Durante a crise, o brasileiro teve que recorrer (ainda mais) à criatividade para sobreviver às intempéries. A Banca Tatuí, por exemplo, enfrentou não só uma crise, mas duas: a macroeconômica e a do setor livreiro. Com criatividade e esforço de seus donos, ela vem ocupando seu espaço.
No ramo de alimentação, a Bubblekill ganhou destaque trazendo as tradicionais casas de chá repaginadas para uma versão moderna e descolada. No setor de vestuários, a Pantys redefiniu a ideia de calcinhas, com soluções inovadoras e confortáveis voltadas especificamente para a mulher brasileira.
Confira esses e outros empreendimentos de destaque no varejo em 2018:
1. Bubblekill
Ir a uma tea house pela primeira vez é uma descoberta. Mas a Bubblekill não é uma tea house tradicional. Durante o pedido, é necessário escolher o sabor da bubble – da bolha que compõe a bebida. Daí surge a curiosidade para os clientes de primeira viagem. Depois de selecionar os três sabores que compõem o mix, basta furar a tampa e beber. As bolinhas que estouram na boca são o charme, surpreendem e tornam a experiência na Bubblekill diferente. A marca iniciou a operação em março de 2017, mas já tem faturamento de gente grande.
O idealizador é Shuzi Gao, um chinês que sempre soube empreender. Aos 15 anos, ele saiu do país de origem e foi para a Áustria, onde trabalhou no mercado alimentício e hoteleiro. Abriu seu primeiro negócio, porém, em outro país da Europa – a Holanda. Em 2016, quando visitou Taiwan com cinco amigos (que hoje são seus sócios) veio a inspiração para trazer o conceito de bubble tea para o Brasil. A bebida surgiu na Ilha asiática, na década de 80.
O empresário Shuzi GaoAbrir uma empresa em outro país não seria novidade para o CEO da Bubblekill. A inauguração da primeira loja, no bairro da Liberdade, em São Paulo, aconteceu depois de seis meses de planejamento. Os resultados logo animaram os empreendedores, tanto que a expansão foi impressionante: em pouco mais de um ano de operação, a rede faturou R$ 15 milhões em 2017, e tem 47 lojas (cinco unidades próprias e 42 franquias), distribuídas por São Paulo, Rio de Janeiro, Santa Catarina, Maranhão e Mato Grosso do Sul.
2. Gift for Men
Depois de atuar por mais de 20 anos com audiovisual, o administrador Richard Saadia entendeu que deveria mudar. Sem saber exatamente o que fazer, ele procurou nichos inexplorados e encontrou um mercado que vem crescendo, o de presentes masculinos.
“Pesquisei pela internet em vários lugares do mundo e em vários idiomas. O que achei de mais próximo foi loja que vendia itens segmentados para gêneros diferentes. Mas uma loja exclusiva de presentes masculinos não achei”, afirma Saadia.
Richard Saadia, fundador da Gift for MenFoi assim que ele e um antigo sócio criaram, em 2013, o e-commerce Gift for Men. O site foi pensado para atrair principalmente as mulheres e dar a elas uma ajuda na difícil tarefa de encontrar presentes para homens que fossem mais do que as óbvias e batidas cuecas, meias e camisas. “Fizemos uma pesquisa com cerca de cem mulheres para identificarmos hábitos de compra, os tipos de presentes que elas gostariam de dar e quantas vezes por ano presenteiam”, diz o empresário.
Acessórios para bebidas e objetos de decoração são os itens favoritos dos clientes. Placas e réplicas de peças de motocicletas são alguns dos produtos mais populares. Miniaturas, quadros temáticos sobre aviação e imãs de geladeira com temas masculinos são outros itens que vendem bem.
3. Banca Tatuí
O mercado editorial vive uma profunda crise no Brasil. De 2015 para cá, o setor encolheu 21%, segundo a FIPE (Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas). Diante do cenário, as editoras são forçadas a diminuir o número de lançamentos, reedições e aquisições e renovações de contratos de direitos autorais.
O casal de jornalistas João Varella e Cecilia ArbolavePara os órgãos e as empresas do setor, culpar o leitor tem sido o caminho mais comum. Porém, a Lote 42, editora independente criada em 2012, prefere não pegar este atalho. Desde o início, a empresa vem operando no azul por entender que os leitores buscavam – e ainda buscam – qualidade. “A gente convive com muitas outras editoras que têm livros com formatos inusitados e também têm uma dificuldade de distribuição desses livros”, conta Cecilia Arbolave, que começou o negócio com o marido, João Varella. Batizado de Banca Tatuí, o espaço de 6 metros quadrados abriga publicações de aproximadamente 170 editoras.
O casal de jornalistas precisou tomar a decisão de deixar grandes redações para se dedicar aos projetos. A primeira a fazer o movimento foi Cecilia, que saiu de uma revista um ano após criar a Lote 42.
4. Pantys
Falar de menstruação pode ser desconfortável. O assunto não é muito discutido fora dos consultórios e das farmácias. Ir até uma loja para falar sobre o seu fluxo ou sobre o ciclo menstrual de outra pessoa pode parecer estranho, mas para quem conhece a Pantys isso fica cada vez mais longe de ser um tabu.
A marca aposta em um novo jeito de encarar esse período e vende calcinhas feitas para substituir os absorventes comuns. A ideia é que as clientes fiquem despreocupadas durante o ciclo menstrual e encarem os dias de fluxo como normais. À primeira visita, todos (homens também vão à loja) estranham e se perguntam como o produto funciona.
