A ansiedade relacionada à situação financeira pode ser um fator significativo afeta – e muito – a qualidade de vida das pessoas. E não é para menos, afinal a pressão para atender às obrigações financeiras, como contas, dívidas e despesas inesperadas, é o estopim de um ciclo de preocupações que, se não gerenciado adequadamente, pode levar a sérios problemas de saúde mental.
Prova disso pode ser percebida na 10ª edição da série “Serasa Comportamento“, promovida pela Serasa, no dia 3 de setembro. Em suma, a ideia é divulgar mensalmente estudos abordando diversos cenários relacionados à forma como os brasileiros lidam com suas finanças. A transmissão online contou com a presença de Laís Gabriel, especialista em educação financeira da Serasa; Felipe Schepers, COO e co-founder do Opinion Box; e Valéria Meirelles, psicóloga especializada em assuntos financeiros.
Fato é que, de cada três brasileiros, dois já tiveram a saúde mental impactada por causa de problemas financeiros. “Ou seja, a cada três pessoas que conhecemos, possivelmente duas delas passaram ou estão passando por dificuldade com as contas”, explicou Felipe Schepers. Assim, a pesquisa chegou a conclusão que 67% dos brasileiros sofrem com atribulações do ponto de vista econômico. E esses contratempos, segundo os entrevistados, afetam em cheio a saúde mental.
Estresse das dívidas
Com o tema “O Impacto das Finanças na Saúde Mental do Brasileiro”, a pesquisa da Serasa contou com 1.766 consumidores de todo o país. Em síntese, a ideia foi entender as conexões entre dificuldades financeiras e problemas de saúde mental. Por consequência, foi investigada a relação entre emoções e dinheiro. O Instituto Opinion Box produziu o estudo, que mostra que despesas com assistência psicológica já ocupam a sexta posição nas prioridades de gastos das famílias brasileiras, à frente de custos com automóveis e educação.
Se por um lado esse dado indica que as pessoas estão sofrendo do ponto de vista da saúde mental, por outro, ele indica uma mudança significativa nas percepções e necessidades das famílias. Em outras palavras, tal informação reflete a crescente valorização do bem-estar mental. A busca por apoio psicológico tem se tornado cada vez mais importante, especialmente em tempos de dificuldades, quando estressores emocionais podem afetar a qualidade de vida.
Outra informação curiosa do levantamento é que metade dos brasileiros que já enfrentaram problemas de saúde mental também lidam com dificuldades financeiras. Isso significa que em um país com mais de 72 milhões de pessoas inadimplentes, as repercussões das dívidas vão além da economia. As questões financeiras afetam, principalmente, a qualidade de vida (64%), provocando altos níveis de estresse, fadiga e insônia. Os entrevistados também mencionam impactos relacionados à ansiedade (60%), autoestima (57%) e qualidade do sono (55%).
“A pressão financeira, por si só, gera ansiedade, que é um olhar para o futuro”, comentou Valéria Meirelles. “E tal dificuldade, com certeza, gera um ciclo vicioso: a insegurança econômica gera ansiedade, que por sua vez afeta a capacidade de tomar decisões financeiras saudáveis”.
Saúde mental = sem dívidas
Esses dados revelam a interconexão crítica entre a saúde mental, muitas vezes negligenciada, e a situação financeira. E indicam a urgência de abordagens integradas para o tratamento e prevenção de problemas em ambas as áreas. Neste sentido, os debatedores salientaram que a conscientização sobre a relação entre finanças e saúde mental é um passo essencial para eliminar estigmas e propagar um diálogo aberto sobre esses temas. “Somente por meio de ações coletivas, que envolvam governo, sociedade civil, instituições financeiras e profissionais da saúde, será possível enfrentar esse desafio de forma efetiva, promovendo a qualidade de vida dos brasileiros”, pontuou Laís.
Os efeitos nas relações interpessoais também são significativos: 72% das pessoas se sentem desconfortáveis ao pedir dinheiro emprestado a familiares e amigos. Ademais, sete em cada dez indivíduos afirmam evitar discutir questões de cunho econômico. Já 61% preferem se isolar, afastando-se de amigos. Esse percentual se dá, na visão de Valéria Meirelles, porque os indivíduos com dívidas se sentem envergonhados. E óbvio, não se sentem confortáveis de pedir ajuda. “E a pesquisa nos mostra que 73% não quer ajuda por acreditar que conseguirá resolver tudo sozinho. Ou seja, no fundo, muitos acham que, ao compartilhar sua situação, estariam admitindo alguma forma de incompetência na administração de seus recursos”.
Dívidas de pessoas que prejudicam empresas
A repercussão das dívidas também impactam o trabalho dos endividados. Isso quer dizer que, 76% dos entrevistados, se estão com problemas financeiros, afirmam que passam boa parte do tempo pensando nas contas a pagar, o que pode prejudicar projetos e a colaboração com colegas. A informação da Opinion Box mostra que as dívidas não afetam apenas a vida financeira, mas também a saúde mental e, por consequência, a produtividade. O estresse gerado pode levar a um desempenho abaixo do potencial no trabalho. Na opinião de Valéria, buscar apoio é essencial para prevenir complicações na esfera profissional: “estar endividado ou enfrentar dificuldades financeiras não desqualifica o colaborador. Pelo contrário. É importante, neste sentido, cuidar da saúde mental e verificar as maneiras mais adequadas para melhorar o desempenho na empresa”, ressalta a psicóloga.
