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Reforma tributária: conheça os conflitos para heranças e doações

Reforma tributária: conheça os conflitos para heranças e doações

A reforma tributária visa simplificar o sistema fiscal, mas resultará em aumento da carga tributária sobre bens transmitidos por herança.

A reforma tributária sobre o consumo aumentará o imposto sobre heranças e doações. O tributo, conhecido como Imposto de Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD), será majorado em dez estados do país. Essa mudança poderá gerar repercussões significativas no consumo e nas finanças familiares. Isso porque os contribuintes poderão se deparar com uma carga tributária maior ao transferir bens e posses para seus herdeiros ou beneficiários.

Sérgio Papini, sócio do Queiroz Cavalcanti Advocacia.

Ademais, esse aumento poderá impactar a disposição das pessoas em realizar transferências de propriedades e doações em vida. Isso porque um aumento de imposto neste aspecto é visto como um desencorajamento a essas práticas. Em efeito cascata, a medida resultará em uma diminuição no suporte econômico que muitos indivíduos oferecem aos seus entes queridos. E, ao mesmo tempo, exigiria um planejamento sucessório mais rigoroso.

Isso ocorre porque o texto da reforma determina que o imposto passará a ser progressivo. Assim, em todo o território nacional, as alíquotas deverão ser crescentes, variando conforme o valor do patrimônio transmitido. Quem explica melhor é Sérgio Papini, sócio do Queiroz Cavalcanti Advocacia: “a Emenda Constitucional 132, no art. 153, § 6º, inciso VI, estabelece que o ITCMD será progressivo de acordo com o valor do quinhão, legado ou doação. O Projeto de Lei Complementar (PLP) nº 108/2024, que está sendo discutido no contexto da reforma tributária e foi aprovado pela Câmara (ainda pendente de aprovação pelo Senado), também prevê uma alíquota progressiva para heranças e doações. Portanto, quanto maior o valor da herança ou doação, maior será o percentual de imposto a ser pago”.

Período de transição

Ao ser questionado se é possível escapar das novas alíquotas na reforma, Sérgio Papini é enfático: “não”.

Ou seja, teoricamente, não é possível. “Salvo na inclusão nos regimes especiais e nas reduções de alíquotas previstas no PLP nº 68, pois sua implementação será nacional”, expressa Papini. No entanto, a transição será gradual:

  • 2026: início da cobrança da Contribuição de Bens e Serviços (CBS) e do Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) com alíquotas reduzidas;
  • 2027: cobrança integral da CBS, extinção do PIS/Cofins e Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), com exceções para a Zona Franca de Manaus. Início da cobrança do Imposto Seletivo (IS);
  • 2029: início da redução escalonada do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Prestação de Serviços (ICMS) e do Imposto sobre Serviços (ISS). Para esses tributos, está previsto redução de 1/10 ao ano até 2032;
  • 2033: extinção completa do ICMS e ISS, e aplicação da alíquota cheia do IBS.

Impacto da medida

Mateus Campos, coordenador da prática tributária do BVA.

Mateus Campos, coordenador da prática tributária do BVA – Barreto Veiga Advogados, alerta que o principal ponto a impactar os procedimentos de inventário é a progressividade do ITCMD. Ou seja, heranças e legados de maior valor estarão sujeitos à aplicação de alíquotas maiores, incrementando o ônus total esperado. Esse ponto deve ser observado segundo o entendimento de dois temas. Em primeiro lugar, cada estado regulamentará a progressividade de maneira apartada. Em segundo lugar, até o momento, a progressividade está sujeita aos limites de alíquotas de no mínimo 2% e de no máximo 8%. Todavia, há discussões no Senado Federal para elevar o teto para 16%.

“Adicionalmente, o texto aprovado pela Câmara dos Deputados sobre o projeto de regulamentação da reforma tributária estabeleceu a ampliação dos bens sujeitos à incidência de ITCMD, para abarcar, dentre outros, os rendimentos de previdências privadas. Dado o impacto de tal medida, gerou-se um debate nacional quanto à correção deste entendimento, com o posicionamento contrário de setores econômicos e da sociedade, o que deverá refletir no processo de apreciação do projeto pelo Senado Federal”, pontua Mateus Campos.

VGBL e PGBL

Frederico Hilzendeger, advogado do escritório Souto Correa.

Frederico Hilzendeger, advogado do escritório Souto Correa na área de organização patrimonial e sucessória, ressalta que as ações judiciais que discutem a matéria nos Estados que já pretendiam a cobrança do imposto versam sobre a natureza de cada previdência, especialmente em relação ao VGBL. “Isso porque, conforme resoluções próprias, o VGBL tem natureza de seguro e, portanto, sobre tal recurso não poderia incidir o imposto, na medida que não se trata de uma transferência de patrimônio do falecido ou doador, mas sim de pagamento de seguro ao beneficiário indicado”.

