A qualidade do sono é capaz de influenciar vários aspectos da vida do ser humano: interfere no vigor físico, na capacidade mental e intelectual, na organização e consolidação da memória, na produtividade, no desempenho profissional, no humor e até mesmo no apetite e no metabolismo.
O cenário formado pela pandemia do novo coronavírus, porém, não é dos mais favoráveis para noites de sono tranquilas e revigorantes. A preocupação, o estresse e até a mudança de rotina, frutos desta nova realidade mundial, contribuíram para o aumento alarmante do número de casos de insônia.
Entenda a relação entre pandemia e insônia, quais os riscos que os distúrbios da hora de dormir trazem para o dia a dia e veja dicas de como melhorar a qualidade do sono.
Insônia é considerada epidemia na pandemia
Estado de alerta permanente em relação ao vírus, mudança de rotina, preocupação com contas a pagar, finanças prejudicadas, vida profissional ameaçada. A pandemia reúne elementos capazes de afetar emocionalmente muitas pessoas e os reflexos podem ser sentidos diretamente na qualidade do sono.
Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), antes da pandemia cerca de 40% dos brasileiros sofriam com algum distúrbio de sono. “A insônia, que já era considerada um grave problema de saúde pública, está sendo classificada como epidemia na pandemia. O aumento de queixas de insônia, pesadelos e casos de bruxismo mais que duplicou e é preocupante”, pontua a médica neurologista Dra. Andrea Bacelar, presidente da Associação Brasileira do Sono.
Estudos apontam que as mulheres – especialmente as que têm filhos em idade escolar – foram as mais prejudicadas. “Com a pandemia, muitas mulheres precisaram conciliar trabalho home office com o auxílio em aulas online, com as demandas domésticas, que, inclusive, aumentaram. Mais estresse, ansiedade e perda de sono foram as consequências mais latentes”, enumera a neurologista.
Além disso, outro fator que contribuiu para a piora da qualidade do sono durante a pandemia foi o aumento na ingestão de bebidas alcóolicas.
De sobrepeso à depressão: os riscos de noites mal dormidas
Todo mundo sabe que uma noite mal dormida traz impactos significativos para o dia seguinte: fadiga, cansaço, indisposição, raciocínio lento, ansiedade, irritabilidade e desatenção são apenas alguns deles. Mas você já parou para pensar na somatização que várias noites mal dormidas são capazes de provocar?
A Dra. Andrea Bacelar afirma que o sono tem papel fundamental na função cerebral, na organização e consolidação da memória, na saúde física, na manutenção do peso, na segurança e no desempenho profissional.
“Durante o sono, o cérebro passa por um processo de limpeza – chamado de sistema linfático. Este processo é fundamental para o funcionamento adequado durante o dia. Além disso, ajuda na prevenção de doenças cerebrovasculares, como a doença de Alzheimer, por exemplo”, explica a médica.
Além disso, é durante o sono que ocorre o processo de seleção de memórias, quando o cérebro trabalha para eliminar o desnecessário e consolidar o que é importante. Pessoas que não dormem bem têm maior dificuldade de concentração, memória ruim e raciocínio prejudicado, apresentando queda na produtividade e no desempenho profissional. O risco de acidentes automobilísticos também é potencializado.
A saúde física também é diretamente afetada pela qualidade do sono. “O sono de boa qualidade e em quantidade adequada ajuda a reduzir o risco de diversas doenças. Um sono ruim prejudica nosso sistema de defesa imunológico, além de piorar a recuperação do tratamento de diferentes problemas médicos, como infarto, derrame cerebral e câncer”, destaca a presidente da Associação do Sono, que acrescenta que “Noites mal dormidas podem ainda afetar o humor, aumentar a irritabilidade e contribuir para casos de depressão”.
É também durante o sono que o organismo trabalha na regulação dos hormônios responsáveis pelo apetite e pelo metabolismo. Assim, a insônia pode ter relação direta com sobrepeso.
“Em resumo, a insônia, em longo prazo, pode trazer falta de vigor físico; envelhecimento precoce; diminuição do tônus muscular; comprometimento do sistema imunológico, com mais chances de infecções; depressão; obesidade; diabetes; doenças cardiovasculares, como hipertensão e arritmia; problemas gastrointestinais e déficit de memória”, diz.
