Carro na garagem, casa própria, plano de saúde. Esses são os desejos de uma geração nascida na década de 60 e que, portanto, preza a segurança e a posse de bens, certo? Errado. Estamos falando, aqui, de jovens brasileiros que, ao mesmo tempo que adotam novos hábitos de consumo e usam o celular todos os dias, para quase tudo, ainda preservam características de gerações anteriores às dele. A constatação dessa ambivalência é mostrada em um estudo exclusivo da empresa de soluções digitais de pesquisa MindMiners. Feito com 1.200 pessoas de até 32 anos, o estudo “Jovens Transformadores” aponta, por exemplo, que 74% dos entrevistados consideram importante ter automóvel. É o caso de Rafael Gibeli que, aos 18 anos, ganhou um carro do pai para poder frequentar a faculdade de Relações Internacionais, na PUC-SP, que ficava a mais de dez quilômetros de sua casa. “O transporte público é precário em Alphaville e eu precisaria pegar três ônibus para chegar à casa dos meus amigos em São Paulo. Por isso, não troco a facilidade de ter um carro, apesar dos gastos para mantê-lo”, diz Gibeli, hoje aos 24 anos.
Rafael Gibeli que, aos 18 anos, ganhou um carro do pai para poder frequentar a faculdade e, em 2016, comprou um veículo com seu próprio dinheiro
Pode parecer um contrassenso: o mesmo consumidor que se preocupa tanto com o meio ambiente e está mais interessado em ter boas experiências do que em possuir bens se importa em ter um veículo estacionado na garagem. “A explicação é simples: as condições precárias de infraestrutura e de transporte público do Brasil”, explica Danielle Almeida, diretora de marketing da MindMiners. É claro que, se houvesse a possibilidade de percorrer os trajetos com meios de transportes alternativos, os brasileiros escolheriam essa opção. Mas hoje ainda há bairros (e até cidades) onde a mobilidade não está entre as prioridades das políticas públicas. “Sem falar que ter um carro ainda significa ter status na nossa sociedade”, completa.
Carros conectados
Mas não é um carro qualquer que é almejado: o veículo precisa estar conectado. Essa conectividade depende do celular, certo? Para a Fiat, não. A montadora italiana vem desenvolvendo uma plataforma de serviços conectados que não usam o smartphone. A ideia é que o automóvel esteja diretamente conectado à nuvem. “O carro vai se comunicar com o consumidor, informando sobre as manutenções ou alertando o motorista se ele estiver dirigindo de forma agressiva. Haverá integração do carro com a casa e o escritório, proporcionando uma experiência mais fluida”, promete Breno Kamei, diretor de portfólio, pesquisa e inteligência competitiva da Fiat Chrysler Automóveis (FCA) para a América Latina.
Já a Mercedes pretende transformar seus veículos em celulares com rodas. O MBUX (Mercedes-Benz User Experience) é um sistema multimídia inteligente controlado por inteligência artificial que permite que a ferramenta desenvolva a habilidade de aprender com o dono. A novidade será implantada na nova geração de automóveis da marca.
MBUX (Mercedes-Benz User Experience) é um sistema multimídia inteligente controlado por inteligência artificial
Por sua vez, o Grupo PSA, que detém as marcas Pegeout e Citroën, tem investido no espelhamento da tela do celular. “A conectividade está tão acelerada que não faz sentido tentarmos desenvolver tecnologias próprias”, afirma Antoine Gaston-Breton, diretor de marketing da Peugeot-Citroën-DS no Brasil. Inclusive, espelhamento de tela é assunto que a GM domina. A tecnologia MyLink ficou conhecida por permitir que os motoristas tenham acesso rápido a GPS, áudio, telefone e mensagens de texto através de uma tela touchscreen nos painéis dos carros Chevrolet. Ou seja, as montadoras estão cada vez mais se parecendo com empresas de tecnologia, a fim de atender às novas expectativas do consumidor: afinal, ele quer que as fabricantes ofereçam conforto e conectividade, mas sem deixar de desenvolver uma solução para reduzir a emissão de gases poluentes.
Contrassenso
Pesquisa da MindMiners mostra que os jovens ainda acham importante ter um carro na garagem