O que é preciso para identificar tendências que mudam o mundo e que realmente durarão? Na última década, Rohit Bhargava e Henry Coutinho-Mason estiveram na linha de frente do futuro, fazendo pesquisas que os levaram a laboratórios de ponta, instalações de testes particulares e vitrines apenas para convidados em todo o mundo. Eles lançaram seu novo livro no SXSW com conclusões, histórias e as pessoas instigadoras mais poderosos que estão moldando a próxima década da humanidade em “O Futuro Normal: como viveremos, trabalharemos e prosperaremos na próxima década”.
De arranha-céus biofílicos a IA generativa e interfaces hápticas, Bhargava traz uma visão clara de como a tecnologia está mudando nosso mundo, e como nós mudamos junto com ela. O autor de “Não Óbvio”, que esteve presente em um painel no Conarec em 2022, ensina a pensar fora da caixa para olhar o mundo de forma mais ampla, e assim desenvolver a habilidade de fazer uma curadoria de ideias que levam à capacidade de prever melhor o futuro.
Teconologia muda nossa forma de ver o mundo
Uma das crises de hoje é acreditar, saber em quem e no que acreditar. “A publicidade já funcionava assim, mas a IA mudou nossas perspectivas e ampliou o receio sobre sermos manipulados o tempo todo. Já números não mentem, certo?”, questiona Bhargava, ao apresentar um dado de que 82% das estatísticas são completamente inventadas.
Isso torna o desafio ainda maior: como encontrar a verdade e ver coisas que outros não estão percebendo. Rohit Bhargava batizou … de non-obvious thinking, o pensamento não óbvio.
Para o pensador, quem consegue estabelecer esse tipo de lógica na vida, vencerá. No caso dele, o insight veio durante os Jogos Olímpicos de Sidney, em 2004. Acompanhando a competição de salto em altura, se lembrou do primeiro atleta que decidiu fazer o salto de costas – uma técnica inovadora que se tornou hegemônica e levou seu nome: o salto Fosbury.
Leia Mais: Como antecipar tendências: olhe para além do óbvio
O caso fez Bhargava refletir sobre o que motivou Dave Fosbury, em 1968, a decidir saltar de um jeito completamente diferente do que outros atletas faziam até então. “Eu quero ser essa pessoa, é assim que quero pensar”, revela Bhargava.
E pensar de um jeito diferente inclui um olhar atento para o mundo e o que acontece nele em vez de prestar atenção no chão ou na tela do celular. E isso transforma as pessoas no que o autor considera mais importante, o que o filósofo Issac Asimov definiu como ser alguém que compreende rápido, em vez de ser um leitor rápido.
Não Óbvio
Esse foi o começo da série non obvious, de Rohit Bhargava, que culminou com o lançamento do livro “Non Obvious Megatrends”, em 2020, em que antecipava o que se tornaria tendência no futuro. No entanto, o real desafio, aponta, “não é prever o futuro, é antecipar o que será normal. Quando pensamos em como o futuro será, temos cenários bem futuristas”, e cita atividades físicas, moda e design com abordagens desnecessárias e até estapafúrdias, “porque a maior parte das previsões são esperanças, medos, fantasias e bobagens”, afirma.
O único futuro que podemos prever é o que podemos imaginar, vaticina Bhargava. Então é preciso aprimorar nossa imaginação, nos tornarmos melhores em pensar no futuro. Para o autor, é fácil fazer isso no curto prazo, “mas falta imaginação sobre o futuro no longo prazo e nos apegamos mais a enredos distópicos, mas a tecnologia está cada vez melhor – às vezes de formas ruins e perigosas – porém com pessoas incompetentes no comando. Isso é um problema para o mundo”, aponta.
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E como mudar essa expectativa de que o futuro será pior do que o passado, questiona Bhargava. “Se a expectativa é que o futuro será um desastre, é isso que criaremos. Nós queremos lutar contra essa epidemia global de pessimismo em relação ao futuro. A boa notícia é que há exemplos e histórias que nos inspiram a pensar em como o futuro pode ser”.
“A mentalidade futurista que defendemos é transformar o futuro que vemos no cinema em algo normal no futuro real. Carros que voam, tem algo mais futurista do que isso? No entanto eles já estão sendo testados”
Tendências do Futuro Normal
Como transformar essa perspectiva no normal no futuro? Bhargava destaca os privilégios que tem em conviver com pessoas excepcionais, ter acesso à produtos e serviços, novo e em teste, a um bom networking e a recursos. Com esse combo, apresenta insights para criar um ambiente mais igual e mais justo para alterar os clichês sobre um futuro ruim e desigual.