Buscar tratamento é fundamental
Diferente do que muita gente pensa, casos frequentes de insônia não são normais e precisam de tratamento, especialmente quando o problema persiste por mais de 3 meses, na frequência de 3 ou mais noites por semana.
“A pessoa precisa buscar tratamento quando percebe que essa dificuldade em iniciar ou manter o sono perdura e passa a ter consequências durante o dia, incluindo cansaço, sonolência, piora do humor. Nestes casos, o distúrbio do sono deve ser avaliado e tratado adequadamente”, alerta a Dra. Andrea Bacelar.
De acordo com ela, o tratamento da insônia envolve a mudança de hábitos e, às vezes, uso de medicações hipnóticas por curto período de tempo. “Vale destacar que remédio para dormir, isoladamente, nunca é tratamento para insônia. É preciso ir além e mudar hábitos que pioram a qualidade do sono e a insônia”, frisa a neurologista.
Frente ao problema cada vez mais frequente, muitas tecnologias estão sendo desenvolvidas para monitorar e avaliar a qualidade do sono, como aplicativos de celular e dispositivos como relógios, por exemplo. Apesar de facilitadores, esses gadgets só têm real eficácia se o usuário sabe interpretar os dados fornecidos pela tecnologia, é o que destaca o médico otorrinolaringologista Dr. George Pinheiro, médico do sono e membro da Associação Brasileira do Sono.
“Esses novos dispositivos podem ajudar a monitorar o sono, auxiliar no diagnóstico e no tratamento de distúrbios do sono, porém, é importante interpretar adequadamente os dados coletados. Principalmente porque quando se fala de estágios do sono essas tecnologias não têm uma concordância tão precisa se comparadas com o exame padrão ouro, que é a polissonografia”, pontua.
Entre as possibilidades tecnológicas, o médico do sono destaca a tecnologia que permite avaliar a presença e o grau de apneia obstrutiva do sono por meio da medição da oxigenação do sangue com um oxímetro de alta resolução associado a um aplicativo de celular.
“No campo da terapia, surgiram startups nacionais para abordagem da insônia crônica com terapia online por aplicativos de smartphone. E, no acompanhamento dos usuários de CPAP – pequeno e silencioso aparelho compressor de ar que ajuda a melhorar a qualidade do sono – é possível verificar a eficácia da terapia e realizar ajustes a distância por plataformas remotas”, explica o otorrinolaringologista.
5 dicas para melhorar a qualidade do sono
Confira, abaixo, 5 dicas de como melhorar a qualidade do sono e o seu dia a dia recomendadas por especialistas da Associação Brasileira do Sono.
1. Estabeleça uma rotina durante o dia
Organize sua agenda e divida seu tempo entre as tarefas acadêmicas, profissionais, físicas, convívio familiar, entretenimento e alimentação. O equilíbrio é muito importante.
2. Estabeleça uma rotina para a noite
Procure dormir e acordar sempre em horários regulares. Este hábito ajudará a manter os ritmos biológicos do seu organismo. Além disso, evite uso de tablets, celulares, computadores e televisão pelo menos 1 hora antes de dormir. A luz emitida por estes aparelhos promove excitação fisiológica e dificulta o sono.
3. Deixe a luz entrar
Abra as janelas de casa assim que acordar e permita que o ar circule. Tomar sol também é importante para a manutenção de vitaminas essenciais à saúde.
4. Cultive o contato consigo mesmo
Crie o hábito de colocar seus sentimentos e reflexões em um papel. Essa prática ajuda a ter um contato mais profundo com seus sentimentos e também serve como uma importante válvula de escape. Meditação e oração também podem ajudar, caso você seja uma pessoa religiosa.
5. Cultive o contato com sua família
Caso more com outras pessoas, procure manter uma convivência harmoniosa, respeitando o tempo e o espaço do outro. Além disso, organize-se para terem momentos juntos, para além das refeições, que podem ser, por exemplo assistir filmes ou séries juntos ou ainda momentos de lazer com jogos.
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