Vivemos tempos de incerteza, em meio à uma pandemia e a diversas crises sobrepostas: de saúde pública, de confiança e também econômica. Onde buscar informações coerentes, que sejam de interesse público e que possam atender às expectativas de uma população fragilizada inclusive emocionalmente.
Ao lado das mídias tradicionais, as pessoas estão recorrendo às redes sociais em geral, incluindo o Twitter que vem assumindo um papel controverso na curadoria do conteúdo postado pelos membros. Quais os limites – se existem limites – para a liberdade e para a qualidade da conversação nos ambientes digitais? E de que forma o Twitter está se posicionando diante da polarização e da participação dos usuários para permitir a distribuição de informação útil, diálogos saudáveis e expressão legítima? Como definir estas particularidades de forma transparente?
No Collision from home, o CTO do Twitter, Parag Agrawal, discutiu com Nicholas Thompson, editor-chefe da Wired sobre como os princípios básicos do Twitter e o investimento em aprendizado de máquina permitem que a plataforma social permaneça focada em capacitar uma conversa pública saudável.
O universo digital sofre em demasia com as contas falsas, com robôs e com uma “infodemia” do que se chama de “fake news”. Ha também contas que parecem falsas, mas que na verdade são reais. Já usuários que optam por não ter uma foto em seu perfil e escolhem um determinado compromisso de privacidade, mas também é importante observar que os cenários mais perigosos, na verdade, não parecem falsos na superfície.
O risco dos perfis que parecem reais
Esse contexto direciona o trabalho do Twitter. Parag Agrawal afirma que se todo mundo pensa que um perfil é real, é isso que qualquer usuário precisa realmente encontrar. Perfis que emulam pessoas reais são as que causam mais danos. A consequência interessante desse contexto é uma espécie de tentativas de manipulação da informação.
Segundo o CTO do Twitter, é correto afirmar que há um padrão perceptível ao longo do tempo. “Essas campanhas de desinformação são bastante sofisticadas para manipular a conversa e são capazes de atribuí-las a algum estado ou personalidade como sendo o tipo de força principal por trás delas. Quando os identificamos, fazemos uma divulgação pública”. Agrawal na verdade, considera que liberar todo o conjunto de dados com frequência de muitos terabytes permite que muitos pesquisadores externos possam investigar essas informações e aprender mais sobre padrões que talvez nem seja visíveis e tragam maior inteligência para o futuro.
Thompson pensa que esse trabalho precisa ser aprimorado, principalmente para evitar as consequências durante processos eleitorais. “Este ano, temos eleições em novembro, e eu sei que plataformas como o Twitter estão inseridas nas conversas sobre as eleições em todo o mundo, mas ela será particularmente disputada nos Estados Unidos. O Twitter implementou várias alterações na checagem dos posts para destacar as mídias manipuladas”.
O Twitter agora rotula informações falsas sobre, por exemplo, coronavírus ou outros tópicos importantes como as eleições. Mas é possível considerar que essa “rotulagem”, essa classificação de alertas realmente colabora com a abordagem de problemas espinhosos que envolvem a liberdade de expressão e a privacidade individual? Esse procedimento da rede social ainda não explicou de modo conveniente a viabilidade da estratégia de alertas para identificar e combater material sensível, que espalha desinformação e reforça discursos de ódio, por exemplo.
Quando o conteúdo está a serviço de um efeito predefinido
Parag considera que esse debate é muito apropriado. Isso porque a plataforma entende que a divulgação de informações enganosas deve levar em conta como mitigar os possíveis danos. Segundo o executivo, “somos propensos a desinformação e por isso, o Twitter se guia por alguns princípios, que procuram evitar e mitigar danos”. Como resultado disso, o enfoque da rede social não é buscar todas as informações erradas ou abordar todas essas informações publicadas. Em vez disso, o Twitter priorize e concentra o esforço onde houver a maior probabilidade de dano, mostrar diversas perspectivas e evitar a exibição de conteúdo como um conceito predefinido.
