O SXSW 2025 foi palco de uma edição especial ao vivo do podcast The Unusual Suspects, da Audible. Os criadores Kenya Barris, roteirista e produtor premiado, e Malcolm Gladwell, autor best-seller e um dos mais influentes pensadores contemporâneos, receberam a famosa pesquisadora e escritora Brené Brown para uma conversa sobre os caminhos inesperados que moldaram sua trajetória profissional. Com seu estilo provocador e direto, Barris e Gladwell mergulharam na história de Brown, explorando as reviravoltas que a levaram a se tornar uma referência global nos estudos sobre vulnerabilidade, coragem e liderança.
Criador de Black-ish e de diversos sucessos para cinema e TV, Kenya Barris se consolidou como um dos roteiristas mais relevantes da atualidade, trazendo narrativas que desafiam paradigmas culturais. Malcolm Gladwell, autor de livros como Outliers e Blink, é conhecido por traduzir conceitos complexos da psicologia e sociologia em histórias cativantes e provocativas. Brené Brown, por sua vez, revolucionou a forma como encaramos emoções humanas com seus estudos sobre empatia e autenticidade, popularizados por seu TED Talk viral e seus livros best-sellers.
Lançado pela Audible em janeiro de 2025, The Unusual Suspects aposta em conversas diretas e espontâneas com figuras que desafiam convenções. A série já recebeu nomes como Ava DuVernay, Sue Bird, Dr. Dre e Jimmy Kimmel, tendo como característica a espontaneidade que se sobressai das narrativas convencionais. Durante o painel, pudemos sentir um gostinho dos bastidores da produção, revelando como a Audible e a produtora Khalabo Ink Society transformam essas histórias em experiências imersivas. A gravação ao vivo foi um dos momentos mais memoráveis do SXSW 2025. E Consumidor Moderno ainda teve o privilégio de acompanhar um Happy Hour exclusivo com Gladwell e Barris (vale conferir nas nossas redes sociais).
“Uma das coisas mais legais do mundo é a curiosidade, e a vontade de enxergar o que está por trás do que está escondido”, afirma Kenya. O roteirista é bastante informal, acessível e muito rápido nas tiradas e comentários. Gladwell é mais sarcástico e sempre tempera seus comentários com ironia. Foi nesse jogo de humores que ambos introduziram Brené Brown ao palco.
“Eu não me sinto envergonhado, de jeito nenhum”, afirma Gladwell, no que Brown complementa: “a vergonha é o sentimento mestre, segundo muitos psicólogos e estudiosos do comportamento”. Ela quis levar a conversa para o campo da seriedade, da empatia. Mas isso é muito complexo. Simplesmente, a conversa rapidamente entrou no campo das ironias e do humor rasgado. É interessante ver a dinâmica do podcast, a forma com que as conversas ganham rumos imprevistos e avançam para campos inesperados. O jogo dos egos é das mentes talentosas de Kenya, Malcolm e Brené, e a forma como se adaptam uns aos outros para falar sobre o fiapo inicial – a dinâmica da conversa – lembra demais a série Seinfeld. Muito sobre o “nada”, sobre curiosidade, causos da vida, experiências e vivências e o calor do público (com as risadas reais e não como claque).
“Os suspeitos incomuns” exploraram a nossa propensão à curiosidade, e o quanto ela pode nos ajudar a superar e enfrentar a incerteza e nossos medos. “A vergonha é focada no eu e a culpa é focada no comportamento”, comenta Brené, no que recebe uma réplica de Malcolm, afirmando que seu parceiro de podcast, Kenya Barris “não enxerga o mundo como nós, ele vê tudo sob a lente do humor”. É sempre um recurso maravilhoso, usar a forma como nós enxergamos e como percebemos as pessoas próximas para criar conexão e cumplicidade com a audiência.
E por que não temos vergonha de envergonhar os outros? Quais inseguranças nos motivam a colocar outras pessoas em situações embaraçosas? Quando isso é involuntário e quando é calculado? Em um mundo baseado na vergonha, onde essa sensação parece crescer e assumir um papel relevante, que superpoder podemos desenvolver para lidar com nossas insegurança e nossa falta de habilidade em lidar com os outros? Para as crianças, a vergonha é uma armadilha que pode inibir seu desenvolvimento e a forma com que percebem o mundo.
“Eu não sei se vivemos uma cultura da vergonha”, diz Brené, no que é imediatamente rebatida por Kenya: “Absolutamente vivemos… E você tem consciência do impacto que você tem em milhões de pessoas com seu trabalho?”. Kenya diz que gosta de contar histórias e dessa forma atingir pessoas e fez disso sua forma de ganhar dinheiro. Para um e outro, descobrir o que fazem bem foi um caminho para se sentirem bem consigo mesmos. E dessa forma, quando conseguimos descobrir o que fazemos bem e não nos entregarmos cegamente às paixões que temos por atividades diversas, pode nos manter “puros” com nossos valores.
E assim o podcast foi ganhando contornos cada vez mais diversificados, de Vila Sésamo a ideias sofisticadas, das inspirações para livros até temas de pesquisas, das relações com familiares até a maternidade. E claro, os momentos necessários de solidão, em que é possível se debruçar sobre o próprio trabalho e ter noção do próprio espaço e encontrar novas inspirações. Por exemplo, “Soberania cognitiva” é o tópico que Brené Brown estuda no momento, e tem relação com o fato de que perdemos nossa capacidade de nos sentirmos soberanos sobre o que pensamos, porque ficamos reféns de vieses e pressupostos.
Essa é a beleza da conversa. Por mais que as “IAs emocionais” ganhem espaço e desenvolvam carisma, a nossa forma de bater papo é trazer assuntos aleatoriamente é absolutamente incomparável. É o que mantém vivos os talk shows e o que motiva a criação de programas brilhantes como “Unusual Suspects”. O nosso superpoder, o que nos traz esperança e estimula nossa mente a evoluir, é a nossa curiosidade e como a demonstramos no hábito de conversar e contar histórias.
Se o contexto do mundo mudou radicalmente, se os conceitos de liderança que o mundo consagrou ao longo do século XX já não fazem sentido nos dias de hoje, o nosso interesse por histórias e pelas lições que tiramos delas ainda se mantém como instrumentos poderosos para dar sentido ao que somos, como vivemos, amamos, produzimos e estabelecemos legado. E sim, nossas emoções e fraquezas, vulnerabilidades e curiosidades valem para a vida e são bem-vindas no que fazemos, produzimos e criamos.
Temos os suspeitos e os inocentes, os culpados e os artistas. O mundo vai além dos horizontes que estabelecemos e enxergamos. O que a conversa entre 3 mentes talentosas mostrou foi que a experiência humana, queiram ou não, com suas contradições, emoções, violências e descobertas, permanece inesgotável.