Na última semana, criou-se uma polêmica envolvendo a prefeitura do município paulista de Cotia e uma fabricante da aparelhos para ventilação pulmonar. A administração da cidade confiscou 35 ventiladores pulmonares, o que causou alvoroço nas redes sociais, em especial dentro de alguns grupos no WhatsApp.
No caso, o poder público se utilizou de um dispositivo legal: a requisição administrativa. O inciso XXV do Artigo 5° da Constituição Federal prevê:
(…) no caso de iminente perigo público, a autoridade competente poderá usar de propriedade particular, assegurada ao proprietário indenização ulterior, se houver dano;
O portal O Consumerista explica o ordenamento jurídico de maneira mais simples: “O poder público entra em uma loja ou indústria, apreende produtos como álcool gel e máscaras, e promete pagar pela mercadoria no futuro”.
Como o varejo pode ser afetado?
Se você, varejista, se pergunta se sua loja pode ter produtos confiscados pelo poder público hoje ou nas próximas semanas, a resposta é: sim.
Apesar de afirmativa, a resposta não é tão simples. A lei dá esse poder para a administração pública em caso de “iminente perigo público”, critério que a pandemia do novo coronavírus satisfaz sem grandes discussões.
Todo tipo de bem — móvel ou imóvel — poderá ser requisitado. Os bens deverão ser usados no combate à ameaça em questão. Portanto, é pouco provável que o varejo alimentar seja impactado com uma medida do gênero. O varejo farmacêutico, por outro lado, tem mais chances de ter produtos confiscados pelo poder público.
Paulo Igor, assessor jurídico da FecomercioSP, explica que a requisição administrativa é autoaplicável, “isto é, independerá de autorização do Poder Judiciário para sua realização, podem a Administração Pública utilizar-se de força policial para cumprimento da requisição, se for o caso”.
O setor da saúde, em especial, já se queixa da medida, como mostra O Consumerista nesta matéria:
O atual temor de empresários da saúde: a requisição administrativa
A NOVAREJO fez cinco perguntas a Paulo Igor que podem ajudar os varejistas a entender melhor o possível impacto da requisição administrativa em seus negócios:
NOVAREJO: Quais órgãos podem usar da prerrogativa da requisição administrativa?
Paulo Igor: Caberá à Administração Pública, em seus mais variados âmbitos e esferas, a realização da requisição administrativa.
NV: Todo tipo de produto pode ser requisitado?
PI: Sim. Todos os bens, sejam eles imóveis ou móveis, entendidos como necessários pela Administração Pública para o combate ao perigo iminente.
NV: Quem pagará por esses produtos e em quanto tempo?
PI: Pela própria disposição constitucional, caberá à Administração Pública que utilizou-se dos bens em questão, os quais impossíveis de restituição, efetivar a indenização respectiva, não havendo prazo pré-determinado para tal pagamento.
A Administração Pública deve iniciar o processo de ressarcimento do ano ao particular e, em não fazendo, deverá o particular provocá-la para reaver os prejuízos.
NV: Será pago preço de custo ou preço de varejo pelos produtos requisitados?
PI: Não há menção direta sobre os critérios para o ressarcimento. Comparando requisição administrativa e desapropriação, nesta última, o comando constitucional prevê “justa indenização”, que corresponde ao valor efetivo do bem, a fim de afastar o prejuízo do proprietário. Tal métrica, ao ver da FecomercioSP, deverá ser também utilizada para os casos de indenização por requisição administrativa.
NV: Qual a diferença entre requisição administrativa e desapropriação?
PI: A primeira diferença está na urgência da cessação do perigo, seja ele iminente ou consumado, que a requisição exige. Na desapropriação há a perda efetiva da propriedade do bem em favor da autoridade pública, que fará jus à indenização justa antes da transferência da propriedade ao requerente. No caso da requisição administrativa, não há transferência de propriedade, mas sim a utilização por determinado período.
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