As avaliações elevadas da França em matemática servem como explicação para o desempenho do país no desenvolvimento de sua educação. Recentemente, o sistema educacional passou a utilizar ferramentas de IA com resultados notáveis. Em pouco tempo, o país tornou-se líder nessa concepção inovadora de ensino. Claro que há outros fatores, mas há motivos para preocupação, já que a competição global desafia a posição francesa no uso bem-sucedido da tecnologia para formação de novos talentos.
O que podemos aprender com a experiência do país nessa área promissora? O Brasil discute há décadas formas de incrementar a qualidade da educação e perde tempo procurando soluções “tropicais” e pasteurizando o ensino, sem obter resultados consistentes.
Yves Poilane, Diretor da ParisTech, fez uma apresentação sobre o uso e a experiência francesa no uso de IA na formação de quadros para o mercado e para sociedade. Ele vê o uso dessa tecnologia como uma vantagem competitiva e que seu nível de desenvolvimento atual traz muitos benefícios para o aprendizado. Foi-se o tempo em que ela podia nos assustar, depois da famosa derrota de Garry Kasparov para o Deep Blue, em um torneio de xadrez há mais de 20 anos.
Em busca do protagonismo
A ParisTech é uma rede francesa de dez Escolas de Graduação de Engenharia e Ciência que trabalham em conjunto para o desenvolvimento de projetos comuns em educação, pesquisa e inovação na área de ciência, tecnologia e gestão.
A complementaridade nas áreas de excelência das Escolas ParisTech proporciona aos estudantes, pesquisadores e a todos os parceiros (institucionais e empresas) uma oferta interdisciplinar diferenciada e poderosa de treinamento e pesquisa. A ParisTech também tem diversos acordos de cooperação e parcerias internacionais em educação e pesquisa.
Yves diz que hoje a França disputa com a China o protagonismo no uso educativo da IA, particularmente na formação de grandes cérebros especializados em matemática, engenharia e informática, carreiras de ponta na era digital. Efetivamente, a formação dos engenheiros e matemáticos franceses ganhou impulso e qualidade superior pela aplicação de sistemas e algoritmos no entendimento e preparação de conteúdos voltados para IoT, preservação de energia e uso racional de recursos naturais. Outras carreiras beneficiadas pelo investimento francês nos sistemas digitais foram a engenharia eletrônica e a medicina. Ao mesmo tempo, as IAs trouxeram conhecimento de amplo espectro para os jovens estudantes, permitindo compartilhar dados que ressaltam benefícios sociais nas atividades e na atuação profissional.
Dinheiro, sempre o gargalo
O executivo é hoje o responsável pelo sistema de financiamento da Paristech para estimular a criação de startups e também de scale ups de grande impacto social e tecnológico, inclusive em nível global. E que a posição da Franca no cenário global depende, de modo vital, na atualização dos currículos e da qualidade dos profissionais formados nas universidades.
Comparando esse posicionamento do país europeu com a medíocre discussão e conceitos de educação que temos hoje no Brasil, estamos diante de um quadro assustador. Simplesmente, nossa visão de educação está completamente descolada da realidade global e nem de longe nos traz qualquer vantagem competitiva. Estamos formando jovens sem qualificação, desperdiçando talentos. Somente o acaso explica os profissionais de bom nível que temos hoje nas nossas empresas.
Mas como o país pode manter essa vantagem em relação a outros mercados de alta qualificação em nível global e mais, fazer com que esses novos talentos possam contribuir para a dinamização da economia francesa? O grande gargalo hoje, tal como no Brasil, é a falta de maiores recursos para financiar a melhoria de um ensino que já mostrou resultados. Yves citou o caso de Steve Schwarzman, CEO da Qualcomm que doou US$ 30 milhões para o Massachusetts Institute of Technology – MIT – e Jesper Ho, CEO da Lidl Supermarkets, da Alemanha, que doou US$ 100 milhões para uma Universidade local. O curioso é que as verbas para educação estão estagnadas há anos. O governo não tem dinheiro, não há muito investimento de fundos, nem motivação para atividade filantrópica ou investimentos de empresas que se beneficiam da mão de obra de alta qualidade do país. E isso em uma economia que permite descontar até 67% do recurso investido em educação do imposto de renda.
Reféns do obscuro
O jogo da relevância no mercado global é bruto, pesado e exige recursos e gente qualificada. Se a França, com uma educação de bom nível e bons quadros vê seu protagonismo em risco, que dirá nosso Brasil, onde a educação é vítima de corporações, conceitos antigos, visões equivocadas e negação da realidade? O Brasil precisa desesperadamente de profissionais capazes de repensar a nossa realidade, de oferecer soluções que modernizem o país e tragam benefícios sociais evidentes, além de contribuição para o fomento de mercados fortemente competitivos em nível global. Passeatas nas cidades infelizmente só ajudam nossa educação a permanecer na obscuridade.