Este artigo estava na gaveta da minha cabeça há um pouco mais de um ano. Mas, após assistir ao Web Summit, percebi os benefícios em publicá-lo.
Você chegou a conhecer alguma criança rebelde? Talvez você tenha sido uma delas, ou o seu filho, a sua filha. Na verdade, chamar a criança de rebelde é mais fácil do que assumir a falta de sentido que você está oferecendo para ela. A criança desobedece não porque goste de fazer birra, mas porque busca por coerência, sentido. Essa é uma essência muito humana. Começar explicando o porquê daquela regra pode ser um bom início.
Bom, agora vamos ao trabalho. Já está mais do que provado que todos trabalhamos bem remotamente. No painel do Web Summit 2022: “Making sense of the future of work”, Dan Shapero, COO do LinkedIn comentou que, durante a pandemia, os gestores ficaram surpresos ao ver que o trabalho poderia ser feito de qualquer lugar e, inclusive de forma mais produtiva. E eles começaram a ficar aterrorizados com a possibilidade de as pessoas não voltarem aos escritórios. E isso já está acontecendo. O trabalho remoto abriu um espaço de flexibilidade para um maior equilíbrio entre vida pessoal e profissional para as pessoas (inclusive para aqueles gestores aterrorizados) – e tem que ter um motivo para se renunciar a isso.
Voltar ao escritório tem que ser algo que faça sentido para as pessoas. Algumas pessoas encontram sentido em sair de casa, pela dinâmica de mudança de ambiente outros motivos genuínos. Mas, para muitas, simplesmente não faz sentido sair de casa. Para estas, sair de casa significa gastar tempo no trânsito, ter que encontrar uma sala vazia na empresa para as inúmeras reuniões virtuais que seguimos tendo.
Os escritórios, a maioria deles, continuam sendo os mesmos, apesar das novas demandas. Há pouca preparação e estrutura para, por exemplo, ter todos os colaboradores em salas individualizadas para suas reuniões virtuais. A exigência da presença física é feita por lideranças de comando e controle, ainda acostumados com a associação entre produtividade e presença física. O contraponto desta, é a liderança por confiança.
Há pouco mais de um ano fui tomar um café no escritório de um parceiro e amigo – uma casa linda no bairro de Higienópolis, em São Paulo. Durante a visita, ele comentou comigo que as pessoas eram totalmente livres para irem ao escritório quando quisessem, sem nenhuma obrigação de presença. Isso ficou registrado na minha cabeça e, durante o café, perguntei: Jacques, acho incrível essa liberdade que você dá às pessoas, mas, colocando-me no seu lugar, vejo certa dificuldade de tomar esta decisão, levando em consideração o custo do aluguel. Ele rapidamente me respondeu: Ah, isso é fácil. Um workshop que faço aqui já paga o aluguel.
Essa resposta foi um grande insight! Gestores que lideram por confiança não colocam a carga do escritório em seus colaboradores. Eles ressignificam o escritório para que ele seja autossustentável, criando formas diferentes de rentabilizá-lo, justificá-lo.
Enquanto este é justamente o problema das lideranças por comando e controle, que cobram a presença dos colaboradores com o objetivo de justificar a existência, e o custo do escritório.
Novos tempos exigem novas soluções, e a ressignificação dos escritórios é um deles. Cada escritório deve ser pensado de acordo com as particularidades dos serviços que oferece, da cultura que fomenta. Não é sobre querer que o seu colaborador esteja presente porque isso te conforta, mas porque faz sentido estar presente.
Por exemplo, se a necessidade reside em juntar a equipe para cocriar um novo serviço, qual a diferença que o escritório soma em comparação à uma dinâmica virtual? Ao pensar sobre isso podemos chegar em algumas ideias novas, como uma sala própria preparada para cocriação, com instruções nas paredes, no chão, de modo a potencializar a oportunidade da presença física – precisamos pensar em estímulos que não temos à disposição no ambiente virtual.
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O escritório pode ser um potencializador de novas oportunidades – para a própria empresa (novas fontes de receita, novos rituais para aumentar o processo criativo, etc), e para seus colaboradores (experiências, aprendizados, trocas, etc), e para reforçar a cultura.
A questão cultural também foi levantada no painel sobre “Por que a geração Z vai trabalhar para mim?” E a resposta é, basicamente: oferecer flexibilidade ao entender os motivos pelos quais as pessoas vão ao trabalho – ao entender seus valores pessoais e suas motivações. Segundo Shapero, “Teremos um período de muitos experimentos, entre o trabalho totalmente remoto e a exigência da presença física. Flexibilidade e confiança serão dois princípios-chave.”
Michelle Labbe, Chief People Officer da Toptal, plataforma de freelancers nas áreas de negócios, design e tecnologia, afirmou no Web Summit 2022: “é preciso criar uma cultura na qual o trabalho remoto seja aceito, e manter esta cultura nutrida.”
E nutrir a cultura é exatamente um dos pontos que as empresas levantam para exigirem a presença física no escritório. Mas, esta ´bucha não é sua´ (título alternativo deste artigo, onde sua é o colaborador), mas da liderança. É ela quem deve recriar um ambiente que nutra a cultura e confiança, oferendo sentido para as pessoas.
A casa em Higienópolis é do Grupo Padrão, sede desta revista e tantas outras histórias.
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