Ratificando que o brasileiro está, de fato, mais preocupado com a saúde mental, o estudo aponta que 86% dos entrevistados acreditam que cuidar do psicológico pode trazer benefícios financeiros a longo prazo. Já 67% das pessoas demonstram interesse em investir mais nesse aspecto.
E mais: 53% dos entrevistados destinam até R$ 300,00 do orçamento mensal à saúde mental. “Após a pandemia, as pessoas passaram a se preocupar mais com essa área buscando maior qualidade de vida, praticando mais exercícios e adotando outras iniciativas para lidar com suas emoções,” afirma Valéria. “Essa tendência positiva indica que a saúde mental deixou de ser uma prioridade secundária e tornou-se um objetivo fundamental para a construção de uma vida melhor”.
Mudança cultural
Esse novo entendimento sobre a saúde mental reflete uma mudança cultural significativa, onde o bem-estar emocional é reconhecido como essencial para o sucesso pessoal e profissional. A busca por terapia, meditação e outras formas de autocuidado tem se tornado cada vez mais comum, com um aumento na oferta de serviços voltados para o desenvolvimento da inteligência emocional.
Além disso, empresas também estão se adaptando a essa realidade. Muitos locais de trabalho estão implementando programas de bem-estar, oferecendo suporte psicológico e incentivando uma cultura de cuidado, que inclui pausas para relaxamento e práticas que promovem a saúde mental. Essa abordagem não só beneficia os funcionários, mas também impacta positivamente a produtividade e a retenção de talentos.
Os gastos com saúde mental
De cada 10 pessoas, 4 afirmam que já têm algum gasto fixo voltado para os cuidados com a saúde mental. O número representa 43% dos entrevistados, ante 57% que não têm dispêndios nessa área.
“Nesse aspecto, chama atenção que a maioria (24%) gastam dinheiro com medicamentos”, enalteceu Felipe Schepers. “E depois aparecem os esportes (13%). Outro dado interessante é que 49% das mulheres gastam com saúde mental, comparado a 37% de pessoas do sexo masculino. Aqui temos duas análises: como são as mulheres mais endividadas, por passar mais vezes pela mesma situação, elas acabam gastando mais. Ou também tem uma questão cultural, vez que são as mulheres que se sentem mais confortáveis para buscar uma terapia ou uma ajuda”.
Por sua vez, Valéria comentou que é verdade que muitos homens ainda enfrentam barreiras culturais que dificultam a busca por ajuda, resultando em menores investimentos nessa área. Isso tem diminuído, segundo ela, mas é essencial promover a desestigmatização da busca por cuidados mentais, encorajando indivíduos a priorizarem sua saúde emocional sem receios. “A educação e o acesso a informações qualificadas são fundamentais para que mais pessoas compreendam a necessidade de incluir essa área em seu planejamento financeiro”, explicou a psicóloga. Portanto, iniciativas que busquem facilitar o acesso a terapias e serviços de saúde mental devem ser incentivadas, contribuindo assim para o bem-estar geral da população.
Gastos totais
No que diz respeito à prioridade com os gastos totais, em primeiro lugar estão as contas básicas, com 90% dos consumidores priorizando luz, água, aluguel, condomínio. Em segundo lugar, estão os gastos com supermercados (86%). Na sequência, chama atenção a fatura do cartão de crédito (82%); internet e telefone (76%); aluguel ou prestação do financiamento do imóvel (69%). Em sexto lugar, aparece a saúde mental (61%), seguida dos dispêndios com automóveis (59%); e escola e faculdade (58%).
É relevante observar que, à medida que as contas básicas e os gastos essenciais se tornam prioritários, outras áreas, como lazer e viagens, podem ser relegadas a um segundo plano. Isso aponta para uma mudança no comportamento de consumo, onde a segurança financeira e a estabilidade se sobressaem ao desejo de usufruir de experiências.
Outros dados relevantes
- A ansiedade, problema mais comum de quem tem dívidas, se destaca entre mulheres, gerações mais jovens e pessoas de baixa renda. Ao todo, 57% dos entrevistados que sofrem de ansiedade têm entre 18 e 29 anos (geração z). No que tange à renda familiar, a maioria (52%) têm baixos recursos;
- As dificuldades financeiras refletem mais na qualidade de vida (64%) dos brasileiros. Entretanto, o humor também é afetado (54%), assim como a confiança, com o mesmo percentual; energia e disposição (50%), alimentação (46%) e relacionamento com o parceiro (45%).
Por fim, ficou claro o quanto é importante reconhecer os sinais de estresse financeiro e buscar estratégias eficazes para administrar essa pressão. Um primeiro passo pode ser a criação de um orçamento detalhado, que permite visualizar despesas e receitas, ajudando a priorizar gastos essenciais. Além disso, é fundamental manter uma reserva financeira para emergências, o que pode oferecer uma sensação de segurança e controle.