“A Estônia é uma grande história de sucesso entre as nações que tiveram independência depois da Guerra Fria”, disse, certa vez, o ex-presidente norte-americano Barack Obama. O pequenino país geograficamente localizado diante do Mar Báltico, é considerado o mais digital do mundo e tem seu aparato estatal todo digitalizado. Os estonianos podem usar seus smartphones para fazer qualquer coisa online – desde checar as notas das escolas das crianças até acompanhar os registros de saúde. “Eu deveria tê-los chamado quando estávamos colocando no ar o nosso site de sistema de saúde”, já declarou Obama.
A cada ano que passa, essa nação tem atraído mais interessados em seu ecossistema de inovação e, atualmente, se tornou o terceiro país com maior número de startups per capita. Para se ter uma dimensão do sucesso, as marcas Skype (de comunicação), Transferwise (financeira) e Bolt (de locomoção) foram criadas lá. Com apenas 1,3 milhão de habitantes em uma área que representa metade do estado de Santa Catarina, a Estônia adotou a democracia parlamentar e integra a União Europeia desde 2004. Entender o ecossistema que possibilitou a implementação de tantas tecnologias, passa por ter uma perspectiva da história e analisar seu modelo de desenvolvimento econômico. Como sempre, o passado marca a estrada do futuro. Acompanhe o raio-X para entender como a Estônia virou polo de atração para startups e empreendedores.
Antes e depois
A Estônia sofreu ocupações o ano de 1200. Ela integrou, no século 20, a União Soviética. Após 50 anos sob o governo soviético, conseguiu sua independência em 1991. Nessa época, sua situação era paradoxal: o país estava livre outra vez, mas esfacelado, sem recursos e hiperburocratizado.
Um dos fatores mais importantes, dentro do planejamento de reestruturação do país, a médio prazo, foram as definições de políticas públicas que, independentemente do partido político governante, mantinham a continuidade das reformas para acelerar seu desenvolvimento. Uma das grandes chaves para isso é o país funcionar em um sistema legislativo criado na década de 90, em uma combinação de competência, sorte e falta de opção. Com pouco dinheiro para se reconstruir após a independência da União Soviética, os estonianos investiram em ciência e tecnologia, e tiveram visão estratégica do potencial da internet. Tiveram “sorte” ao definir uma constituição e um aparato público que acompanhasse o nascimento dessa revolução tecnológica, ao mesmo tempo em que não tiveram outra opção. A escassez de recursos financeiros não permitia uma burocrática tradicional. A Estônia renasceu, então, digital e enxuta.
Investimentos e empreendedorismo
A estratégia de desenvolvimento se deu com parcerias público-privadas, privatizações e atrativos para o investimento estrangeiro. Criou-se um ecossistema favorável para empreender, com tecnologia de informação e comunicação disponíveis. Quer um exemplo? A abertura de uma empresa demora apenas três horas e há incentivos fiscais e de exportação para o crescimento. Já no Brasil, abrir uma empresa pode demorar, em média 80 dias, até se estar com todos os seus documentos regularizados. Esse prazo pode passar, facilmente, dos 100 dias.
A intenção de se firmar no posto de país mais propício para as startups é um propósito tão forte que é possível abrir uma empresa por lá sem nem mesmo pisar na Estônia. É tudo feito digitalmente, inclusive a coleta de assinaturas. Dessa forma, o empreendedor consegue o chamado E-Residency, que é o documento de residência eletrônica com o qual é possível ter conta bancária local e registrar a empresas. Os dados são todos protegidos por blockchain.
Tecnologia para todos
A facilidade para atuar dentro do país se junta com uma opção de profissionais disponíveis bastante qualificada. Educação de qualidade também não é um problema na Estônia. Apesar das constantes dominações por países vizinhos, sempre houve a preocupação com investimentos educacionais. A Universidade Tartu, por exemplo, localizada na cidade de mesmo nome e que fica a cerca de 140 km da capital, Tallinn, foi criada em 1632, durante a ocupação sueca. É considerada uma das mais importantes do país. O modelo de educação estoniano baseia-se no ensino público gratuito, do básico ao superior, que também deve ser igualitário e de excelência. Isso faz o país figurar em quarto lugar no ranking da PISA – Programa Internacional de Avaliação de Estudantes -, em ciência, leitura e matemática.
Diante de todas essas informações, não admira saber que a gestão governamental por lá também é toda eletrônica. O modelo de governo tem duas soluções fundamentais: o ID Card, obrigatório por lei, usado para acesso a todos os serviços públicos e com assinatura digital validada juridicamente. E o X-Road, software de código aberto, que troca informações entre bancos de dados, principalmente entre setores e repartições públicos. Combinados, são responsáveis em disponibilizar 99% dos serviços governamentais em uma plataforma digital.
Vale ainda ressaltar outras informações sobre o país que influenciam em seu poder de empreendimento. Transporte público gratuito para todos os residentes registrados é um deles – em termos de custo, imagine o quanto isso é econômico para alguém que acabou de abrir uma empresa? Internet e Wifi são disponibilizados em todos os lugares, até no canto mais remoto. A Estônia foi o primeiro país a usar a internet para votação política.
Se você viajar até a capital Tallin – logo ficará sabendo que ela é foi eleita como a cidade medieval mais intacta e protegida da Europa. Em todo território, apenas três cidades têm população superior a 50 mil habitantes, o que, convenhamos, ajuda muito na gestão pública. É um dos países menos religiosos do mundo, com apenas 16% da população afirmando a importância da religião na vida. E por último, como curiosidade mesmo, a Estônia tem hoje questões diplomáticas muito menos complexas do que na era soviética. Corre lá uma rixa com a Letônia sobre onde teria sido decorada a primeira árvore de Natal. Se nessa questão o primeiro lugar não lhe couber, a Estônia repousa num posto bem mais relevante: é o mais próximo que chegamos de um paraíso digital.
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