O Conselho Diretor da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) revogou vários dispositivos do Regulamento Geral de Direitos do Consumidor de Serviços de Telecomunicações (RGC). Importante destacar que a vigência do RGC está programada para setembro de 2025. As empresas Claro, Oi, TIM e Vivo fizeram questionamentos que levaram às alterações. Elas se deram em uma reunião do Conselho Diretor na autarquia.
As operadoras alegaram que algumas cláusulas do regulamento eram restritivas. Ademais, tais cláusulas poderiam inviabilizar a oferta de serviços de forma competitiva. A Anatel, ao avaliar essas alegações, decidiu revisar pontos que poderiam estar prejudicando não apenas a operação das empresas, mas também o consumidor. O objetivo é buscar um equilíbrio entre liberdade econômica e regulação.
Cláusulas suprimidas pelas Anatel
Entre os dispositivos anulados, destaque para:
- A eliminação da regra que impedia as operadoras de cobrarem por serviços durante a suspensão por inadimplência;
- Remoção da norma que proibia alterações nas características, como preço, durante a vigência das ofertas.
Ademais, na reunião, ficou decidido que as regras sobre a migração automática de planos seriam flexibilizadas. Outra coisa: a Anatel estendeu as datas-bases aplicadas para o reajuste das ofertas de telecomunicações e a relação das operadoras com canais terceirizados.
No que diz respeito à cobrança por serviços durante a suspensão devido à inadimplência dos clientes, o artigo anulado proibia a cobrança de assinatura ou qualquer outro valor referente à utilização do serviço durante o período de suspensão. Inclusive, esse aspecto foi um dos principais pontos de contestação por operadoras de diversos tamanhos no RGC.
As operadoras argumentavam que a proibição de cobrança durante a suspensão criaria um desincentivo à regularização de pendências financeiras por parte dos consumidores. Além disso, sustentavam que a continuidade dos serviços, mesmo em situações de inadimplência, acarretaria perdas financeiras significativas, ameaçando a sustentabilidade do negócio. A proposta de revogar essa proibição, portanto, visa equilibrar a proteção ao consumidor com a viabilidade econômica das empresas.
Entendendo as normas
De acordo com as regras do RGC, as empresas tinham a obrigação de manter para inadimplentes o recebimento de chamadas e mensagens de texto pelo período de 30 dias após o início da suspensão. Para a Anatel, essa norma interferia indevidamente no modelo de negócios das empresas ao impor a prestação de serviços gratuitos – motivo que culminou na anulação.
O órgão aprovou a possibilidade de o consumidor continuar utilizando os serviços, mediante cobrança. Para isso, será necessária autorização expressa do consumidor e uma comunicação clara da operadora, a fim de evitar práticas abusivas. Outro detalhe importante é que o RGC preservará a possibilidade de acesso dos inadimplentes a serviços de emergência e ao SAC das operadoras.
No que diz respeito à migração automática de planos, esse torna mais simples a transição de serviços. Por consequência, os consumidores podem escolher opções que melhor atendam suas necessidades, sem burocracias excessivas. A flexibilidade em relação às datas de reajuste pode garantir que os ajustes estejam mais alinhados à realidade do mercado, evitando aumentos abruptos que possam prejudicar o consumo.
Por fim, a relação das operadoras com canais terceirizados poderá se tornar mais eficiente, facilitando a oferta de produtos e serviços em diversas plataformas. Essa mudança deve contribuir para um atendimento mais ágil e acessível ao consumidor, que poderá encontrar soluções de telecomunicações de maneira mais prática.
Ofertas de serviços
A Anatel também anulou trechos do RGC relacionados à oferta de serviços por canais terceirizados, mantendo as exigências contra fraudes e uso indevido de dados pessoais.
Entretanto a reguladora manteve a parte que tratava da vigência de contratos e pagamento de comissões. A proteção da liberdade contratual das prestadoras e seus parceiros baseou a decisão, evitando, por consequência, abusos regulatórios. Nesse sentido, as prestadoras de serviços deverão então adaptar suas operações tendo em mente as novas diretrizes, garantindo que qualquer relação comercial com canais terceirizados esteja em conformidade com as normas estabelecidas. Isso inclui a implementação de políticas rigorosas para a prevenção de fraudes e a gestão adequada dos dados pessoais dos clientes. Esses dois pontos continuam a ser uma prioridade na agenda regulatória.
