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O fim do Perse é inconstitucional?

O fim do Perse é inconstitucional?

A recente decisão de extinguir o Perse tem gerado intensos debates por ser inconstitucional e prejudicar as empresas.

Algumas empresas do setor de eventos que usufruem do Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos (Perse) estão respirando aliviadas. Isso porque a Justiça garantiu que os negócios sigam usufruindo dos incentivos fiscais do programa. Isso se dá mesmo após o anúncio da Receita Federal de cancelar o programa. Importante destacar que desde o dia 1º de abril, as isenções fiscais que beneficiavam o setor não estão mais disponíveis. O resultado será o aumento nos preços de turismo e eventos. 

De um lado, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad comentou que há um compromisso de honrar o limite de R$ 15 bilhões, conforme a Lei nº 14.859/2024. Entretanto, juízes de diversos estados entenderam que a interrupção do Perse ocorreu de maneira abrupta. Ademais, eles afirmam que a paralisação do Perse está em desacordo com o que é estabelecido na Lei nº 14.148/2021, que instituiu o programa. A norma original previa um prazo de 60 meses (até março de 2027) para as isenções de IRPJ, CSLL, PIS e Cofins.

Uma das decisões mais significativas foi concedida à Associação Brasileira de Bares e Restaurantes (Abrasel). Nela, a 4ª Vara Federal Cível do Distrito Federal ordenou que a alíquota zero dos tributos seja mantida até o término do prazo original.

Fim do Perse: prejuízos no consumo

Fernando Munhoz, sócio de tributário do Machado Meyer Advogados.

De acordo com o juiz Itagiba Catta Preta Neto, a interrupção abrupta do benefício causaria um impacto financeiro desproporcional para as empresas. Para eles, esses negócios ainda estão se recuperando dos efeitos da pandemia. Na decisão, o magistrado enfatizou que a revogação infringiria princípios constitucionais. Entre eles, o da anterioridade tributária e a segurança jurídica. Ademais, a eliminação do Perse no parecer do magistrado, vai contra decisões do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Código Tributário Nacional (CTN).

Em entrevista à Consumidor Moderno, o sócio de tributário do Machado Meyer Advogados, Fernando Munhoz, comenta a interrupção abrupta do Perse. “Para entender os aspectos legais dessa cessação, é crucial considerar o princípio constitucional da segurança jurídica, que é fundamental para a proteção de outros direitos. Esse princípio está consagrado na Constituição Federal. Precisamente, ele está inserido no inciso XXXVI do artigo 5º, que assegura que ‘a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito'”.

Ou seja, para entender o que acontece quando um benefício como o Perse acaba antes do planejado, é importante pensar na segurança das pessoas. Isso significa que as leis devem proteger os direitos que as pessoas já têm. Esse princípio está escrito na Constituição Federal, o grande livro de regras do nosso país. Portanto, lá diz que as leis não podem tirar os direitos que alguém já conquistou.

(In)segurança jurídica

Portanto, ele ressalta que o anúncio repentino da Receita Federal fere sim a garantia de segurança jurídica. E a segurança jurídica é um princípio essencial do direito tributário. Ademais, ela compromete a confiança legítima dos contribuintes. “E sem contar que a definição de um prazo de fruição tinha como objetivo permitir que as empresas do setor se reestruturassem e organizassem suas atividades, levando em conta a carga tributária a que estariam sujeitas nos próximos anos”, pontua Fernando Munhoz.

Ou seja, as empresas confiaram nas condições previamente estabelecidas e realizaram investimentos planejando suas atividades para o período de cinco anos de vigência do Perse. Mas, agora, enfrentam a perda dos benefícios fiscais. “Essa situação desestabiliza o ambiente econômico e prejudica a competitividade das empresas que contavam com esses incentivos para superar os desafios gerados pela pandemia de Covid-19.”

Anterioridade nonagesimal

Paulo Henrique de Figueiredo, do Souto Correa Advogados.

Paulo Henrique Bione de Figueiredo compartilha a mesma opinião que Fernando Munhoz. Ele é especialista em tributos no Souto Correa Advogados e diz o seguinte: “Embora se possa argumentar que o artigo 178 não se aplicaria, ao menos deveria ser respeitada a anterioridade nonagesimal, que se aplica ao PIS, Cofins e CSLL, bem como a anterioridade anual, que é igualmente relevante quando falamos do IRPJ”.

