A Inteligência Artificial (IA) pode desempenhar um papel decisivo na luta contra a crise climática. Um estudo da London School of Economics e da Systemiq estima um crescimento no uso estratégico da IA até 2035 em três setores-chave: energia, carnes e laticínios, e veículos rodoviários leves. Isso poderia reduzir entre 3,2 e 5,4 gigatoneladas (Gt) de dióxido de carbono equivalente (CO₂e) por ano.
O número representa uma contribuição significativa para o cumprimento das metas climáticas globais e poderia aproximar o mundo em até 36% do alinhamento com uma redução de emissões no cenário de negócios como de costume (BAU – Business-as-Usual).
No setor de energia, a IA pode otimizar redes elétricas e aumentar a eficiência de fontes renováveis, como solar e eólica. Com ganhos de até 20% no fator de carga dessas fontes, a expectativa é de uma redução de 1,8 GtCO₂e anuais até 2035, o equivale a quase 5% das emissões globais atuais. Isso sem depender de grandes mudanças nas taxas de adoção, que já são elevadas devido à atratividade econômica das energias limpas.
Já no setor de carnes e laticínios, a IA pode acelerar a adoção de proteínas alternativas, melhorar sabor e textura e reduzir custos de produção. Em um cenário ambicioso, as tecnologias de IA ajudariam a alcançar a paridade de preço com produtos convencionais, resultando em economias de até 3 GtCO₂e por ano.
No setor de veículos rodoviários leves, os ganhos vêm da otimização no uso dos automóveis, com a IA promovendo mobilidade compartilhada e rotas mais eficientes — o que reduz os quilômetros rodados. Além disso, a IA pode impulsionar a adoção de veículos elétricos ao prever locais ideais para instalação de carregadores e ao desenvolver baterias mais eficientes. O potencial de redução nesse setor varia entre 0,5 e 0,6 GtCO₂e por ano.
Impacto positivo supera consumo energético da IA
Apesar do alto consumo energético de data centers e sistemas de IA, os autores indicam que os ganhos superam os impactos ambientais. As emissões evitadas podem exceder o aumento estimado de 0,4 a 1,6 GtCO₂e causados pela operação desses sistemas.
A projeção considera três cenários de crescimento da IA e parte da premissa de que os data centers operam com a intensidade média de carbono da matriz energética global. A análise não contabiliza o uso de energias renováveis contratadas via PPAs e assume taxas constantes de eficiência até 2035.
Também não foram incluídos todos os efeitos indiretos — que podem tanto reduzir quanto amplificar os benefícios. Por exemplo, IA pode baratear serviços e aumentar sua demanda (revertendo parte das economias), mas também pode liberar recursos para tecnologias como captura de carbono.
Papel estratégico dos governos
O estudo alerta que o potencial da IA para o clima não deve ser confiado apenas às forças de mercado. Governança pública ativa é fundamental para uma transição justa e eficiente.
Isso inclui incentivar o uso de energia renovável nos data centers, promover modelos energeticamente eficientes e garantir o acesso à tecnologia por países em desenvolvimento.
“Os governos também podem alavancar o poder da IA para promover um senso coletivo de responsabilidade e ação climática. Isso pode envolver políticas e campanhas de conscientização pública que usem IA para engajamento comunitário e disseminação de informações”, afirma o estudo.
A atuação pública também é essencial para reduzir desigualdades entre Norte e Sul globais, e fomentar investimentos em educação, inovação e infraestrutura em IA.
Um futuro mais limpo e inteligente
Os autores identificam cinco alavancas principais pelas quais a IA pode acelerar a descarbonização: transformar sistemas complexos; descobrir tecnologias mais limpas; influenciar comportamentos; modelar intervenções climáticas; e aumentar a resiliência.
“Embora a IA possa contribuir para o aumento das emissões por meio do consumo de energia dos data centers, nossas estimativas mostram que o potencial de redução em apenas três setores compensaria mais do que o aumento total em todas as atividades econômicas. A chave será canalizar aplicações práticas para áreas-chave de impacto, a fim de acelerar a adoção e a eficiência de soluções de baixo carbono”, conclui o levantamento.
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