Em 2023, a Cimed lançou seu hidratante labial da marca Carmed em parceria com a marca de balas e doces Fini. Juntas, as marcas lançaram um produto que exala nostalgia com uma pitada de inovação. Tanto que o produto tomou conta das redes sociais e esgotou rapidamente nas farmácias – principal ponto de venda do hidratante labial. No final, até mesmo essa lógica da escassez contribuiu para colocar o produto no mapa do consumidor.

O sucesso foi tanto que, em 2023, a Cimed faturou R$ 400 milhões com os produtos da Carmed, representando uma alta de 1.566% em relação ao ano anterior, quando faturou R$ 24 milhões. Mas essas duas marcas não são as únicas a surfarem na tendência das collabs, que cada vez mais estão criando produtos inéditos que combinam o melhor de dois mundos.

A Havaianas, por exemplo, lançou em junho de 2024 uma collab com a grife Dolce&Gabbana. Além de combinar duas marcas que, teoricamente, parecem distantes em termos de público – de um lado, o chinelo que está no pé do consumidor brasileiro, e do outro, uma boutique de luxo de vestuários, calçados e bolsas –, a novidade trouxe produtos exclusivos, com estampas clássicas da grife italiana. Tanto que, no lançamento, os consumidores estavam limitados a comprar apenas dois pares por CPF.

Essa história não para por aí – e nem as collabs. Em 2023, a Dolce&Gabbana também lançou um modelo exclusivo da cafeteira italiana Bialetti, também com as estampas da grife. Já a marca de cosméticos Creamy lançou hidratantes labiais em uma parceria com a The Coffee, com sabores inspirados nas bebidas da cafeteria. Em 2021, O Boticário lançou produtos de maquiagem em parceria com o chiclete Bubbaloo.

Esse modelo já virou tendência, e podemos esperar muitas mais collabs pela frente. O resultado não é apenas uma novidade de prateleira, mas um exemplo de como as colaborações podem criar impacto e valor para consumidores e empresas. 

Por que as collabs estão em alta? 

A convergência de marcas é uma resposta à busca incessante do consumidor moderno por experiências significativas. Em um mercado saturado de opções, os clientes são atraídos por produtos que evocam emoções e oferecem benefícios claros. 

A Carmed, por exemplo, reconhecida pela funcionalidade, encontrou na Fini um complemento perfeito. A parceria explora o conceito de nostalgia – tão presente na memória coletiva de quem cresceu consumindo os doces Fini – aliado à praticidade de um produto funcional.

Um estudo conduzido por pesquisadores chineses, publicado no JNeurosci, publicação oficial da Society for Neuroscience, aponta que a nostalgia é uma emoção predominantemente positiva que pode ser despertada por vários gatilhos externos, como música, imagens ou odores, aumentando o sentimento de conforto e bem estar.

Além do apelo emocional, a colaboração entre marcas que atingem públicos distintos pode expandir o alcance de ambas no mercado. Nesse caso, a Carmed acessa o público jovem e descolado da Fini, enquanto a Fini reforça sua imagem como uma marca inovadora ao explorar o segmento de saúde e autocuidado no qual a parceira está.

O que as empresas podem aprender com essas collab? 

Essas diferentes collabs trazem três lições importantes que podem inspirar outros players do mercado que também estão buscando formar novas parcerias: 

1. Apostar na interseção de valores 

O sucesso da collab Carmed e Fini reside na convergência de valores complementares. A Carmed oferece confiança e tradição, enquanto a Fini simboliza diversão e criatividade.

De acordo com o Sebrae, empresas devem identificar parceiros cujos valores ressoem com suas próprias marcas, criando estratégias em conjunto que gerem produtos coerentes e genuínos para ambos os públicos. 

2. Criar produtos que contam uma história 

A união entre nostalgia e inovação, como no caso do hidratante labial, cria uma narrativa que conecta os consumidores ao produto.

Contar uma história que ressoe com as emoções do público não apenas atrai atenção, mas gera lealdade, segundo um artigo científico publicado em 2023 pela revista Trends Hub, do Instituto Politécnico do Porto, que usa o Spotify como case de marca que tem um storytelling bem estabelecido.

Um exemplo citado pela pesquisadora Diana Pinto, autora do artigo, é como a plataforma de streaming apresenta em dezembro aos seus usuários o resumo do que ele mais ouviram no ano. “Não é um relatório aborrecido e entediante”, escreve, mas sim uma série de informações – no formato de story – que contam a história musical da pessoa no período e que a estimula a compartilhar com outras pessoas.  

