para responder estas cinco questões importantes:
– Como podemos ajudar as pessoas a construírem comunidades de apoio que fortaleçam as instituições tradicionais em um mundo onde a adesão a estas instituições está declinando?
– Como podemos ajudar as pessoas a construírem uma comunidade segura que previna danos, ajude-nos nas crises e se reconstrua constantemente em um mundo onde qualquer pessoa no globo pode nos afetar?
– Como podemos ajudar as pessoas a construírem uma comunidade informada que nos exponha a novas ideias e construa uma compreensão comum em um mundo onde todos têm voz?
– Como podemos ajudar as pessoas a construírem uma comunidade civicamente engajada em um mundo onde a participação numa eleição às vezes mal engaja metade da nossa população?
– Como podemos ajudar as pessoas a construírem uma comunidade inclusiva que reflita nossos valores coletivos e a humanidade comum do nível local para o global, através de culturas, nações e religiões, em um mundo com poucos exemplos comunidades globais?”