Nos últimos meses, todos os modelos de negócios foram acelerados de alguma maneira. Na educação, não foi diferente. O Ensino à Distância (EAD) virou protagonista e muitas pessoas precisaram se adaptar as aulas diretamente de suas casas. No Brasil, segundo um estudo realizado pela Associação Brasileira de Educação a Distância (ABED), 76,3% dos adultos entre 26 e 40 anos, já preferiam cursos à distância em 2019, somando cerca de 9 milhões de alunos na modalidade digital.
Com a pandemia, mais de 1 bilhão e 600 milhões de estudantes e professores em todo o mundo, ficaram sem a possibilidade de frequentar os espaços físicos de instituições e migraram para opções EAD. Como recentemente o Ministério da Educação (MEC), estendeu a autorização de aulas à distância em universidades federais até 31 de dezembro de 2020, mais pessoas estarão imersas no ambiente digital no segundo semestre deste ano.
Reflexo no setor
Parte dos desafios e adaptações estão acontecendo desde que a migração emergencial foi aplicada na maioria das universidades, agora, é fundamental pensar no pós-pandemia e em como essa situação vai refletir o futuro das instituições, tanto presenciais como à distância.
Luciano Sathler, membro do Comitê de Qualidade da ABED e Reitor do Centro Universitário Metodista Izabela Hendrix, afirma que os sistemas educacionais permanecerão expostos e vulneráveis se pensarem em simplesmente reverter as atividades ao que era feito antes do coronavírus.
“Muitas das práticas tradicionais em salas de aula, ora aplicadas no campo digital, baseiam-se em metodologias behavioristas de ensino, desenvolvidas antes de existir uma Internet. Não incorporam a experiência de aprendizagem cooperativa, quando estudantes são convidados a usarem as redes digitais para criarem seu próprio conteúdo, colaborarem entre si e participarem de comunidades virtuais de aprendizagem, no que se torna uma poderosa ferramenta de engajamento e auto-organização”, diz ele.
Segundo Sathler, o ensino à distancia não deve tentar replicar o modelo presencial, mas buscar formas de agregar uma nova estrutura benéfica para os alunos. Para ele, a boa qualidade exige a capacitação prévia do corpo docente – fundamental para atuar competentemente nesse novo mundo.
Além disso, um trabalho de equipe com reestruturação de planejamento das atividades, concepção de novas formas de avaliação e disponibilização organizada de objetos de aprendizagem, são importantes para chegar em um formato que privilegie a participação mais colaborativa dos envolvidos.
“Não há melhor momento de mudar isso do que na resposta ainda emergente à pandemia atual. A mudança de larga escala nas instituições e sistemas educacionais pede a adoção da inovação aberta. É preciso incluir famílias, empresas, organizações sem fins lucrativos e governos na construção de uma nova concepção, como já preconizada pelo Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova, de 1932, que assusta por sua atualidade”, destaca.
Movimento forte
O crescimento que o ensino à distância vem alcançando nos últimos anos, e não somente no período de confinamento, representa um movimento forte no mercado educacional, uma vez que, é a modalidade é mais acessível, em termos financeiros, para os alunos.
Márcio Rosales, Coordenador Master in Business Innovation da Universidade de São Carlos, analisa a eficácia da utilização do modelo educacional.
“Podemos tomar como referência duas dimensões: o tempo e a qualidade. No sistema educacional tradicional, o tempo é rígido, enquanto a qualidade é, flexível. Sabemos que cada aluno tem o seu próprio tempo de aprendizagem. Por isso, defendemos exatamente o oposto: tempo flexível e qualidade rígida. Nesse contexto, a Covid-19 acelerou esse processo, de forma que hoje no aprendizado remoto, os estudantes podem, ao seu próprio ritmo, avançar sobre as disciplinas e ir formando sua própria jornada de aprendizado”, diz o professor.
O que esperar para o futuro da educação?
Uma das dúvidas mais frequente é se a alta demanda pelos cursos online, continuará forte mesmo quando a pandemia acabar. Para Rosales, apesar da vontade em frequentar aulas presenciais, a tendência de Lifelong Learning – que já era percebida antes da Covid-19 – deve se intensificar em uma mistura dos formatos de ensino.
“Isso porque cada vez mais temos a possibilidade de criar mais de uma carreira para nossas vidas. Vivemos o exato momento em que a customização do ensino pode criar jornadas de aprendizagem remotas específicas para cada estudante, mas com a vantagem de ser exponencialmente escalável. Isso significa que não precisamos nos prender a uma única sala ou turma. Os conteúdos e assuntos são construídos a partir da interação entre aluno e professor, agora também chamado de tutor. Acreditamos que o modelo de aprendizagem remota vai potencializar a Educação 4.0, e não acabar com os encontros presenciais, mas torná-los mais ricos”, ressalta o professor.
Teremos a tendência de “figital” na Educação?
Rosales ainda afirma que as universidades estão aproveitando esse momento para evoluir e entregar o melhor conteúdo em formato digital, mas sem perder a identidade. “Essa transição, pode levar a um novo modelo, que está em fase de construção, no qual poderíamos, inclusive, questionar a frequência dos encontros presenciais. Ou seja, mesmo com o retorno, não descartamos a possibilidade de seguir com as turmas no modelo híbrido que mescla o melhor dos dois mundos, físico e digital”, diz ele.
Para Peter Kronstrom, Head do Copenhagen Institute For Future Studies (CIFS) da América Latina, e professor do Curso de MBI da UFSCar, as “megatendências” previstas antes da pandemia não mudaram: “o que muda é a velocidade de transformação do cenário. O ensino à distância está sendo acelerado por conta do aumento da demanda que o isolamento provoca. Tudo indica que o modelo híbrido de ensino à distância com atividades presenciais será o que funcionará de agora em diante”, pontua ele.
Por isso, a modalidade pode passar por uma inovação global mais forte do que nunca. “Com certeza vai impulsionar as plataformas e os projetos existentes. Os movimentos que iriam demorar de 5 a 10 anos, agora devem acontecer nos próximos 12 meses. Isso indica uma aceleração absurda desse formato”, conclui.
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