Atualmente, muito se fala sobre a importância da igualdade de gênero no mercado de trabalho e sobre o quanto é necessário promover a equidade de oportunidades e a inclusão feminina, reduzindo diferenças entre cargos e salários e buscando minimizar preconceitos culturais pré-estabelecidos.
Porém, diferente do que muitos gestores acreditam, atribuir às mulheres papéis de comando no ambiente corporativo está longe de ser um favor e vai bem além de um discurso bonito de responsabilidade social: a liderança feminina potencializa a capacidade de inovação organizacional e pode aumentar o faturamento da empresa.
Liderança feminina: o que eles veem X como realmente é
Em algum momento de sua vida, certamente, você já se deparou com alguém defendendo a importância de as empresas abrirem espaço para a atuação de mulheres, de oferecerem salários iguais aos de homens na mesma função, de reduzir preconceitos em relação à maternidade e atuação profissional ou com algum outro discurso nesta linha de inclusão e igualdade e equidade de gênero.
Isso porque a luta por igualdade de gêneros, inclusive dentro das organizações, não é de hoje. Apesar disso, muitos gestores acreditam que a presença de mulheres no ambiente corporativo tem mais a ver com discurso feminista de inclusão e com responsabilidade social do que, de fato, com pensamento estratégico visando estimular a inovação e o melhor gerenciamento das organizações.
Prova disso são os resultados do estudo Women, leadership and missed opportunities (Mulheres, liderança e oportunidades perdidas, em português), realizado pela IBM Institute for Business Value (IBV), que mostra que o avanço das mulheres não é prioridade para 70% das organizações globais pesquisadas.
E mais do que isso, segundo a pesquisa, a pandemia trouxe retrocessos neste campo: menos mulheres entrevistadas ocupam cargos de vice-presidente, diretora e gerente em 2021 do que em 2019, quando o mesmo levantamento foi realizado.
O que muitos gestores não se dão conta é das contribuições que a liderança feminina pode trazer para as organizações, como aumento de potencial para inovação, maior visão sistêmica para tomada de decisões, inteligência emocional para lidar com equipes e, inclusive, mais lucros.
A pesquisa Diversity Matters: América Latina, realizada pela McKinsey & Company, ampara essa afirmação: de acordo com o levantamento, na América Latina, as empresas com equipes executivas diversificadas em termos de gênero têm 14% mais probabilidade de superar a performance de seus concorrentes de mercado. Além disso, as empresas percebidas pelos funcionários como tendo diversidade em termos de gênero têm probabilidade 93% maior de superar a performance financeira de seus pares na indústria.
Bem mulherzinha: as características da liderança feminina
Inteligência emocional, empatia na solução de conflitos, tolerância, abertura para cooperação, criatividade, maior visão sistêmica e perfil multitarefas. Essas são algumas características femininas que podem fazer toda a diferença no desempenho de uma organização.
“As mulheres têm a inteligência emocional mais desenvolvida. Por isso, são mais relacionais que os homens, principalmente na gestão de conflitos, na cooperação, na empatia, na flexibilidade e na capacidade de treinar e de ensinar o outro. Além disso, a mulher é mais tolerante, mais paciente. Essas são características femininas sobre as quais o mercado dá muito valor atualmente”, enumera a neurocientista Andrea Deis, gestora empresarial pela Fundação Getúlio Vargas (FGV), e mestre em administração e fundadora da Top Leader Training, empresa de treinamento e desenvolvimento de pessoas e organizações.
De acordo com ela, essas características diferenciam a liderança feminina e a masculina. “Por conta da inteligência emocional e da empatia, as mulheres têm muito mais facilidade em fazer o papel de mentoria, de apoiar, de desenvolver, de comunicar, de fazer a gestão de conflitos… Com menor esforço, elas conseguem melhores resultados. Os homens são mais racionais neste quesito”, compara a gestora empresarial.
Além de terem características importantes para o desempenho de papéis de liderança, as mulheres também reúnem qualidades que contribuem para a inovação, como a visão sistêmica mais ampla, a criatividade e habilidades multitarefas.
“A mulher é multitasking porque culturalmente foi criada para fazer várias coisas ao mesmo tempo. Na vida profissional, a habilidade multitarefas permite uma visão mais globalizada da situação. O homem tem uma visão mais focal”, explica Andrea Deis.