Carros voadores
Que já estão sendo testados e foram apresentados na CES
Exoesqueletos biônicos
Mais do que oferecer superpoderes, podem ajudar pessoas com deficiência ou só dar mais força para carregar caixas em um armazém
Capa de invisibilidade
Não é só algo para filmes de James Bond, a BMW está testando na plataforma E Ink ferramentas que permitem trocar a cor do carro. Não parece tão distante de pensar que uma ilusão de invisibilidade pode ser desenvolvida.
Leia Mais: Robôs para ajudar nas tarefas do dia a dia estão perto de se tornar realidade
Robôs assistentes
A grande revolução depois dos robôs aspiradores serão robôs cortadores de grama, aposta Bhargava
Visão de raio x
Empresas estão testando lentes de contato que oferecem informações adicionais e não só a correção de grau, como se fossem capazes de ver além das próprias lentes, como identificar uma constelação no céu
Bem-estar psicodélico
Vários estudos têm apresentado os benefícios no tratamento e na cura de doenças com ativos psicodélicos, como câncer, depressão e síndrome de estresse pós traumático, porque os psicodélicos têm se mostrado capazes de reorganizar e religar conexões no cérebro ao ponto de curar uma doença
Aprendizado instantâneo
Fazer download de informações direto para o nosso cérebro. Para Bhargava parece ideia de ficção científica, mas não está tão longe de acontecer
Luvas hápticas
Através de impulsos elétricos que vão da luva ao cérebro, é possível aprender a tocar piano em apenas 15 minutos, por exemplo. Como funciona? Memória muscular! Ao tirar as luvas, os dedos lembram dos movimentos e do ritmo que os impulsos “ensinaram”.
Roupas indestrutíveis
Bhargava apresentou seu painel no SXSW usando uma camiseta indestrutível, feita de 10 mil partículas de cerâmica. O par de tênis é reciclado, feito inteiramente de sacolas plásticas e garrafas pet. Henry Coutinho-Mason, co-autor com Bhargava em “O Futuro Normal: como viveremos, trabalharemos e prosperaremos na próxima década”, calçava o primeiro par de tênis totalmente circular – que pode ser picado e compostado na natureza.
Monitoramento metabólico
Monitorar parâmetros que indicam como anda nossa saúde – como pressão, glicose e colesterol – pode se tornar normal como o contador de passos do celular. E antecipar problemas antes que eles virem doenças.
Novos sintéticos
Produtos sintéticos, de embalagens à comida, podem revolucionar nossos hábitos de consumo aliados à uma consciência ambiental maior, que reduza o impacto ambiental e ético de produtos como plástico e de origem animal. Essa transformação também vai mudar a forma como as marcas lidam com o conceito de autenticidade de seus produtos, ressalta Coutinho-Mason.
Companheiros virtuais
Como funcionará desenvolver uma relação significativa com um aplicativo ou um robô? Para além das sugestões que o filme “Her” (2013) apresenta, companheiros virtuais podem promover um apoio consistente à saúde mental dos usuários. Entre os exemplos, está a recém lançada AI desenvolvida pelo Snapchat.
ChatGPT e IAs conversacionais
Além disso, os autores transformaram o próprio livro em um chatbot, com quem é possível conversar sobre os aspectos mais relevantes de cada capítulo, resumir itens e aprofundar pontos apresentados na publicação.
Enquanto está claro que o modelo de inteligência conversacional não é capaz (ainda? Ou nunca?) de substituir uma pessoa, os recursos do modelo podem gerar insights poderosos que melhoram inclusive a qualidade dos materiais. O ChatGPT foi usado durante a elaboração do “O Futuro Normal”. Não para escrever um capítulo, mas Bhargava e Coutinho-Mason pediram reviews negativas sobre o conteúdo do livro. As respostas foram úteis para corrigir alguns pontos e captar detalhes que haviam escapado a atenção.
A ferramenta, protagonista de debates intensos nos últimos meses. Nos extremos, ela pode ser vista como um atalho para tarefas que seriam extenuantes ou um matador de empregos. O fato, destaca Barghava, é que ela é disruptiva e vai filtrar talentos, além de exigir mais qualidade de quem produz conteúdo.
No livro “O Futuro Normal”, Rohit Bhargava e Henry Coutinho-Mason celebram os criadores que estão moldando o futuro da humanidade. Para o autor, só será possível construir um futuro melhor, se todos souberem sobre essas pessoas, a quem chamou de instigadores.
“Saber sobre os produtos que estão criando, as iniciativas que estão movendo, e compartilhar ideias é a única forma que vamos acabar mudando o mundo. Não é preciso criar algo para ser inovador, você pode ser a pessoa que espalha a informação”, avalia Bhargava.
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