Mudar de trabalho não é uma decisão simples de ser tomada. Pelo menos não para a maioria das pessoas. Assim como todo tipo de mudança, resoluções importantes acerca da carreira profissional trazem incertezas e medos e provocam insegurança, especialmente no atual cenário, com mercado de trabalho abalado pela pandemia, altos índices de desemprego e grande instabilidade econômica.
Porém, permanecer em um emprego que não traz realização, certamente, não faz parte dos planos de qualquer profissional que tenha ambição e desejo de crescer na carreira. Além disso, a sensação de insatisfação permanente pode trazer problemas ainda mais sérios, como distúrbios emocionais.
Como equilibrar essa equação e decidir se está na hora de mudar de trabalho? Ter claras as expectativas com relação ao emprego atual, ponderar seus objetivos, conversar com a liderança e planejar o futuro são algumas estratégias que podem ajudar.
Mudar de trabalho vs estabilidade: uma equação que não existe
E se eu sair do meu emprego e não encontrar outro? Como vou pagar as contas? Será que é melhor ser resiliente e aceitar as condições do meu atual trabalho e não me arriscar? Se eu permanecer aqui, quais as perspectivas para minha carreira profissional?
Questionamentos como estes frequentemente são colocados na balança por quem está pensando em mudar de trabalho e, nestas reflexões, o medo do desemprego e as preocupações financeiras decorrentes dele têm grande peso. Não sem motivo: a pandemia provocou grandes impactos no mercado de trabalho, aumentou a fila do desemprego e acentuou a concorrência por vagas, assim como o temor de não ter recursos financeiros suficientes para arcar com as necessidades básicas.
Apesar destes medos, é preciso, sim, reservar um lugar especial nesta balança para pesar os níveis de satisfação profissional com o atual trabalho, considerando, ainda, que a tal ‘estabilidade no emprego’ pode não ser tão real como aparenta. É o que defende a diretora da Associação Brasileira de Recursos Humanos (ABRH) Centro-Oeste Paulista, Clara Cortez, especialista em Gestão Estratégica de Pessoas pela FGV e sócia na Missão Criativa Consultoria.
“O medo do desemprego existe, por conta das necessidades básicas que precisam ser atendidas, mas vejo uma mudança no mercado de trabalho relacionada com as empresas e pessoas que nele atuam. É cada vez mais presente a necessidade de encontrar sentido no trabalho que se exerce, além de uma busca pelo equilíbrio entre profissão e outros papéis desempenhados em nossa vida. A pandemia mudou a nossa relação com o trabalho, trouxe ele para dentro de casa, a organização familiar mudou, novas formas de contratação foram consideradas, quer mais resiliência para adaptação nesse cenário?!”, questiona.
A especialista chama a atenção ainda para a ilusão relacionada à estabilidade no trabalho. “As mudanças de contrato já eram uma tendência e foram aceleradas durante a pandemia. Esse fator tira a questão de uma certa ‘estabilidade’ que o trabalhador possuía ao estar empregado, causando assim uma insegurança sobre o futuro. O cenário antigo de funcionário CLT com determinada carreira mudou. O profissional precisa estar antenado com relação a isso, até para que desenvolva competências que atendam a esse novo momento de mercado”, pontua Clara Cortez.
A importância da resiliência para a carreira profissional
Pesquisas apontam que o brasileiro se tornou mais resiliente no trabalho por conta do momento delicado pelo qual a economia passa e do medo de ficar desempregado. Na prática, isso significa que profissionais de diversos setores estão pensando mais antes de mudar de trabalho e até mesmo aceitando situações com as quais não concordam apenas para não correr o risco de demissão.
“Por necessidade de manter o emprego as pessoas podem aceitar situações que desencontram de suas reais escolhas, mas é importante saber elaborar e expor a opinião, se posicionando com inteligência emocional. Somente ‘aceitar’, com o tempo, pode causar distúrbios emocionais em quem não está de acordo com as decisões que estão sendo tomadas”, alerta Clara Cortez, que defende que concordar com tudo é prejudicial, inclusive, para as organizações, que perdem visão crítica de melhoria.
“Um ponto importante aqui é considerar que ser resiliente não é aceitar tudo. A resiliência está relacionada ao movimento de expandir e retrair, saber lidar com situações adversas, que contrariem sua opinião de forma positiva, e tirar um aprendizado, aproveitando para que tenha uma oportunidade de desenvolvimento após uma situação de crise. Ter resiliência não é ficar parado, mas, sim, movimentar, entender e agir”, reforça a diretora ABRH.
Decisão requer autorreflexão e planejamento
Se você chegou a essa parte do texto buscando descobrir se está na hora de mudar de trabalho, preste atenção: é você quem tem a resposta para esta pergunta.
