As empresas do setor de construção civil em São Paulo estão enfrentando sérios desafios financeiros e operacionais devido à ineficiência na prestação de serviços por parte da Enel Distribuição São Paulo. Por consequência, o consumidor final é quem é o mais prejudicado. A história não é de hoje, mas foi ganhando força, e atualmente, existem 14.890 unidades imobiliárias finalizadas por 38 construtoras e incorporadoras em São Paulo que ainda não possuem ligação de energia elétrica definitiva da operadora.
Fato é que a concessionária tem descumprido os prazos acordados com essas empresas, mesmo após as aprovações finais para que as obras recebessem eletricidade.
A falta do cumprimento do contrato tem gerado aumento nos custos operacionais, vez que as empresas, têm que adotar medidas paliativas – e fazer o uso de geradores – para cumprir o prazo de entrega desses imóveis. Mas, essa é somente a ponta do iceberg, porque, como o problema não para de crescer, o mesmo vem gerando insegurança na execução de projetos.
Quem explica melhor essa situação é o presidente do Sindicato da Construção Civil do Estado de São Paulo (SindusCon-SP), Yorki Estefan. “A situação é crítica e está impactando não apenas as construtoras e incorporadoras, mas também vem frustrando os planos de milhares de famílias que aguardam a entrega de seus imóveis e que depositaram suas esperanças em um novo lar”.
Inclusive, Estefan relatou essa dor dos consumidores e das empresas ao diretor da Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL), Sandoval de Araujo Feitosa Neto, durante uma audiência realizada no fim de janeiro, em Brasília. A ocasião contou com representantes da Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC), Associação Brasileira das Incorporadoras Imobiliárias (Abrainc), Sindicato da Habitação (Secovi-SP), Associação das Loteadoras (Aelo) e Caixa Econômica Federal, que também participaram da reunião.
O que diz a ANEEL?
William Gilheta assume o papel de coordenador do Grupo de Trabalho Enel do Comitê de Tecnologia e Qualidade (CTQ_Enel). Em entrevista à Consumidor Moderno, ele menciona que o problema se agravou nos últimos dois anos, especialmente devido à pandemia da Covid-19, que elevou a demanda por novos imóveis na capital paulista. Assim, a pressão para entregas em um cenário de alta demanda gerou desafios significativos para a Enel Distribuição São Paulo. “Com a aceleração na construção de novos empreendimentos, o número de solicitações de ligação de energia elétrica cresceu consideravelmente, mas o tempo de resposta da concessionária não acompanhou essa demanda”.
Considerando a gravidade do problema, foi criado, há cerca de dois anos, o CTQ_Enel, que conta com o apoio do SindusCon-SP, CBIC, Abrainc, Secovi-SP, Aelo e Caixa Econômica Federal. “O CTQ_Enel tem a finalidade de aprimorar a eficiência e a qualidade dos serviços oferecidos pela Enel Distribuição São Paulo, promovendo um diálogo contínuo entre os diversos stakeholders envolvidos no processo”.
Dessa forma, na última reunião dos representantes do setor, no fim de janeiro, com o diretor da ANEEL, Sandoval de Araujo Feitosa Neto, comprometeu-se a convocar um novo encontro. A ideia é oferecer um retorno e esclarecer possíveis soluções aos problemas apresentados: “Nosso compromisso é atuar para resolver essa questão com a máxima rapidez possível. Trata-se de um assunto de extrema relevância tanto para as empresas quanto para os consumidores que adquiriram novos imóveis, sejam eles residenciais ou comerciais. A ANEEL, em parceria com as entidades aqui presentes e com a Enel Distribuição São Paulo, buscará uma solução eficaz para atender prontamente a esses pedidos de ligação de energia”, afirmou Sandoval.
Passo importante
Na visão de William Gilheta, a audiência com a ANEEL foi um passo fundamental. Isso porque a questão foi discutida em níveis mais altos de governança e as autoridades competentes tomaram ciência da gravidade do problema. Ele então comenta que, além das implicações diretas na qualidade de vida das famílias, a situação impacta negativamente a economia local.
