“Ainda não podemos dizer que as pessoas estão otimistas, mas podemos dizer que estão menos pessimistas”, diz Zeina Latif, economista-chefe da XP Investimentos. A sensação que tínhamos antes, de acordo com ela, é que o fundo do poço não chegaria nunca – e isso afeta a expectativa de todos. Contudo, essa sensação está começando a se estabilizar – e isso é muito positivo, porque traz alguma esperança e reflete nos indicadores de confiança.
“No fim do processo de impeachment, os indicadores de confiança subiram por esperança. Agora, isso acontece por um movimento mais consistente”, argumenta. “A minha avaliação é que esse processo de confiança vai se consolidar nos próximos meses, mas ainda em 2017 não teremos toda a recuperação”. O que ela acredita é que a confiança deverá se juntar à percepção de como está o país – os dois sendo positivos.
Para Zeina, a inflação é como a febre. Quando surge de repente e parece passar rápido, não deve ser assustadora. Mas, vivemos uma inflação teimosa que ameaçava sair do controle. E ela é como a febre que não cede: o erro do governo foi ignorar essa tendência. “Com o time econômico avançando, a reação natural é a inflação cair”, diz, comentando sobre a situação atual.
Mas, considerando o passado, era evidente que a inflação não se acertaria sozinha. Como ela acredita, enquanto a capacidade do governo de pagar a divida ainda é posta em dúvida, empresas não acumulam grandes crenças, a economia não anda, a inflação não cai, o Banco Central (BC) perde o controle do processo – e essa esse o cenário antes do impeachment. “O mercado financeiro chegou a precificar desse cenário”, diz, o que incluía a previsão de cotação de dólar de R$ 6 para 2018. “É mérito do governo de hoje a redução da inflação”, afirma. “Ela não teria caído sozinha”, afirma.
Crise fiscal
No Recover Money de 2016, Zeina afirmou que a origem da crise é fiscal. E ela ainda sustenta essa ideia. “Começamos a ter resultados fiscais cada vez piores, o que foi feito é pior do que as ‘pedaladas’”, afirma. Os dados que mostram os resultados do governo caíram, não acompanhando a dívida do mesmo – que só aumentou. “Entender que a crise é fiscal é fundamental. Se as pessoas duvidam da capacidade do governo de honrar suas dívidas, não há a possibilidade de o país se estabilizar”, afirma.
Por isso, o mérito é do governo, que topou as reformas e chamou uma equipe econômica confiável – e não política. “Diagnóstico correto, time e capacidade de aprovação de reformas são a combinação para o sucesso da melhoria”, afirma.
Envelhecimento
Zeina afirma que é também um problema que a população esteja envelhecendo ao mesmo tempo em que gastamos muito com previdência – e é uma pena que a reforma não tenha dado certo na gestão FHC. “A expectativa de vida aumentou, enquanto as pessoas não têm a quantidade de filhos que tinham antes”, afirma. “As despesas previdenciárias foram 13% do PIB em 2016 e vai aumentar junto com o aumento da população idosa”.
Ainda somos um país jovem, no bônus demográfico, gastando o que países idosos gastam com previdência. Nesse sentido, ela afirma que, sem a reforma, viraremos um grande Rio de Janeiro: 50% da receita do Estado está comprometida com funcionários inativos. “Não se trata apenas de pagar contas, mas não deixar políticas públicas colapsarem”, argumenta.
Atitude
O fato é que o diagnóstico dessa situação foi feito e uma primeira medida foi tomada: a Regra do Teto – da famosa “PEC do Teto”. Isso vai obrigar entes públicos a mudar a forma como agem. “A Regra do Teto vai ajudar a garantir, sendo cumprida, que a dívida publica pare de subir e se estabilize”, explica. “Mas, sem a Reforma da Previdência, ela implodirá”.
Entre questões que ela destaca como ainda necessárias, está a necessidade de flexibilizar a possibilidade de demissão em cargos públicos. “Outra discussão que tende a crescer é a universidade publica gratuita, que é ocupada majoritariamente por pessoas ricas e deveria ser pagas por quem pode pagar”, aponta.
Atualidade
Hoje, Zeina destaca que a taxa neutra de juros – calculada a partir da subtração da inflação prevista da taxa Selic – está em queda. A expectativa dela é que o BC corte a Selic, chegando a um dígito nos próximos meses. “Acho que podemos nos surpreender com as arrumações da economia que estão acontecendo”, aponta.
Para ela, essa arrumação vai mudar o país, dando abertura para mais mudanças. “Precisamos cortar juros, aprovar a previdência – ou o país vai desandar”, argumenta.
Política monetária
Como afirma a economista-chefe, a política monetária ainda funciona. E por mais que a crise seja fiscal, a insegurança jurídica no empréstimo de crédito é um dos fatores que mais impactam. “Nossa recuperação de crédito é baixa. Com o custo que há no empréstimo de crédito, não vale a pena emprestar. E é natural que a busca por crédito caia no processo de crise, contudo, mas aqui é excepcional, porque os bancos puxam o freio no cenário de inadimplência”, afirma. Isso piora ainda mais a crise.
Também nesse cenário, aconteceu o aumento da confiança nesse sentido – mas ela ainda não é totalmente positiva. E ela ressalta: o fato de a Justiça ser sempre favorável ao devedor piora essa situação. “Destruímos o mercado de crédito bancário”, diz. E o pior disso tudo está relacionado a realidade de Pessoa Jurídica.
Cenário
O número de endividados ainda é alto. E os bancos públicos não poderão ajudar – isso pode levar a diminuição ainda maior da Selic. Outro ponto é o mercado de trabalho. “Se pudéssemos ter mais mudanças de salário ou de jornada, teríamos menos demissões”, diz. “A insegurança jurídica também afeta nesse ponto: o empresário contrata já sabendo que pode haver um problema jurídico no futuro”. A boa noticia no mercado de trabalho é a estabilização – reflexo do aumento de confiança.
A confiança do consumidor também está melhorando – o que caracteriza um consumidor menos pessimista, ajustando o orçamento. Nesse sentido, ela destaca que o maior problema não é a Pessoa Física, mas a Jurídica.
Contexto mundial
Considerando o cenário internacional, Zeina diz que, primeiro, precisamos dizer que é preciso ter sorte na vida – Lula teve muita, com o cenário que internacional em que viveu as gestões como presidente. “Dilma, não. Ela não tem sorte”, diz. “Temer, por sua vez, teve alguma – mas é bom que não tenha muita, porque se o Brasil ficar feliz demais não fará as Reformas”. Analisando a atualidade, ela ressalta que o ambiente internacional é propicio à economia.
Contudo, a produtividade do Brasil, quase sendo alcançada pela da China, preocupa. Assim como o bônus demográfico, já citado. “Estamos com a produtividade travada”, diz. “Somos improdutivos em tudo, menos na agropecuária”. Isso significa que o Custo Brasil afeta a todos. “Precisamos de políticas horizontais para melhorar o ambiente para todos, não só para alguns grupos”, conclui.