O que tira o seu sono? O que faz com que um líder à frente de uma empresa de bilhões e centenas de lojas sinta receio ou insegurança? É possível que um CEO consiga demonstrar esses sentimentos? Essas foram as premissas de um dos debates mais contundentes do World Retail Congress. No painel, Neela Montgomery, CEO da Crate & Barrel (que vimos também no Shoptalk) e James Rhee, CEO da Ashley Stewart e fundador do FirePine Group falaram sobre seus principais desafios à frente dos negócios. Como preparação para o painel, ambos receberam uma longa lista de perguntas que incluíam os. Problemas com a cadeia de valor, lucratividade, o impacto de embalagens e produtos no meio-ambiente e a atuação como líderes. E para aumentar o risco de sua exposição, só conheceram o moderador na hora do debate (Naga Munchetty, jornalista internacional), além de receberem perguntas plateia diretamente da plataforma Slido.
O resultado foi surpreendente. Os participantes puderam ver e entender a complexidade da gestão e da tomada de decisões com franqueza e objetividade. Ambos os CEOs manifestaram suas preocupações e intenções, sem fugirem de nenhum assunto.
James e Neela foram questionados sobre seu histórico, diversidade, transformação digital. Foram sinceros ao afirmar que as decisões de negócio precisam sempre levar em consideração o que podem trazer de retorno em um prazo razoável. Falaram sobre como falhas ensinam, mesmo que sejam dolorosas e que este é o tempo ideal para que empresas corram riscos, para que possam se adaptar às mudanças, considerando as mudanças no ambiente de trabalho.
Naga Munchetty afirmou que está vendo uma transformação social e tecnológica profunda e que por mais que as lideranças do evento destaquem suas atividades, o fato é que o varejo não muda na velocidade adequada. Neela Montgomery, da Crate & Barrel, afirma que todo debate é sempre mais rico que o trabalho, que as palavras correm mais rápido do que o que acontece na sala de reuniões. James Rhee concorda que a crítica e o ceticismo são justas. Ele afirma que é difícil convencer os jovens, particularmente da geração Z a superarem seu ceticismo e sua descrença nas instituições e que não são guiados pelas ambições que caracterizaram as gerações anteriores. O varejo tradicionalmente representa uma carreira onde os mais jovens podem ter oportunidades de desenvolver habilidades e fazer parte de um futuro melhor, e ainda assim, é preciso fazer a Geração Z olhar para além do emprego em si. O executivo da Ashley Stewart afirma que é realmente difícil lidar com um mercado onde 95% das famílias negras recebem menos que as famílias brancas nos EUA. “Chegou a hora do capitalismo fazer a diferença e não apenas fazer dinheiro”, afirma. James diz que é necessário desenvolver novas habilidades para tentar reduzir o tempo e os obstáculos que impedem a tomada de decisões difíceis.
O futuro do varejo
E como o varejo está realmente se preparando para o futuro? Qual será o próximo passo das lojas físicas? Para Neela, as redes varejistas realmente precisam pensar em tornar as lojas mais acessíveis, reduzindo os pontos de atrito e redesenhando os ambientes para oferecer experiências superiores. A Crate & Barrel está procurando estimular colaboração entre designers de interiores e consumidores para melhorar a experiência geral e reimaginar o que as lojas devem ser. James Rhee acredita que as lojas precisam desenvolver características mais humanas, ter mais empatia, e precisam continuar a gerar escala. Não há experiência viável em lojas que não tenham venda, simples assim, assim como o crescimento orgânico não pode ser atingido sem lojas rentáveis.
Neela diz que tanto como um site consegue atrair tráfego orgânico, as lojas precisam ter esse poder. A ênfase é na conexão e na interação com os clientes, e novas plataformas precisam colaborar para o storytelling da empresa, da rede varejista. O conteúdo assume uma importância excepcional nesses novos tempos onde o ritmo das inovações é digitado por gigantes como Amazon e Alibaba. Os executivos dizem que a busca por lealdade é ingrata, não é possível maquiar ou disfarçar a falta de engajamento dos clientes e que as lojas precisam se dedicar realmente a conquistar seus clientes todos os dias.
A discussão sobre diversidade também precisa evoluir no varejo, e dentro de um princípio claro e justo: empresas precisam de talentos, e eles precisam demonstrar habilidades e competências e que a demografia se impõe simplesmente. As empresas não vão fechar as portas para talentos por conta de preconceitos, não podem se dar a esse luxo.
Preocupação ambiental
O meio-ambiente é realmente uma preocupação para as empresas? James Rhee diz que os custos de alimentação impactam diretamente na qualidade do trabalho. As pessoas precisam comer melhor e o preço da alimentação torna inacessível a refeição saudável e os impactos da mudança climática sobre a agricultura são incontroláveis. Por outro lado, Neela diz que o aquecimento global mexe completamente com a estrutura das matérias-primas dos móveis e afetam diretamente a saúde dos negócios. A Crate & Barrel tomou a decisão de mudar embalagens e outros materiais, não por pressão consumidores, mas por necessidades do negócio, para mitigar riscos.
Em mundo veloz, no qual Amazon e Alibaba e Walmart competem por quem consegue entregar mais rápido para atender os consumidores, incluindo decisões insustentáveis como entrega sem custos de frete. James diz que não pode tomar uma decisão que inclua frete grátis porque isso iria levar ao fechamento de lojas. E lojas fechadas não trazem benefício social e nem para os consumidores de fato.
Para finalizar, os executivos falaram sobre a reputação do varejo: empresas que forçam os trabalhadores a longas jornadas de trabalho, sem muito respeito pessoal e pelo bem-estar. Não existem respostas fáceis, já que toda a estrutura corporativa, do mercado é baseado em métricas que levam em conta o tempo destinados às diferentes tarefas. Romper esse padrão não é simples, porque no fim do dia o quanto é possível pagar mais por menos tempo de trabalho? Ainda assim, a sociedade precisa refletir sobre o que ela faz com seu tempo livre. Se queremos tudo cada vez mais rápido, é necessário reduzir o tempo de todas as tarefas de cada processo e aumentar as pressões para que tudo aconteça o mais rapidamente possível.
A coragem demonstrada por Neela Montgomery e James Rhee foi notável. Uma sessão da qual abriram mão do controle do discurso para falar com sinceridade sobre dores, problemas e a realidade da sala de reunião, da operação e da pressão competitiva.