Frederico pontua então que, no que tange ao VGBL, existem elementos para questionar a incidência do ITCMD, mas a questão temporal indicada no Projeto de Lei traz a justificativa de evitar o que entendem ser uma prática de evasão fiscal (objetivo de reduzir a carga tributária de forma ilícita), o que diminui as chances de êxito em relação ao cenário atual. No que diz respeito ao PGBL, o entendimento jurisprudencial apresenta diferentes posições, sendo mais difícil afastar sua característica de aplicação financeira.

IRPF

Michel Batista, sócio do Vieira Rezende Advogados.

Michel Siqueira Batista, sócio da área de Planejamento Patrimonial & Sucessório do Vieira Rezende Advogados, ao ser questionado se além do ITCMD, o contribuinte corre o risco de ter a base de cálculo do Imposto de Renda Pessoa Física (IRPF) majorada, é enfático: “não existe hoje nenhuma discussão em andamento e específica para majorar o IRPF. Não obstante, no final do ano passado foi aprovada a Lei nº 14.754/23, que aprovou alterações que impactaram na tributação de fundos de investimentos, inclusive fundos exclusivos, e sobre ativos no exterior. No mais, já se especulou sobre restrições à dedutibilidade de despesas com saúde, o que implicaria no aumento da base de cálculo do IRPF”.

Para ele, a previsão é que, como as alíquotas do ITCMD serão progressivas, os estados que atualmente possuem uma alíquota fixa deverão criar alíquotas crescentes de acordo com o valor do patrimônio doado/transferido por herança. Por conta disso, na prática a tendência é que haja uma elevação de alíquotas.

Brasil e exterior

“Só para exemplificar, no Estado de São Paulo a alíquota atualmente aplicável é de 4% independentemente do valor do patrimônio”, explica Michel Batista. “Para se adaptar à nova regra aprovada na reforma tributária, existe um projeto de lei em São Paulo para que as alíquotas passem a variar de 4% a 8%, de acordo com o valor do patrimônio transmitido. Além disso, existe um Projeto de Resolução no Senado para autorizar os Estados a cobrarem até 16% de ITCMD. Atualmente a alíquota máxima permitida é de 8%”.

O ITCMD incide sobre todo o patrimônio transmitido, seja móvel ou imóvel, no Brasil e também no exterior. Com relação ao patrimônio no exterior, o texto da reforma tributária passou a autorizar a cobrança do ITCMD sobre esses ativos independente da edição de Lei Complementar pelo Congresso Nacional. “Ocorre que, para cobrar o ITCMD sobre bens no exterior, os estados precisam antes aprovar leis estaduais prevendo a incidência do imposto sobre essas situações. Até o momento nenhum estado aprovou lei com esse conteúdo”, afirma. Deste modo, pode-se dizer que, no momento, o ITCMD não alcança bens deixados no exterior, ainda que o falecido fosse residente no Brasil e tenha seu inventário processado aqui.

Consumidor: pontos de atenção

Daniel Duque, CEO da Herdei.

Daniel Duque é CEO da Herdei, empresa especializada em cortar caminhos para quem tem heranças a receber. Diante da complexidade das regras atuais e da reforma tributária, ele recomenda que as famílias passem a olhar com mais atenção para o planejamento sucessório e antecipação da doação de parte do patrimônio, como bens e imóveis. “Com as novas alíquotas progressivas, antecipar a doação de parte do patrimônio pode se tornar uma estratégia essencial para minimizar a carga tributária futura. A conscientização sobre a importância de planejar antecipadamente a sucessão dos bens, portanto, será ampliada, à medida que as famílias busquem proteger seus patrimônios e assegurar uma transição mais tranquila e menos onerosa para os herdeiros”.

Neste sentido, é aconselhável se antecipar às doações para se beneficiar de uma alíquota menor de ITCMD. “Essa é uma estratégia vantajosa, especialmente antes que as novas alíquotas mais elevadas entrem em vigor. Ao realizar as doações sob as regras atuais, que podem ter alíquotas menores, as famílias podem reduzir a carga tributária sobre o patrimônio transmitido aos herdeiros. No entanto, é fundamental que essa estratégia seja bem planejada e orientada por profissionais especializados, para garantir que todas as implicações legais e fiscais sejam cuidadosamente consideradas”, finaliza Duque.

Saiba mais sobre o ITCMD

O ITCMD é um tributo estadual que incide sobre o valor venal de bens ou direitos, como imóveis, veículos, ações e dinheiro, quando estes são transmitidos a herdeiros em caso de falecimento ou por meio de doações em vida. Atualmente, o imposto sobre herança está limitado a 8%, teto estabelecido pelo Senado Federal. Existe uma proposta em discussão, ainda não aprovada, que eleva esse limite para até 16%. As alíquotas aplicadas sobre heranças podem diferir das de doações, conforme a legislação de cada estado.

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