E, diante disso, o SindusCon-SP e demais entidades estão unindo forças para exigir que a Enel Distribuição São Paulo cumpra suas obrigações contratuais, garantindo que a energia elétrica seja disponibilizada de forma eficiente. “A luta por uma regulamentação mais rigorosa e mecanismos de fiscalização mais eficazes também se torna um tema essencial nas discussões futuras, visando não apenas a resolução do problema atual, mas a prevenção de situações semelhantes no futuro”, pontua William.
Sua expectativa, então, é que as autoridades reconheçam a urgência dessa situação e que medidas concretas sejam implementadas para assegurar que as famílias possam finalmente desfrutar de seus lares, e que o setor da construção civil possa operar sem esses entraves, promovendo o desenvolvimento urbano e econômico da maior cidade do País.
Mais prejuízos
Os representantes do setor de construção e do mercado imobiliário apontaram que, aproximadamente, 40% das conexões de energia dos novos empreendimentos estão atrasadas. A entrega de vários desses projetos está comprometida. Em resumo, as consequências diretas são:
- Insuficiência de energia nos condomínios prontos para atender todas as unidades;
- Prejuízos financeiros resultantes do uso de ligações provisórias e geradores a diesel, sendo que eventuais sinistros não terão cobertura das seguradoras;
- Aumento dos custos, comprometendo a viabilidade financeira dos empreendimentos;
- Desconfiança entre investidores e compradores, o que afeta os investimentos;
- Repasse de custos adicionais aos clientes, prejudicando a imagem das construtoras e incorporadoras;
- Adiamento da possibilidade de que os compradores iniciem o pagamento de financiamentos habitacionais, provocando insatisfação.
Programas habitacionais impactados
De acordo com William, os atrasos nas ligações de energia impactam negativamente programas habitacionais como Minha Casa Minha Vida, Casa Paulista e Pode Entrar. Como efeito “bola de neve”, esses programas passam a ter sua eficiência, credibilidade e a confiança de seus parceiros e investidores afetada. “Não podemos deixar de lado também o fato que as construtoras e incorporadoras impactadas pelo desacordo contratual também enfrentam danos à sua reputação e credibilidade. Ademais, há atrasos na recuperação de seus investimentos, incertezas e uma percepção de risco elevado. Elas podem, inclusive, incorrer em multas e penalidades legais, enfrentar processos judiciais e perder investidores, caso não entreguem os imóveis no prazo”, finaliza William.
Em 2025, o Sinduscon-SP e a FGV Ibre previram um crescimento de 3% no PIB da construção civil.
Em outras palavras, o aumento da demanda por infraestrutura e habitações adequadas, aliado ao crescimento populacional e à urbanização acelerada, intensifica a necessidade de um planejamento urbano eficaz e rápido. Portanto, a conexão consistente com serviços essenciais, como energia elétrica, se torna fundamental para garantir a continuidade de projetos habitacionais e de infraestrutura.
A resposta da Enel
Procurada pela Consumidor Moderno, a Enel Distribuição São Paulo esclarece que vem acelerando a conexão de novos clientes na área de concessão, apesar de as contingências climáticas afetarem, em alguns meses do ano, as obras realizadas pela companhia. A distribuidora realizou, em 2024, cerca de 500 mil ligações novas, sendo 98,8% dentro do prazo regulatório.
No ano passado, a companhia também realizou cerca de 2.700 obras de expansão de rede para atender parte dessas ligações. Desse total, cerca de 1.500 foram executadas no segundo semestre. O número representa um aumento de 43% em relação aos primeiros seis meses do ano. “Isso demonstra a capacidade de execução da empresa, em linha com o aquecimento do setor imobiliário”, diz a nota.
O documento acrescenta que no primeiro trimestre deste ano está aumentando em 70% a capacidade de execução de novas obras.
Por fim, a Enel Distribuição São Paulo esclarece que os prazos são estabelecidos pelo órgão regulador. “Assim, eventuais mudanças nesses prazos impactam todo o setor de distribuição de energia”.