Se antes a felicidade no trabalho era vista como um luxo, hoje, especialistas a apontam como uma estratégia fundamental de gestão. Essa percepção tem mudado através do trabalho de profissionais que têm desbravado esse território com base científica, como é o caso da Chief Happiness Officer da Chilli Beans. Com uma trajetória que une jornalismo, estudos aprofundados em Ciência da Felicidade e prática no ambiente corporativo, Denize Savi decidiu transformar sua experiência em conhecimento acessível por meio do livro “A Ciência da Felicidade no Trabalho“.
“Depois de algumas pós-graduações e outras tantas formações na área, decidi fazer a transição de carreira e me tornar Chief Happiness Officer (CHO)”, conta Denize. “Há dois anos, a Chilli Beans abriu as portas para que eu pudesse levar esse conteúdo para o mundo corporativo. Lembro que foi um grande desafio (e ainda é) colocar em prática um tema tão complexo. Ouvia frases do tipo ‘por acaso felicidade e trabalho combinam?’. Existe uma resistência natural do mercado a esse tema. E por se tratar de algo inovador, há poucas literaturas no Brasil sobre o assunto.”
De acordo com a executiva, esses desafios foram determinantes em sua motivação para desenvolver uma metodologia e publicar um livro que pudesse ajudar as pessoas – através de ferramentas cientificamente validadas – a transformar a rotina e viver com mais sentido, propósito e satisfação.
Felicidade no presente
O livro mostra que felicidade não é um prêmio futuro, mas algo possível no presente. Mas, isso ainda parece distante da realidade de muitos trabalhadores. Denize explica que essa distância existe por vários motivos ligados à cultura de mercado. A alta competitividade, a pressão por resultados imediatos e o trabalho excessivo, fazem com que a felicidade seja vista como o bônus por meta batida ou o descanso no fim de semana. Em outras palavras, como se fosse um objetivo a ser alcançado.
“O problema de vivermos assim, à espera do próximo desejo a ser realizado, é que a felicidade se torna algo fora de nós mesmos e reservada a poucos momentos. Para ela fazer parte da rotina, precisamos compreendê-la de forma mais aprofundada”, destaca.
Por um lado, frisa a executiva, é urgente haver uma renovação na cultura do mercado. Existe uma necessidade de começar a olhar mais para o ser humano e tornar a produtividade sustentável. Por outro, há o indivíduo que deve promover a sua própria transformação interna e passar a valorizar mais o seu dia a dia, celebrar as pequenas conquistas, honrar o próprio ofício, reconhecer o seu valor e apreciar as boas relações que surgem no ambiente de trabalho.
“O livro traz uma perspectiva da autorresponsabilidade, ou seja, o que eu, enquanto indivíduo, posso fazer para construir a minha própria felicidade. Porque, sim, felicidade se aprende e se constrói, com hábitos e com consciência. Para isso, é preciso compreender a felicidade de forma mais aprofundada e vivê-la verdadeiramente. Ao fazer isso, nos transformamos e, por consequência, o ambiente ao nosso entorno, contribuindo assim, para uma cultura no trabalho mais humana e feliz”, explica.
A função do CHO e a felicidade como estratégia
O Chief Happiness Officer é o profissional que vai implementar um sistema de gestão de bem-estar e felicidade. Na prática isso significa promover uma cultura organizacional de cuidado, em que o ser humano é o centro dos negócios. De forma estratégica trabalha para construir um clima positivo e um ambiente mais feliz, saudável e produtivo.
“E como se faz isso? O primeiro passo é eleger indicadores e, através deles, promover escuta ativa, ações de reconhecimento, valorização profissional, treinamento de lideranças, comunicação interna, além de eventos que fortaleçam a cultura e promovam o ambiente de trabalho em um ambiente saudável, próspero e feliz”, frisa Denize.
Para Denize, cargos relacionados a pessoas serão cada vez mais comuns. Não importa se é Chief Happiness Officer, Chief Culture Officer, Chief People Officer ou como a empresa preferir, a executiva frisa que o importante é implementar um sistema de gestão que olhe para o ser humano.
“Temos uma nova geração que está impulsionando as organizações a repensar suas culturas, tornando-as mais humanas, autênticas, orientadas ao propósito e ao bem-estar. Essas mudanças tendem a criar ambientes mais sustentáveis, inovadores e satisfatórios, alinhados às novas expectativas de mercado”, reforça. “O mais importante é o mercado entender que ‘a maior responsabilidade social de uma empresa é enviar um ser humano melhor para casa’.”
Transformação e cultura
Para empresas que ainda não têm um CHO, mas querem começar a trabalhar a felicidade dos colaboradores, Denize ressalta que a iniciativa exige planejamento, compreensão das necessidades dos colaboradores e uma cultura organizacional aberta ao bem-estar. O conselho da CHO da Chilli Beans é começar pequeno, mas de forma consistente.