Outro ponto considerado pela fundadora da Top Leader é a visão disruptiva típica das mulheres, que permite melhor entendimento e diagnóstico de diferentes eixos de desenvolvimento e também a compreensão de mudanças necessárias para a implementação da inovação.
“Não é que a mulher não questione. Ela questiona, mas tem uma visão mais aberta para a inovação e para as mudanças organizacionais”, ressalta.
Diminuir a desigualdade de gênero é também uma questão de desenvolvimento e progresso
Para as organizações, diminuir a desigualdade de gênero pode ser sinônimo de progresso e inovação, por isso, deveria ser prioridade. Isso porque ao dividir espaços de liderança e execução com equidade entre homens e mulheres as empresas ganham em pluralidade de visão e estratégias.
“Quando o assunto é tomada de decisões, homens e mulheres têm olhares diferentes. O homem é mais focado em números, fatos e age de maneira mais racional. Por outro lado, não é multifocal. Já a mulher tem uma visão mais aberta no sentido de olhar a situação de vários ângulos. A mulher tem a capacidade de analisar questões técnicas e operacionais, mas também considera muito a área da cooperação, do relacionamento. Homens e mulheres são complementares na gestão empresarial, especialmente no que tange aos posicionamentos estratégicos”, compara Andrea Deis.
De acordo com a especialista, isso ocorre por conta de cadeias de valores diferentes, uma vez que homens e mulheres valorizam aspectos primários e secundários inversos uns aos outros.
Liderança feminina ainda enfrenta barreiras
Apesar dos benefícios alardeados pela igualdade de gêneros nas organizações, ainda há muito a evoluir no sentido prático. Atualmente, ainda imperam as diferenças no posicionamento no mercado, as desigualdades de salário – as mulheres ganham cerca de 30% menos para desempenhar as mesmas funções que homens – e os preconceitos na contratação envolvendo a maternidade.
A pesquisa divulgada pela McKinsey, inclusive, traz números que comprovam a disparidade: apenas 11% dos executivos de empresas latino-americanas são mulheres – e mais da metade de todas as empresas na região não têm mulheres em suas equipes executivas.
Por isso, mais do que implementar leis e programas que estimulem a igualdade de gêneros no país e nas empresas, é preciso trabalhar na mudança de mentalidade e cultura.
“É preciso que haja um redimensionamento de valores sociopolíticos que regulamentam a mulher no mercado de trabalho, mas isso não só sistematizado por leis – porque elas existem e são importantes, mas não são suficientes. É necessário mudar os valores que governam essa tomada de decisão”, defende Andrea Deis.
O pensamento de Andrea vai ao encontro do diagnóstico feito pela IBM Institute for Business Value (IBV), que aponta que, apesar de mais organizações estarem instituindo programas para melhorar a inclusão e a igualdade de gênero em comparação com a pesquisa realizada em 2019 – como testes de recrutamento cegos de gênero e licença parental para mulheres – isso não tem se traduzido em melhores resultados, “em parte porque as mentalidades e culturas não mudaram no mesmo ritmo dos programas”.
“Em comparação com 2019, por exemplo, menos entrevistados de organizações recorrentes – que participaram da pesquisa anterior –concordaram que os executivos seniores desafiam abertamente comportamentos e linguagens com preconceito de gênero”, exemplifica o documento.
“Hoje a mulher se capacita muito mais, estuda muito mais, ganha menos e ocupa infinitamente cargos menores – estudos indicam que 62% dos cargos gerenciais estão nas mãos dos homens. Diretoria e presidência, então, são ainda mais desiguais. Mulheres não chegam a ocupar 12 a 15% dessas posições”, enumera a gestora empresarial.
Para ela, o primeiro passo para a mudança é trabalhar valores sociais e culturais, principalmente na base de contratação das pessoas, de forma que os indivíduos tenham a mentalidade de facilitar esse caminho. “Por mais que se fale, pouco ainda se faz. Porque na tomada de decisão é o indivíduo que tem a palavra final e muitas vezes ele é homem. Então, se a gente não começar a fomentar uma mudança na saída de valores culturais dessas representações sociais, a gente não vai conseguir mudar esse cenário”, determina.
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