3. Usar a colaboração como estratégia de diferenciação 

Em um mercado competitivo, destacar-se é essencial. Ao criar produtos únicos, as marcas conseguem sair da curva e conquistar novos públicos. Isso exige coragem para experimentar e sair da zona de conforto. Um caso recente é a parceria da Coca-Cola com a marca de biscoitos Oreo, em que dois novos produtos de edição limitada foram lançados no mercado: o refrigerante zero açúcar com sabor de Oreo e a bolacha com sabor de Coca-Cola.

Os desafios de colaborações entre marcas

Apesar do potencial de impacto, colaborações entre marcas também apresentam desafios significativos: 

• Alinhamento operacional: integrar diferentes culturas empresariais, cronogramas e processos produtivos pode ser um desafio. A falta de comunicação clara e planejamento pode comprometer o sucesso da parceria. Um exemplo claro que poderia dar errado, mas deu muito certo, é a collab de O Boticário com Bubbaloo. A empresa de cosméticos lançou uma linha com sete produtos com o cheiro da tradicional e nostálgica marca de gomas de mascar. O resultado? Produtos esgotados pouco tempo após o lançamento. Apesar de serem de indústrias completamente distintas, ambas as marcas souberam aproveitar o que cada uma tem de melhor em prol da parceria. 
• Risco de canibalização de marca: uma collab mal executada pode diluir a identidade de uma ou ambas as marcas. É essencial garantir que o produto final esteja alinhado com os valores centrais de cada marca. Um exemplo disso é o fato de a Coca-Cola investir em diferentes sabores e versões de seu produto, mas sempre com edições limitadas, para que uma categoria não canibalize a outra. O mesmo vale para outras marcas do grupo, como aponta o estudo “Canibalismo entre produtos”, publicado na Revista de Administração Mackenzie, com cases da indústria alimentícia brasileira.   
• Mensuração de sucesso: definir indicadores claros para avaliar o sucesso da colaboração é vital. Seja por meio de vendas, engajamento em redes sociais ou feedback do consumidor, as empresas precisam medir se a parceria atingiu os objetivos estabelecidos.

Exemplos de outras collabs bem-sucedidas

Ao longo dos anos, algumas parcerias entre grandes empresas se tornaram famosas e acabam servindo de exemplo, como a entre a  Adidas e a LEGO, que juntas, criaram tênis inspirados nos icônicos blocos de montar, explorando o apelo visual e a nostalgia de diferentes gerações.

Outro case de sucesso aconteceu quando a marca de biscoitos Oreo uniu-se à grife de streetwear Supreme, criando uma edição limitada que gerou filas e alta demanda, mesmo com um preço elevado. Por fim, a parceria de longa data entre a Coca-Cola e o McDonald’s evidencia o poder de unir produtos complementares em campanhas promocionais e ofertas exclusivas. 

Collabs: tendência para os próximos anos

Como aponta a consultoria WGSN, o ano de 2024 foi marcado pelo crescimento da chamada “funflation”, tendência em que os consumidores priorizam gastos com experiências em vez de bens não essenciais, como produtos e bens materiais. O mercado de eventos brasileiro, por exemplo, deverá atingir uma taxa de crescimento anual de 2,67%, com um volume de mercado projetado de US$ 196,8 milhões até 2028.

Para acompanhar esse consumidor cada vez mais interessado em experiências, as marcas precisarão investir na criatividade para trazer soluções inovadoras e estratégicas. A consultoria aponta que uma dessas soluções está, justamente, nas colaborações entre varejistas e indústrias, criando sinergias que impulsionem os dois setores ou marcas.

Segundo a WGSN, diversão e entretenimento serão características essenciais para qualquer estratégia de collab, representando uma forma de criar pontes entre diferentes segmentos. Além disso, uma vez que o consumidor do futuro possui uma visão menos romantizada sobre o consumo, estratégias que vão além do varejo tradicional poderão representar 40% da receita dos varejistas em 2027.

No entanto, sucesso não vem sem esforço. É preciso pesquisa, criatividade e um entendimento claro do que o consumidor valoriza. Com um planejamento estratégico e uma execução cuidadosa, as colaborações podem ser um dos maiores motores de inovação e conexão no mundo empresarial.

*Foto: Cimed/Divulgação.