Por décadas, as decisões de compra foram guiadas por fatores racionais como preço, qualidade e praticidade. Mas essa lógica tem mudado. À medida que o mundo passa por transformações profundas, como crises sanitárias, instabilidades políticas e avanço acelerado da tecnologia, as emoções ganham cada vez mais protagonismo nas escolhas de consumo. Segundo o relatório “Consumidor do Futuro 2027: Emoções”, da WGSN, o sucesso das marcas dependerá diretamente da capacidade de compreender e responder aos sentimentos que movem seus clientes.
O estudo mostra seis emoções-chave que irão moldar o comportamento do consumidor até 2027. Delas, três já são apresentadas no relatório: Alegria Estratégica, Desvontade e Otimismo Cético. Cada uma representa não apenas um estado emocional individual, mas também um reflexo das tensões e aspirações coletivas da sociedade contemporânea.
O levantamento reforça que “as emoções são o caminho para entender o consumidor e impulsionar a inovação dos produtos, o crescimento da empresa e o engajamento dos clientes. Use este recurso valioso para influenciar como os clientes reagem à história, aos produtos e às experiências da marca, moldando as decisões de compra e fidelizando-os”.
Alegria estratégica
A primeira emoção destacada pela WGSN é a Alegria Estratégica, que desponta como uma reação direta ao cenário de estresse prolongado, tédio e desregulação emocional que marcou os últimos anos. Evolução de tendências anteriores como Encantamento (2024), Imaginação (2025) e Microalegrias (2026), essa nova fase busca transformar o prazer em uma ferramenta de transformação individual e coletiva. “Cultivar a alegria não é apenas fundamental para a saúde pessoal – também é para a saúde dos negócios”, destaca o estudo.
Pesquisas citadas pelo estudo mostram que marcas divertidas ou bem-humoradas geram maior conexão emocional com os consumidores. E o custo da infelicidade no trabalho não é pequeno: só nos EUA, funcionários insatisfeitos geraram um prejuízo estimado de US$ 1,9 trilhão em produtividade em 2023.
Segundo o relatório, em 2027, consumidores e marcas irão enxergar o brincar como hábitos e mentalidades positivas. O brincar também ajudará as pessoas a passarem de uma mentalidade de “o que é” para “e se?”, e a experimentarem novas fronteiras. Elas reimaginarão o mundo não apenas por meio da Inteligência Artificial (IA), mas também da “Kid Intelligence” (ou “Inteligência Infantil”). Essa abordagem enaltece a capacidade de imaginar, se maravilhar e criar sem amarras.
Além disso, o estudo mostra que três emoções definirão o cenário da Alegria estratégica: a sensação de desregulação, o estresse e o tédio. Conforme os desafios globais aumentam, essas emoções exigirão novas abordagens e soluções. Como resposta, os consumidores buscarão três estados emocionais desejáveis: sentir-se parte de uma narrativa cultural mais abrangente, encontrar serenidade em meio ao caos e inspirar-se profundamente no mundo ao redor.
Desvontade
A WGSN previu que 2026 será marcado pela exaustão generalizada, como o estresse no trabalho e no ambiente digital. Como resposta a isso, podem ocorrer casos de sobrecarga e burnout. Em contraponto, surge a Desvontade, definida pela WGSN como a “ânsia por se livrar de responsabilidades”. Trata-se de uma resposta emocional aos sentimentos de 2026. Em vez de insistir em fórmulas de eficiência e autocobrança, os consumidores de 2027 buscarão leveza, desaceleração e vínculos mais significativos.
O conceito, cunhado originalmente por John Koenig em “O Dicionário de Tristezas Obscuras”, ganha nova força e incentiva as pessoas a buscarem uma vida mais tranquila. A Desvontade, nesse cenário, não será sinônimo de apatia, mas de uma escolha ativa por priorizar o bem-estar, a saúde mental e os relacionamentos autênticos.
Na prática, essa emoção já se manifesta em tendências como o “minimalismo de notificações”, ou seja, a prática de reduzir alertas e distrações digitais, ou a busca por menos barulho. O estudo cita ainda a popularização de canções nostálgicas com mensagens de autocuidado, como Vienna (1977), de Billy Joel, que viralizou no TikTok entre a Geração Z.
A WGSN aponta que esse movimento será acompanhado por uma onda de “desabituação”: a ruptura com hábitos prejudiciais e a reorganização da vida em torno de escolhas mais conscientes. Além disso, o estado de Desvontade será moldado por três motivadores emocionais: a sensação de estar oprimido por responsabilidades; o sentimento de solidão; e uma crescente empatia pelos outros.
Otimismo cético
O avanço da Inteligência Artificial, a proliferação de fake news e a concentração de poder nas mãos de grandes empresas de tecnologia têm moldado uma nova emoção dominante: o Otimismo Cético. Em vez de uma entrega irrestrita às promessas da inovação, os consumidores de 2027 terão uma postura ambivalente, marcada por admiração e desconfiança. Se de um lado existe o entusiasmo pelo potencial transformador da IA, de outro cresce o medo das consequências da distorção online.
O estudo frisa que, na era da informação e da desinformação, os consumidores são bombardeados por estímulos que podem inspirar tanto admiração quanto temor ou desencanto, um quadro intensificado por um consumo de mídia segmentado por classe, idade, localização geográfica ou ideologia, criando um mosaico de realidades autovalidadas.
A WGSN já vinha mapeando versões anteriores desse sentimento em suas previsões, como o Otimismo Realista (2024) e o Otimismo Racional (2026), mas agora ele se consolida como um estado permanente de vigilância emocional. Em um mundo hiperconectado, consumidores estarão mais exigentes quanto à transparência, à ética e ao impacto social das inovações.
Para as marcas, surge a responsabilidade de ajudar os consumidores a interpretarem um mundo em fluxo. Isso é fundamental para que eles alcancem a sabedoria, o equilíbrio e a confiança.
O Otimismo Cético será impulsionado por três emoções centrais: o encanto diante do potencial das novas tecnologias; o medo das consequências não intencionais; e a desilusão resultante de expectativas não atendidas e decepções anteriores. Assim, segundo a WGNS, conforme 2027 se aproxima, os consumidores desenvolverão uma relação complexa com a tecnologia. Essa relação poderá oscilar entre entusiasmo e cautela. Ao mesmo tempo, a combinação emocional abrirá caminho para um futuro pautado pela sabedoria, pela busca de equilíbrio e por uma confiança mais consciente nas interações com o universo tecnológico.
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