Na tentativa de entender o que leva o brasileiro a se endividar, o Consumidor Consciente buscou especialistas em comportamento, consumo e economia para auxiliar pessoas e empresas quando o assunto é dívida.
O entrevistado desta vez é Michel Alcoforado, antropólogo, sócio e fundador da Consumoteca, uma boutique de pesquisa e conhecimento. Confira abaixo a entrevista.
Consumidor Moderno Consciente – Por que devemos? Uma visão do que motiva e leva as pessoas a se endividarem.
Michel Alcoforado – Compramos mais do que temos condição de pagar, então a questão muda: “Por que precisamos comprar tanto?”.
Na sociedade contemporânea devotamos cada vez mais tempo e espaço para as atividades voltadas ao consumo. Ele não é só um estruturador de identidade, mas também de como mapeamos os outros e somos mapeados.
O consumo está ligado com a maneira como enxergamos o mundo e nos enxergamos. Devido a esse grande valor cada vez mais atribuído, a necessidade de comprar fica torna-se maior por envolver muita coisa. Então compramos além do que nossas finanças permitem e passamos a dever. A motivação é um verdadeiro jogo social.
CMC – Por que não existe o hábito de poupar e de ganhar primeiro para gastar depois?
Michel – A relação do brasileiro com o dinheiro foi construída ao longo da nossa história. Nesses quase 500 anos, desde a proclamação da Independência e República, vivemos grandes períodos de surtos inflacionários.
Uma das principais características desses momentos é que o dinheiro perde o seu valor e isso dificulta o planejamento das pessoas (o que comprar e quando comprar). Dificulta a percepção do valor que o dinheiro tem no momento em que não se gasta, dinheiro guardado não tem valor algum.
Com isso, as pessoas não tiveram tempo e nem condições de aprender a guardar dinheiro e ver valor nisso, o valor só está visível no momento em que se compra algo com ele. A dificuldade de poupar e se planejar está relacionada a esses períodos de alta inflacionária. Ao longo dos anos, aprendemos que dinheiro tem de gastado enquanto se tem valor.
CMC – Como as próprias empresas/varejo podem ajudar a mudar esse hábito? Isso seria possível?
Michel – Talvez possam criar alternativas que incentivem as pessoas a comprarem no momento em que elas de fato puderem. Mas, esse caminho ainda está muito longe da nossa realidade.
Todas as vezes em que o Brasil passa por um período de crise econômica, é comum ouvir reclamações das empresas/varejo por falta de créditos para investir e manter em movimento o negócio. E ter crédito é criar uma dívida e postergar.
Então, não vejo muitas possibilidades das empresas/varejo contribuírem para mudar esse hábito, principalmente em períodos de crise.
CMC – O Brasil é um país predestinado a ser endividado?
Michel – Se o Brasil está Predestinado a ser um país endividado, é difícil prever. Mas, é fácil afirmar que enquanto não tivermos uma relação direta com o valor que o dinheiro tem em si e enquanto essa for uma sociedade onde precisamos comprar coisas para mostrar quem nós somos e ter acesso a privilégios e serviços diferenciados pela qualidade do nosso relógio, corte do nosso terno, placa do carro ou região em que mora, certamente seremos um país endividado.
Em outras sociedades existem outras variantes para medir o valor das pessoas e do dinheiro. Aqui no Brasil, ainda temos um modelo de divisão social, de percepção e leitura social muito baseada naquilo que as pessoas têm e para ter algo é preciso comprar.
Mas, isso está mudando. Estamos saindo do consumo de produtos para o consumo de experiências,no qual não é necessário comprar e pagar, mas, sim, viver experiências. Mas, esse é um longo caminho.
Michel Alcoforado é antropólogo, sócio e fundador da Consumoteca, uma boutique de pesquisa e conhecimento e será palestra do Recover Money, evento que acontecerá no dia 11 de maio. Para mais informações, clique aqui.
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Serviço
O que: Recover Money
Quando: 11 de maio de 2016
Onde: FecomercioSP
Realização: revista Consumidor Moderno
Mais informações: www.recovermoney.com.br ou pelo telefone 55 11 3125-2215