“A decisão precisa ser pautada em uma autorreflexão. A pessoa precisa olhar para ela e para o contexto. Entender quais são suas expectativas e se elas condizem com a situação, sempre com empatia”, orienta Clara Cortez, que completa: “Metaforicamente, eu diria para ouvir o coração. Lá sempre estão as respostas. No fundo, sempre sabemos o que fazer, só existe medo e insegurança para tomar algumas decisões”.
Apesar de não haver uma resposta pronta para quem quer saber se está na hora de mudar de trabalho, a especialista em Gestão Estratégica de Pessoas explica que algumas atitudes podem guiar o profissional no percurso que deve conduzir à tomada de decisão.
“É preciso se planejar e não tomar uma decisão de cabeça quente. Antes de tudo, a pessoa precisa ter clareza do que busca e entender com o que está insatisfeita. É com o trabalho? Com o líder? Com o salário? Depois, deve conversar com a empresa sobre o assunto. Situações podem ser revertidas com conversa”, orienta Clara Cortez.
Considerando que essa conversa já tenha acontecido e não há perspectivas de mudança, o profissional deve se planejar financeiramente e profissionalmente para essa transição.
“O risco sempre vai existir. Ter ‘cor-agem’ é agir com o coração, quando você busca o que está conectado ao que acredita. Claro, é importante se planejar para dar passos possíveis. Considerando o cenário atual, isso não tem preço”, reforça a sócia da Missão Criativa Consultoria.
Clara Cortez sugere ainda uma reflexão sobre a decisão de manter um emprego considerando apenas o aspecto financeiro e ignorando a sensação permanente de insatisfação. “Trabalhar em um ambiente que você se sinta insatisfeito, engessado, estagnado… será que vale a pena? Não digo para jogar tudo para o alto de um dia para o outro, mas, sim, considerar buscar realização, se capacitar para o que deseja realizar, buscar aumentar sua rede de contatos, estabelecer parcerias, melhorar o seu currículo, tomar a decisão ouvindo o coração, mas com racionalidade”, destaca.
4 passos práticos para a decisão
1. Tenha clareza de suas expectativas
Procure refletir sobre seus objetivos profissionais, sobre qual função deseja desempenhar, qual salário gostaria de ganhar, quais desafios gostaria de encarar, qual é o ambiente que deseja trabalhar e outras questões relacionadas ao emprego.
“Essas reflexões são importantes, pois é uma forma de você construir o seu caminho e não esperar apenas da empresa que apresente essa trajetória para você. Ter clareza do que busca e onde quer chegar tira aquele sentimento de insatisfação constante, que pode gerar uma decisão equivocada. Quando você sabe o quer, você escolhe o seu caminho e tem capacidade de avaliar se aquele desafio profissional está atendendo ou não às suas expectativas e se está na hora de tomar uma decisão de mudança”, explica Clara Cortez.
2. Busque o diálogo na atual empresa
Depois de ter claros quais são seus anseios em relação à carreira profissional, é necessário buscar diálogo dentro da empresa onde atua. “Converse com o seu líder sobre isso e sobre quais são as possibilidades que o aproximam desse ideal. É importante que empresa e colaborador falem sobre as suas expectativas, assim ambos poderão avaliar o quanto podem contar um com o outro. É uma via de mão dupla”, aponta a especialista.
Agora, se já houve essa conversa e nada mudou, atenção! É importante refletir sobre o quanto a empresa considera a opinião de seus funcionários. “Avalie se você está fazendo a sua parte, converse com o líder sobre isso e o motivo de não receber retorno”, aconselha Clara Cortez.
3. Identifique a compatibilidade de seus valores com os da empresa
Outro ponto que merece destaque no processo de reflexão é a compatibilidade de valores entre funcionário e empresa, segundo a diretora da ABRH. “Se você se sente desrespeitado, oprimido, não ouvido… se isso for importante para você e não existe um espaço que se possa falar sobre o tema, é mais um ponto de atenção. Com o tempo, essa situação gera insatisfação e prejudica o desempenho no trabalho”, explica.
4. Faça um planejamento e busque novas oportunidades
Se você chegou à conclusão de que o melhor para a sua carreira profissional é mudar de trabalho, é possível aproveitar a ‘segurança financeira’ do atual emprego para planejar essa mudança.
“O planejamento diminui os riscos. Por isso, o profissional deve se planejar financeiramente e também aproveitar para melhorar seu currículo, se capacitando para novos desafios, para, assim, conseguir se adequar ao cargo que deseja, ao mesmo tempo em que busca novas oportunidades mais conectadas às suas expectativas”, orienta Clara Cortez.
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