Com essas palavras, Paulo reflete sobre a importância de respeitar as normas tributárias vigentes, defendendo um olhar atento e responsável sobre o cenário fiscal. Afinal, em um ambiente onde as regras podem mudar a todo momento, a clareza e a previsibilidade são essenciais para um sistema tributário justo e equilibrado. “A falta de previsibilidade em relação à data em que seria atingido o teto compromete severamente os planejamentos feitos pelas empresas, uma vez que, apesar do teto previsto, havia uma expectativa de gozar do benefício até o ano de 2027. Agora, não apenas as empresas enfrentam desafios, mas os consumidores também se veem prejudicados diante desse aumento tributário antecipado”.

Impactos para o consumidor

Thais Matallo, sócia do Machado Meyer Advogados.

Por sua vez, Thais Mattalo, sócia da área de Direito das Relações de Consumo do Machado Meyer Advogados, destaca um ponto crucial: enquanto as empresas navegam na incerteza, elas têm que ajustar suas operações e equilibrar suas finanças. Para tanto, elas frequentemente se veem em busca de estratégias inovadoras para mitigar o impacto do aumento dos custos operacionais, que, sem dúvida, são fortemente influenciados pela carga tributária.

Questionada sobre o que o governo poderia fazer para reverter essa situação, Thais Matallo é enfática: “Uma das estratégias é a implementação de medidas de transição que possibilitem uma adaptação gradual à nova realidade tributária, evitando um impacto brusco nas finanças das empresas. Essa abordagem poderia envolver a diminuição progressiva dos benefícios fiscais até 2027, dando mais tempo para que as empresas se ajustem às novas condições. Contudo, até agora, não houve qualquer sinal governamental em relação a essa possibilidade, o que gera incertezas para os empreendedores do setor”.

Nesse sentido, Thais Mattalo, Fernando Munhoz e Paulo Figueiredo destacam a importância, da parte das empresas, de fazer um planejamento tributário eficaz. “Essa é uma ferramenta vital para as empresas que desejam minimizar os efeitos financeiros da revogação do Perse. Por meio de uma análise minuciosa de suas obrigações fiscais e da identificação de oportunidades de otimização, as empresas podem elaborar estratégias que ajudem a reduzir a carga tributária e a melhorar sua saúde financeira”, complementa Fernando.

O pré e o pós-Perse

O Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos (Perse) foi uma iniciativa do governo brasileiro, lançada em 2022, com a finalidade de apoiar um setor de eventos fortemente afetado pela pandemia de Covid-19. Instituído pela Lei nº 14.148/2021, o programa oferecia auxílio financeiro, incentivos fiscais e outras formas de suporte para a recuperação econômica de empresas e profissionais da área. Dentre os benefícios, destacava-se a isenção de Imposto sobre a Renda da Pessoa Jurídica (IRPJ), Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL), contribuição ao Programa de Integração Social (PIS) e Contribuição para Financiamento da Seguridade Social (Cofins) por um período de 60 meses, com término previsto para 2027.

Entretanto, em 2024, a publicação da Lei nº 14.859/2024 introduziu uma nova diretriz, estabelecendo que, apesar da isenção ser garantida por 60 meses, o benefício poderia ser revogado antecipadamente caso os contribuintes, ao usufruírem da isenção, gerassem uma “renúncia” fiscal de R$ 15 bilhões. Se esse teto fosse atingido, a isenção seria cancelada. A interrupção súbita do programa, que extinguiu o benefício fiscal a partir de abril de 2025, confirmada em 24 de março de 2025, por meio do Ato Declaratório Executivo RFB nº 2/2025 publicado pela Receita Federal, tem levantado diversas questões jurídicas.

O que fazer?

Agora, com o fim do Perse, Fernando Haddad destacou que a Receita Federal fará uma auditoria rigorosa. A ideia é garantir a transparência dos dados apresentados e a correção dos valores pagos. “Dessa forma, é crucial que as empresas mantenham registros precisos e organizados de suas atividades financeiras e tributárias, o que facilitará o processo de auditoria e assegurará a conformidade com as normas legais”, reforça Thais Matallo.

“A transparência e a cooperação com a Receita Federal serão fundamentais para evitar problemas futuros e garantir que os direitos das empresas sejam respeitados, enquanto elas cumprem corretamente suas obrigações fiscais no pós-Perse”, finaliza.

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