A engenheira química Emily EwelEmily Ewel fez um projeto de lingeries com um investidor americano. Enquanto desenvolvia as peças, ela percebeu a força das calcinhas absorventes no Estados Unidos. Emily viu uma oportunidade de trazer o conceito para o Brasil e conversou com a sua amiga e hoje sócia Maria Eduarda Camargo, que gostou da ideia.
5. Selvvva
Um grande painel verde estampando folhagens chama a atenção de quem passa pela Avenida Angélica, zona oeste da cidade de São Paulo, uma via ladeada por dois paredões contínuos de edificações, tendo como único respiro uma quadra ocupada pela Praça Buenos Aires. Mas o painel abriga outro respiro para os paulistanos. A loja Selvvva, criada pelas arquitetas Julia Rettmann e Denise Yui.
Julia Rettmann, à esquerda, e Denise Yui, à direitaAs arquitetas, que são amigas desde a faculdade, decidiram começar o negócio quando Julia ainda atuava exclusivamente com fotografia. Depois de fazer um trabalho na casa de uma paisagista, ela ligou para Denise com a ideia de incentivar a compra das plantas com acessórios que seriam desenhados por elas.
Quatro anos depois de fundada a loja, é possível ver florescer um empreendimento com um clima extremamente agradável, preparado para atender de jardineiros amadores a biólogos, comandado por duas mulheres apaixonadas pelo universo do verde, e que não mediram esforços para fazer o sonho virar realidade, de plantar a mesma paixão pelas folhas para todos que se aventuram a entrar na Selvvva.
6. Bombay
Na loja de especiarias criada por Nelo Linguanotto não é o tamanho nem a decoração o que mais chamam a atenção dos clientes. Na matriz da Bombay, o que mais encanta quem entra é a diversidade: são mais de 500 produtos.
A marca aproveitou o boom dos programas de culinária para atrair profissionais e amadores. O espaço foi pensado para que as pessoas interessadas em especiarias pudessem não apenas encontrar bons e variados produtos, mas também tirar dúvidas, receber dicas de receitas e conhecer novos temperos.
Nelo Linguanotto, engenheiro químico e amante de especiariasO investimento nos pontos físicos tem dado certo, com projeção de R$ 25 milhões de faturamento para este ano. O e-commerce representa menos de 10% desse total.
Uma das especiarias mais populares na Bombay são as pimentas. São 50 tipos, entre eles o mais ardido do mundo, segundo o Guinness World Records, batizado de Carolina Reaper. A marca oferece as pimentas de acordo com o nível de ardência, que varia de 1 a 44.
7. A Queijaria
Foram muitas viagens pelo interior de São Paulo e Minas Gerais na infância. Os queijos maturados de pequenos produtores nas cidadezinhas do interior dos dois Estados eram a paixão do então garoto Fernando de Oliveira. Desde o tradicional processo de tirar o leite das vacas à maturação, ele viveu a cultura do queijo como lazer e hobby. Tomado pelo saudosismo, após pouco mais de 20 anos da morte de seu avô, Oliveira resolveu voltar às origens e vendeu seu primeiro queijo em 2008 – negócio que originaria na loja A Queijaria.
Fernando Oliveira em sua loja na Vila MadalenaAtualmente, mais de 300 queijos diferentes passam pelo processo de maturação, feito em um sítio da família na cidade de Morungaba, no interior de São Paulo. De lá, boa parte dos produtos vai para a loja no bairro da Vila Madalena, na capital paulista.
Em uma casa charmosa de esquina, o ambiente respira fazenda. Os queijos – dispostos em diversas prateleiras de madeiras, cestas de palha e em um balcão para degustação – remontam a um cenário bucólico. Ao fundo da loja, encontra-se outra gama de produtos, complementares ao consumo do queijo, como vinhos, cachaças, pimentas, geleias e pães.
8. Madeirado
David Almeida da loja de móveis aconteceu em 2014, mesmo ano em que a loja física foi inaugurada. Quatro anos depois, a Madeirado abriu uma pop up store. A intenção é aproveitar o movimento da mostra de arquitetura CASACOR, que atrai milhares de pessoas à região do Jockey Club de São Paulo. A pop up deve fechar assim que a mostra terminar, em julho, mas a expansão não terminou. “Se tudo der certo, a ideia é abrir mais uma loja em São Paulo até o fim do ano e, se a coisa engrenar mesmo, mais uma no Rio de Janeiro”, explica Almeida.
David Almeida, fundador da Madeirado MóveisA Madeirado Móveis resgata árvores que seriam descartadas e usa a madeira para confeccionar peças de decoração. Os produtos vão de bancadas de R$ 990 a um banco de madeira maciça de R$ 39.000. Todo o processo de produção é flexível para atender às demandas dos clientes. Os consumidores entram em contato com a empresa via WhatsApp para aprovar as mudanças, que vão desde a medida dos móveis ao tipo de acabamento – este é um dos diferenciais da loja, segundo o seu fundador.
Para manter o processo o mais sustentável possível, a Madeirado Móveis precisava procurar fornecedores idôneos – serrarias que atuam nas áreas de manejo florestal e têm todas as documentações da madeira. Foi quando seu fundador pegou o carro, viajou até o Paraná e encontrou um fornecedor com quem trabalha até hoje. Ele também atua com uma serraria de Rondônia.
*Com textos de Leonardo Guimarães e Leonardo Pinto