O universo de coleta, uso e análise de dados está se tornando uma rotina dentro de muitas empresas. Mas, naturalmente, existem ainda muitas dúvidas sobre curar e, acima de tudo, cuidar dessas informações – ainda mais se o dono do dado for justamente o consumidor. Essa preocupação foi um dos assuntos do painel Big Data, Analytics, BI, Data Lake. A pergunta é: você está fazendo isso direito?
A conversa no palco foi conduzida por Ricardo Santana, líder em data e analytic e membro do comitê de inovação da KPMG. Ele fez uma série de reflexões e comentários sobre o momento dos dados digitais. “O que fazemos com esses dados? Por que o uso de smart analytics é tão essencial? Quem está coletando esses dados? Quem verifica a qualidade dessas informações? As empresas estão adotando estratégias de longo prazo dentro do mundo digital? Mais: a empresa possui uma política de privacidade de dados?”, questionou Ricardo para o público e os convidados.
André Gentili, diretor de tecnologia da Flex Relacionamentos Inteligentes, explicou que o relacionamento com o cliente hoje passa por um grande desafio. Segundo ele, é preciso manter o contato constante com o cliente, evitando assim desgaste com o cliente por meio de perguntas repetitivas e, claro, oferecendo um produto ou serviço muitas vezes sem que o cliente faça o seu pedido.
“É fácil para o dono da padaria. O cliente entra na loja e logo pede: ‘me dá o pãozinho de sempre’. O cara da padaria entende o pedido e entrega aquilo que o consumidor não disse. As novas tecnologias tornaram esse tipo de relacionamento mais fácil para empresas com uma grande quantidade de cliente. O big data permite armazenar contexto, o perfil, entre outras informações”, disse.
Em meio a esse turbilhão de informações digitais, Gentili afirma que as recentes premissas sobre o consumidor em tempo digital também passam por uma revisão de comportamento. Diziam, por exemplo, que o jovem preferia o autosserviço. Por outro lado, o mais velho prefere o atendimento humanizado. Hoje, no entanto, esses cenários não são considerados tão verdadeiros assim . Na verdade, os consumidores de diferente adotaram um comportamento muito parecido, inclusive os mais jovens e os mais velhos. “Lembro de um comercial de um banco que exibiu senhoras usando o smartphone. Isso está ocorrendo com todo mundo”, disse Gentili.
Linguagem natural
Rodrigo Helcer, fundador e CEO da Stilingue, afirma que essas diferentes pessoas criaram um desafio para as grandes empresas. Afinal, o comportamento digital pode até ser mais ou menos parecido, mas isso não significa que as pessoas utilizam a mesma linguagem e os mesmos códigos – e sem esquecer dos emojis.
“O grande desafio é entender e manter o contexto de uma troca de informações com o cliente feito por robôs no nosso idioma. Hoje, nem todo o atendimento possui o que chamamos de processo dentro de uma linguagem natural, algo importante para uma comunicação feita em chats com robôs. A Stilingue investe em uma linguagem informal dentro do modelo SQN, o famoso ‘Só que Não’”, brincou Helcer.
Comunidades
Outra informação coletada a partir do cruzamento de informações e comentada por Helcer diz respeito ao influenciadores, blogueiros ou Youtubers. Segundo ele, essas pessoas são importantes, mas eles não existiriam sem algo ainda mais poderoso: a comunidade. “Tem um tema muito interessante que é a comunidade e que ninguém fala. Essa, por exemplo, é a missão do Facebook. Não existe influenciador sem comunidade. Não existe cantor de banheiro sem uma comunidade”, disse.
Quem está construindo uma comunidade realmente relevante na internet (e com valor) é o Portal Minha Vida. A editora do portal Carolina Serpejante falou das iniciativas da empresa, o que inclui até mesmo análise de dados de navegação para verificar, entre outras coisas, qual o dia em que o consumidor está mais ansioso. “Os dados nos permitiram conhecer o nosso público e como eles acessam o nosso site. Para os usuários cadastrados, eu procuro fragmentos de navegação que me indicam o que a pessoa procurou no site. Dessa forma, eu ofereço notícias que naturalmente irá me dizer se uma pessoa é diabética, por exemplo”, disse.
Lei de proteção de dados
Outro assunto comentado no painel foi o impacto da lei de proteção de dados da Europa e a legislação aprovada no Brasil e que ainda depende de sanção do presidente, Michel Temer.
Na avaliação de Gentili, da Flex, a nova lei vai mudar a forma de trabalhar, mas, ao menos por enquanto, nenhuma empresa realmente preocupada com isso. “A nova lei de proteção de dados defende a ideia de que você é você mesmo. No caso da norma brasileira, ela é mais focada para os negócios, ou seja, basicamente ela indica que uma empresa depende do “aceite” para usar as informações de uma pessoa. Se estou no banco e eu forneço os meus dados, a empresa deve dizer o que ela irá fazer com essas informações. Basicamente, a nossa lei é de opção.
Helcer tem uma visão interessante sobre o possível impacto da legislação tanto europeia quanto a brasileira na vida do consumidor. Um exemplo de transformação a partir da nova seria a relação das pessoas com o streaming de música Spotify. Segundo ele, a experiência de ouvir música seria totalmente diferente do modelo atual e, em tese, teria alguma semelhança com os primórdios da plataforma de música. Isso ocorreria pela impossibilidade de analisar os dados de uma pessoa na plataforma, o que impediria a tecnologia de customizar o Spotify a partir dos seus gostos”, disse.
“Se você dizer ‘não’ para o uso de dados, o streaming vai voltar para a experiência de ouvir música dos anos 1990. Particularmente, eu não acredito que vamos nos adaptar, mas essa é uma visão de momento. Penso que isso terá um efeito contrário, pois isso vai resultar em uma perda de qualidade, vai ficar chato e não valerá os 9 dólares”, disse.