Foi isso, disse Parag, que levou a rede social a desenhar a estratégia de rotular o conteúdo, para que as pessoas possam encontrar um contexto adicional em torno de parte do conteúdo, além de conversas adicionais e alcançar suas próprias conclusões. Portanto, o Twitter não pretende determinar a probabilidade de algo ser verdadeiro ou falso. Em vez disso, ele tenta permitir que as pessoas vejam a conversa mais facilmente em torno do conteúdo, para que possam fazer suas reflexões.
A rede social procura fazer esse trabalho em escala global, nos diversos idiomas, em assuntos políticos, nos temas associados à COVID-19, principalmente na interpretação algorítmica ou na implementação nos processos de manipulação da mídia e da conversa. Há máquinas que amplificam a capacidade dos seres humanos, permitindo um julgamento humano levar à rotulagem de um grande número de tweets, todos aqueles que foram manipulados da mesma maneira para criar um efeito determinado.
Informação também tem seus falsos positivos
Na opinião do editor-chefe da Wired, o Twitter coleta sinais, sugerindo que há um problema em potencial com uma grande quantidade de tweets avaliados por humanos, incluindo os que são problemáticos. “Separar e identificar quais são as partes constituintes ou onde os mesmos tweets e informações erradas podem existir no restante da plataforma e, em seguida, usar computadores para eliminá-los ou adicionar rótulos a eles pode criar vieses?”, questiona.
O trabalho de verificação do Twitter depende desses passos para diferenciar o conteúdo sensível destinado a manipulação da rede social . É necessário verificar com exatidão quando a informação tem origem em uma mídia real, jornalística ou estabelecida, real. Parag afirma que conteúdos falsos usam o texto, por isso, mais embasados, compartilhando palavras ou padrões na linguagem.
“Nossos esforços são primitivos e fracos. Então, é provável que você veja conteúdos que deveríamos rotular e também verá alguns conteúdos falsos positivos sobre as quais as pessoas falam muito, principalmente quando a temporada política fica mais quente como agora nos Estados Unidos”, afirma Parag. Ele ressalta que uma plataforma tão importante quanto o Twitter pode garantir que está constantemente mostrando às pessoas novas informações de novas pessoas e não apenas fazendo com que elas naveguem sempre dentro dos mesmos espaços de conversa.
Esse é um trabalho delicado e que traz valor para a sociedade e para conversas públicas, que é a missão da plataforma. Também há valor para as pessoas, para que estejam informadas sobre diversas perspectivas, como explorar a conversa que permite criar a motivação para nos mover na direção de seguir os tópicos ao invés de seguir apenas as pessoas. Ao seguir os tópicos, um usuário está escolhendo obter um conjunto diversificado de perspectivas, relacionado a esse tópico, em vez de apenas ouvir o conjunto de vozes que se escolheu ouvir. “Sim, acreditamos que a maneira mais apropriada de usar o Twitter provavelmente exporá as pessoas a perspectivas mais amplas de interesse em um conjunto mais amplo de pontos de vista e ajudará as pessoas a não serem inferiores”, observa o CTO.
Diálogos saudáveis no Twitter
Quando pensamos em uma conversa saudável, ela deve envolver pessoas com diferentes bases de seguidores e pontos de vista diferentes, seja sobre política ou sobre K-pop, Carnaval, pandemia, moda ou futebol. Toda vez que se mantém e se atinge um público diversificado, a conversa fica mais saudável. É preciso ter coragem para sair dos casulos representados pelo viés de confirmação e seguir pessoas diferentes ao invés de seguir sempre a mesma pessoa. “São essas múltiplas vozes que provavelmente trarão um conjunto diversificado de pontos de vista e permitirão explorar vários lados do tópico da conversa.”, conclui Parag Agrawal.
Até que ponto é possível realmente fazer as pessoas enfrentarem o conforto representado pela acomodação ao algoritmo é a pergunta que não quer calar. Infelizmente, a maior parte dos usuários das redes sociais procura seguir todos aqueles que reforçam seus próprios pontos de vista e preconceitos e aceitam passivamente a manipulação de conteúdos e informações por meio de perfis criados com o propósito de ganhar e fomentar seguidores e conversas com objetivos predeterminados.
Ainda que o Twitter esteja empenhado em combater a desinformação e os discursos subterrâneos que estimulam comportamentos agressivos e polarizados, não existe uma fórmula capaz de melhorar o nível geral da conversa pública.