“A transformação leva tempo. O primeiro passo é realizar um diagnóstico do clima organizacional com pesquisa e depois promover escuta ativa. Crie canais de comunicação abertos e seguros para que os funcionários possam expressar suas opiniões, sugestões e preocupações. Acompanhe e demonstre que suas opiniões são valorizadas e consideradas nas decisões”, reforça.
Além disso, é importante investir em cultura de reconhecimento e valorizar o esforço, não apenas os resultados finais. É indicado ainda incentivar práticas de agradecimento, reconhecimento de conquistas e celebrações de marcos importantes. Ainda é necessário criar um ambiente de trabalho positivo e inclusivo. “Fomente uma cultura de respeito e inclusão. Invista no desenvolvimento e crescimento com treinamentos e comunicação interna”, completa.
Na Chilli Beans, felicidade dá resultado
Dentro da Chilli Beans, o programa de felicidade no trabalho à Chilli Beans começou a nascer em 2023. O projeto teve duração de um ano e o propósito era sensibilizar os colaboradores para o tema.
“Esse trabalho foi encabeçado por mim e contou com a contribuição do especialista Vinicius Kitahara que ministrou um letramento em Ciência da Felicidade e dinâmicas em grupo num primeiro passo para o que viria a ser a nova cultura da empresa. Em 2024, devido ao sucesso do programa, conseguimos implementar a gestão de bem-estar e felicidade na Chilli Beans, gestão essa que vem num processo de transformação e evolução”, explica a CHO.
Para a executiva, foi um grande desafio fazer o mercado entender e reconhecer a importância desse trabalho, que reflete diretamente na satisfação das pessoas com seus empregos. E não só isso, impacta também na produtividade, na inovação e, consequentemente, no lucro das companhias.
“Acredito que as organizações estão começando a abrir os olhos para isso. Ainda falta muito, mas as empresas que foram pioneiras iniciaram um debate bem importante e promissor. Bem como a mídia, que tem provocado reflexões sobre o tema. Ainda mais agora com a revisão da NR1 em que o mercado todo terá que se adequar para gerenciar os riscos psicossociais no trabalho. Isso faz com que as empresas busquem se adequarem”, pontua.
Diante das mudanças, foi possível notar os impactos concretos da função da CHO na Chilli Beans. No período de julho de 2024 a março de 2025, houve um aumento de 12,3% em emoções positivas. Nesse mesmo período, o engajamento e produtividade cresceram 8,6%. Já senso de realização subiu em 6,1% e a vitalidade (que engloba saúde física e mental) teve o melhor resultado, 18,3% .
Indicadores de felicidade
A gestão de bem-estar e felicidade da Chilli Beans se respalda na Ciência da Felicidade para compreender os comportamentos humanos de forma precisa através de indicadores. Os dados são computados através de uma ferramenta de avaliação mensal que faz o cálculo do bem-estar e saúde mental com base em seis pilares da dimensão humana: Emoções Positivas, Engajamento, Relacionamentos, Significado, Realização e Vitalidade (saúde mental e física).
Segundo a executiva, o instrumento de mensuração se baseia no modelo de felicidade PERMA-V, do psicólogo americano Martin Seligman, pioneiro nos estudos da Psicologia Positiva. PERMA-V é um acrônimo em inglês para Positive Emotions, Engagement, Relationships, Meaning, Accomplishment. A partir do PERMA-V, o IFOZ (Indicador de Felicidade Organizacional Zenbox) traz 24 questões relacionadas ao ambiente de trabalho.
Pequenas ações, grande bem-estar
Equilibrar felicidade no trabalho com cobrança por resultados em um mercado cada vez mais competitivo pode não ser tão simples. Diante disso, a CHO da Chilli Beans reforça que o segredo está em criar uma cultura de alta performance sustentável, onde resultados são importantes, mas não à custa do bem-estar.
Denize reforça que as pessoas precisam se sentir motivadas, produtivas e felizes. Algumas ações do dia a dia podem colaborar. “As pausas nos auxiliam a recuperar o foco depois de uma tarefa que exige muita concentração; também ajuda a regular as emoções antes que elas fiquem desproporcionais”, frisa.
Além disso, é importante praticar a gratidão pelas pequenas conquistas ou coisas boas do seu trabalho. O indicado é que esses acontecimentos sejam escritos, como forma de registro. Entre os passos em prol da felicidade no trabalho está o reconhecimento do valor das amizades e ser solícito, organizado, cultivar o bom humor, manter uma postura otimista e realista faz toda a diferença.
“Na Chilli Beans temos um manifesto que são os 12 Passos Para a Felicidade, com práticas cientificamente validadas para estímulo de felicidade, como por exemplo, agradeça, ajude, coma bem, descanse, entre outros”, finaliza.
*Fotos: Adriana Abe.