“Você é consumista?”. Um dia me fizeram essa pergunta. Confesso que fiquei calada pensando, fiz um balanço da minha vida, consultei as pessoas mais próximas a mim e cheguei a uma conclusão: sim, eu sou consumista.
O tema é uma questão para a Antropologia do Consumo. Poucos estudam a fundo e partem para o debate sobre o que é de fato consumismo. Você pode me dizer que é exagero, comprar o que não é necessário, se endividar, comprar futilidades etc. Para nós, antropólogos, que procuramos relativizar e entender o contexto do outro, é dura tarefa de decidir o limiar entre quem é ou não consumista. É bater o martelo e passamos de antropólogos a juízes em dois segundos.
E aí vem a retórica: Quem na sociedade atual não é consumista?
Somos todos consumistas em maior ou menor grau. Com interesses, motivações e circunstâncias diferentes.
Para o senso comum, ser consumista é ceder aos impulsos de compra de coisas que não necessariamente precisamos. Tipo ter dez sandálias e dez calças jeans. É comprar muito além do necessário. Em alguns casos, levando a pessoa a se endividar além da conta. E divide, parcela, me empresta o seu nome?
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Na verdade, acho que existem vários tipo de consumistas. Existe o consumista da night, por exemplo, que ninguém leva em consideração, aquele que é capaz de estourar o cartão numa noitada ou várias – seja pra curtir com os amigos ou só pra impressionar. Tem o consumista de Uber ou táxi, aquele sujeito que não usa transporte público e vê o seu rico dinheirinho sair voando em serviços de transporte particular. E tem o consumista de coisas, o viciado mesmo em comprar, o que ele compra pouco importa, ele tá frenético por adquirir, sentir algo novo, uma emoção… Aí, sim, penso que pode se tornar um vício. E, assim como vício em álcool e drogas, o meio influencia muito.
O termo consumismo tem um conteúdo ideológico – até pelo sufixo “ismo”. Está relacionado a algo patológico. Além disso, a sociedade incorporou como algo pejorativo – algo que não pode ser medido, obviamente.
Para a Antropologia do Consumo, tratar desse tema é complexo porque é um tabu. Parece estabelecer juízo de valor, justamente porque lida com a ideia de limite, um limite aceitável – e todos desenvolvem justificativas para amenizar essa sensação. Estou certa?
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Ser consumista não tem a ver necessariamente com ser perdulário (esbanjador). Há consumistas que compram com equilíbrio e responsabilidade. Ser consumidor ou consumir é buscar em um enlace de retorno externo uma experiência que gera um equilíbrio interno. Não supre uma falta, cumpre uma função construtiva de si mesmo. Não é um vício, é um modo de pertencimento. Consumir é fazer parte. Só uma parcela pequena consome por compulsão, aí é levar em conta como cada indivíduo lida com as suas ações, se há culpa, se há arrependimento, se comprar é algo mais forte que ele etc…há tratamento.
Uma vez um amigo me disse que o uso pejorativo, em tom acusatório – “consumismo” – pode ser preconceito da geração anterior, que não tinha poder de escolha. Cá entre nós: o consumismo de certos itens, como roupas e livros, mantém a minha identidade atualizada. E diferente de muita gente, eu não tenho um armário lotado, eu tenho um acervo, assim como tenho uma biblioteca. São peças atemporais, de boa qualidade, duráveis.
Então, vamos lá, que sejamos consumistas mais responsáveis, com nossas escolhas, com o planeta, com menos culpa e muito mais consciência.
Faça as contas e aposte naquilo que você acredita.