Há pouco mais de dez anos, quando ainda me dedicava diretamente à atividade publicitária, fui um defensor da chamada “Lei Cidade Limpa”. À parte o estardalhaço marqueteiro, travestido de bandeira política do ex-prefeito Gilberto Kassab, imortalizado por criar um partido que “não é de direita, nem de esquerda, nem de centro” (o que significa que se deixa levar por qualquer governo de ocasião), achei a lei necessária. Como publicitário, criei muitos outdoors e pude prestar serviços para a “Central de Outdoor”, entidade que congregava as exibidoras de mídia exterior no País. Achava a poluição visual em São Paulo estonteante, uma profusão irregular de outdoors, cartazes, empenas, paredes, luminosos, front-lights, telões que se misturavam sem critério algum. A exploração selvagem da paisagem visual da cidade definitivamente escondia a cidade de si mesma.
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A beleza da mídia exterior está na capacidade de trazer uma renovação na paisagem a cada 15 ou 30 dias, com algumas mensagens que se integram ao mobiliário urbano, informando, entretendo e causando curiosidade. O uso desregrado e indiscriminado das possibilidades da mídia exterior, contudo, provoca efeito contrário. Quando usada com sabedoria, em locais específicos, pode ser um convite à população para que ganhe as ruas e se sinta parte da cidade, como vemos em Times Square, em Nova York.
Infelizmente, a Lei Cidade Limpa foi se encorpando a um ponto insuportável, como sempre ganhando vida própria ao ponto de se tornar (mais) um instrumento de tutela de cidadãos supostamente desprotegidos diante da “sanha comercial das empresas”. Após alguns anos de tentativas e informações erráticas, São Paulo ganhou um formato de mobiliário urbano aberto à publicidade, tão sutil, regrado e encaixotado, que mal consegue ser notado.
Por outro lado, as plataformas digitais de comunicação desenvolveram-se velozmente e permitiram criar novas alternativas de aproveitamento dos interiores de lojas, edifícios e negócios com visibilidade para as ruas, trazendo um pouco de colorido, movimento e descontração para o passeio urbano. Essa liberalidade já incomoda os arautos da tutela estatal indiscriminada ao ponto de proporem projetos para regular o que acontece no interior dos estabelecimentos comerciais! Ou seja, a loja procura oferecer informação e publicidade comercial – atividade permitida, necessária e das poucas nas quais o Brasil é referência mundial de qualidade e não de mediocridade – e logo um representante do Leviatã resolve mostrar seu poder para “regular” esse “exercício explícito de venda que impacta cidadãos desprotegidos”.
O resultado dessa cruzada antipropaganda é, além da interferência indevida sobre o interior de negócios legitimamente constituídos, tornar a nossa cidade cada vez mais chata. As principais metrópoles do mundo estão experimentando os benefícios e o potencial de ativação da mídia exterior. Aqui, em nome de pudores, vergonhas e ideologias desconexas, estamos obrigando nossa paisagem urbana à monotonia e ao tédio. Penso até que ponto não podíamos ter atuado no controle da esquizofrenia arquitetônica da cidade, com seus estilos embaralhados, que compõem um tecido urbano que oscila do patético ao mau gosto puro e simples, entremeado aqui e ali por construções supostamente arrojadas que só copiam projetos de outros países, com escárnio e despudor. Aos arquitetos que ajudaram São Paulo a perder e a empalidecer a beleza de seu centro antigo, tornando-o velho e degradado, tudo pode. Às mensagens publicitárias localizadas no interior das lojas, ágeis, bonitas, interessantes, criativas, sobrevém o braço imenso de uma lei mal desenhada.
Convoco os varejistas a reagirem contra a interferência de órgãos municipais em sua comunicação e liberdade de ação. A cidade pode ser limpa, sem ser chata. Telões e mídias que “chamam” consumidores para dentro das lojas, que procuram oferecer conteúdo, diversão, ofertas para as pessoas nas ruas, devem ser valorizados e incentivados. Fazem parte de um estilo de vida digital que se combina com os smartphones para ativar vendas, engajar consumidores e projetar marcas.
Se alguém discorda, solicito uma visita – que seja por vídeo – a Times Square em Nova York, a Champs-Élysées em Paris ou a City de Londres. Não me consta que alguém considere chatas essas cidades.