Há alguns anos, Michael Solomon estava trabalhando como consultor de uma agência de publicidade em Nova York para ajudar uma das maiores empresas de cuidados e bem-estar a criar uma campanha. O guru do marketing então conversou com o responsável pela conta para entender qual era o perfil do consumidor do produto que seria apresentado. Ele respondeu que era uma mulher de 20 e tantos anos, urbana, sofisticada e que gostava de sair à noite. Alguém como as personagens do seriado “Sex and the City”. O problema é que, quando Solomon analisou os dados, descobriu que o cliente era, na verdade, uma mulher de 50 e tantos anos, que morava sozinha e tinha muitos gatos. “Ou seja, estavam criando uma campanha de marketing para os clientes que gostariam de ter, não para os que realmente compravam os produtos”, afirmou o especialista, durante o Conarec 2018, em São Paulo. Essa experiência mostra a importância de conhecer realmente o consumidor. Precisa haver empatia não para imaginar como o consumidor se sente e, sim, para perguntá-lo como se sente. “Há pesquisas que mostram que os publicitários, muitas vezes, se projetam nos consumidores, em vez de ouvi-los verdadeiramente”, acrescenta.
Mas, saber quem é o cliente tão importante quanto saber falar com ele. “Sabem quantas propagandas um consumidor está exposto, em média, por dia? São mais de 5 mil. Isso significa que nós — estou me incluindo — processamos essas 5 mil mensagens? Não. Esse é o maior desafio do marketing atualmente: conseguir a atenção do consumidor em meio a inúmeros anúncios e, mais que isso, conseguir engajamento”, define. Segundo o especialista, há marcas e canais de comunicação que são naturalmente mais propensos a engajar os consumidores. É o caso de reality shows: estão longe de ser realidade, como diz o nome, no entanto, conquistam a atenção do público. “No fim das contas, o que queremos é que os nossos consumidores sejam tão engajados quanto os fãs de reality shows”, acrescenta.
Para as empresas, no entanto, o que importa é o retorno sobre os investimentos (ROI, na sigla em inglês). “Hoje em dia, somos guiados por dados, resultados… então, ROI é tudo, certo? Ou significa uma visão míope do cenário? Na minha opinião, é miopia, pois também é necessário o que chamo de “Novo ROE”: retorno sobre envolvimento, o que significa uma perspectiva de longo prazo”, diz. A ideia é a seguinte: ao mesmo tempo que se busca ter lucro trimestre após trimestre, é imprescindível engajar o consumidor no longo prazo oferecendo grande valor para ele. Pois é aí que está a sustentabilidade do negócio.
Uma das campanhas que conseguiu fazer isso foi a de uma fabricante francesa que vende água. Os marketeiros queriam mostrar algo diferente, algo que fosse além de “com água você se hidrata”. (Clique aqui para ver o anúncio.) “O que vemos aqui é o Santo Graal do marketing, pois alcançaram ressonância, que é quando o propósito da marca se encaixa com o propósito do consumidor”, afirma. Nesse sentido, o especialista diz que é necessário mudar a forma como é feita a pesquisa de marca. Tradicionalmente, as marcas são ativos criados para o consumo dos clientes, no entanto, hoje as marcas são cocriações das empresas e dos consumidores.
Nesse sentido, também é importante criar uma história por trás, não apenas focar no produto ou na commodity. As marcas têm personalidade. “Pensem por um instante: qual é a personalidade da sua marca? Sofisticada, sexy, maravilhosa… pode ser várias coisas. Sempre se dividiu os consumidores por faixas sociais, idade, gênero… mas marketing não é física quântica. Ninguém quer ser colocado em categorias”, explica. Para exemplificar a sua fala, Solomon recorre ao caso das Havaianas que começou como fabricante de calçados baratos e voltados para as classes mais baixas, mas, com o passar do tempo, expandiu sua oferta de cores, feitios e acabou se tornando fashion — tanto que a cantora Jennifer Lopez foi fotografada usando chinelos Havaianas. “Isso mostra que segmentação tradicional não faz sentido. Por isso, temos que quebrar muros”, diz. Solomon afirma que existem sete muros que precisam ser quebrados pelo marketing:
1. Eu x nós
O slogan dos baby boomers é “faça você mesmo e sozinho”. Isso mudou completamente, pois hoje em dia os jovens não fazem nada sem a validação do seu círculo social. Com isso, tem-se uma transição da era do “eu” para a era do “nós”. O que isso significa para o marketing? “Precisa buscar uma explosão de validação”, afirma. Nesse sentido, uma campanha muito bem-sucedida foi a da Burberry que pediu a suas clientes para tirar fotos com seu trench coat icônico. “Estamos em um novo momento em que a compra se tornou um evento social: muitos consumidores somente concluem a compra depois dos comentários positivos dos amigos nas redes sociais”, diz.
2. Hype x buzz
Hype é o barulho criado pelo marketing e buzz é o boca a boca que não foi criado pelo marketing. “Sabemos da importância do boca a boca, mas hoje em dia é essencial, pois as pessoas procuram recomendações nas redes. Também por isso é tão importante fazer marketing de conteúdo”, afirma.
3. On-line x off-line
Antigamente havia essa dicotomia, hoje, essa distinção é artificial. “Acredito que é possível estar off-line e on-line ao mesmo tempo. Por exemplo, vocês estão me assistindo agora nessa palestra e ao mesmo tempo estão conversando no celular”, explica.
4. Ter x alugar
Se antes o “ter” era muito importante, agora, os mais jovens preferem alugar coisas. “Eu chamo isso de consumo colaborativo. É possível compartilhar carros, livros, roupas…”, exemplifica.
5. Homens x mulheres
Definir gêneros hoje em dia é bastante controverso: afinal, o que significa ser homem e o que significa ser mulher? Por isso, há marcas criando produtos andróginos.
6. Homem x máquina
As pessoas não apenas usam coisas em seus nossos corpos como também colocam coisas dentro de seus corpos. “Daqui a um tempo, pode ser que a gente use as marcas dentro de nós.”
7. Produtores x consumidores
Os consumidores têm produzido cada vez mais conteúdos. Há dez anos, o comercial mais memorável do Super Bowl tem sido feito por consumidores. “A conclusão é que as empresas não detêm mais as marcas, as pessoas têm o poder de reinventá-las.”