O que muda para o consumidor?
No que tange à regra que impedia mudanças de preços e características durante a vigência das ofertas, a Anatel entende que o Código de Defesa do Consumidor permite alterações contratuais visando o benefício do consumidor. Dessa forma, a anulação de trechos relacionados à migração automática de ofertas se deu por considerações de que poderiam levar a opções incompatíveis com as necessidades dos assinantes.
A renovação automática de planos foi considerada válida, desde que haja consentimento expresso do consumidor.
Datas-bases
E, por falar em mudança de preço, outro aspecto que sofreu alteração foram as chamadas “datas-bases”. A partir dessas datas, o reajuste das ofertas pode ser realizado. Anteriormente, essas datas seriam fixadas em 12 meses a partir da contratação pelo cliente. Isso, para as operadoras, poderia resultar em uma data-base diferente para cada assinante.
Dessa forma, ficou decidido que a data de contratação deixou de ser utilizada como referência temporal para os reajustes. Com isso, o conceito de oferta foi mais claramente definido pela Anatel com as mudanças. O objetivo foi esclarecer que tal conceito abrange apenas o produto principal de telecomunicações, excluindo produtos e serviços acessórios que costumam ser incluídos pelas operadoras nos planos.
Resumindo, o RGC manterá:
- A possibilidade de rescisão de contratos somente após 60 dias da suspensão dos serviços;
- O novo sistema de registro de ofertas;
- O prazo de 30 dias para a comunicação da extinção de ofertas;
- E as assimetrias regulatórias que asseguram regras mais flexíveis para pequenas prestadoras, algo que gera considerável debate entre as grandes.
Olhar para operadoras e consumidores
A decisão da Anatel segue a tendência de flexibilizar algumas normas para permitir maior liberdade às empresas de telecomunicações, enquanto ainda mantém o foco na proteção dos direitos do consumidor. A Agência busca praticar um diálogo contínuo com as operadoras e a sociedade civil para garantir que as futuras regulamentações estejam alinhadas com as necessidades e expectativas dos usuários.
A expectativa é que com essas modificações, o mercado se torne mais dinâmico e competitivo, beneficiando tanto as operadoras quanto os usuários dos serviços. Quem explica melhor é o conselheiro diretor Alexandre Freire, que apresentou o voto-vista na reunião do Conselho Diretor da Agência Nacional de Telecomunicações, no dia 5 de dezembro de 2024: “O equilíbrio entre a segurança jurídica e a proteção dos direitos dos consumidores é o ponto central desta decisão. Nosso objetivo é garantir que as regulamentações sejam justas e transparentes, buscando harmonizar os interesses dos envolvidos nas relações de consumo e alinhar a proteção do consumidor com a necessidade de desenvolvimento econômico e tecnológico, conforme estabelecido no Código de Defesa do Consumidor”.
A decisão demonstra o compromisso da Anatel com a transparência, integridade e proteção dos direitos dos consumidores, ao mesmo tempo em que procura equilibrar a regulamentação com a liberdade contratual das prestadoras de serviços de telecomunicações.
Dispositivos anulados
O Regulamento Geral de Direitos do Consumidor de Serviços de Telecomunicações (RGC) foi aprovado pela Resolução nº 765, de 6 de novembro de 2023.
Dentre os artigos anulados, conforme voto-vista do conselheiro diretor da Anatel, Alexandre Freire, mencionam-se os seguintes:
- art. 23, relativo à proibição de alteração de características de ofertas durante sua vigência;
- art. 31, § 2º, que dispõe sobre a migração automática de consumidores;
- art. 34, § 2º, que trata das relações entre prestadoras e parceiros comerciais;
- art. 39, caput e §1º, que dispõem sobre a aplicação da data-base; e
- art. 74, que regulamentou a proibição de cobrança de serviços durante a suspensão por inadimplência.