Os números são superlativos em todos os sentidos: mais de 700 palestras em vários palcos simultâneos, 1.500 startups expondo soluções, 850 investidores e 42.000 participantes reunidos por quatro dias em Lisboa. Esse é o Web Summit, o maior evento de startups do mundo que ocorreu em Portugal no início de novembro. Criado em Dublin em 2009, o evento assinou em 2018 um acordo com o governo de Portugal para acontecer na capital por pelo menos uma década, até 2028.
O Web Summit é tão importante no país que o prefeito da cidade, Carlos Moedas, o ministro da economia de Portugal, Pedro Siza Vieira e até o presidente do país, Marcelo Rebelo de Sousa, estiveram no palco do evento. O organizador do evento, Paddy Cosgrave, tem status de celebridade no país lusitano e portas abertas em todos os cantos da capital.
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Quatro pavilhões e um estádio coberto
O evento abriu na segunda-feira à tarde, com uma sequência de palestras durante três horas e uma Opening Night em diversos bares e restaurantes. A feira em si ocorre durante os três dias seguintes, dividida entre os quatro pavilhões da Feira Internacional de Lisboa e o estádio coberto Altice Arena, com capacidade para 12.500 pessoas sentadas.
Ao longo dos pavilhões, micro-estandes de um metro de largura dividem espaço com estandes de diversos países, empresas de tecnologia e palcos dos mais variados tamanhos, com palestras de 20 minutos que ocorrem uma na sequência da outra, pitchs de startups em busca de investimentos e gente andando para todos os lados o tempo todo.
As filas também estão por todos os lados: uma hora no credenciamento, filas para comer, para pegar café e para entrar e sair do Altice Arena, onde fica o palco principal. Mas nada disso impede que as pessoas estejam animadas e em busca de ideias, contatos e reuniões, que podem ser marcadas pelo App do evento ou diretamente nos estandes. É preciso disposição para dar conta de tanta informação.
Ao longo dos dias do evento, vi e conversei com muita gente. Destaco abaixo as principais tendências observadas no Web Summit 2021:
ESG
Um dos pavilhões era praticamente todo dedicado a dois temas muito discutidos em 2021: ESG e Sustentabilidade.
Na área reservada às startups ESG, há um pouco de tudo: plataformas de negociação de créditos de carbono, equipamentos de filtragem do ar, tecnologias de reciclagem, produção de energia limpa e economia circular com soluções diferentes para problemas, como a gestão de resíduos tecnológicos, resíduos químicos e de baterias, entre outros.
O tema da energia elétrica apareceu com força e recebeu incentivos de várias empresas, entre elas o destaque foi a EDP (Energias de Portugal), que ofereceu incentivos a startups com tecnologias inovadoras em energias renováveis. Com a crescente demanda mundial por computadores, carros elétricos e data centers, a corrida energética está acelerando.
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Qualidade do ar e tecnologias anti-doenças
Em plena pandemia, tecnologias de limpeza e desinfecção apareceram aos montes. Desde foco em salas de aula até aeroportos, diferentes tipos de tecnologia de filtragem e limpeza apelavam para a saúde e afirmavam atuar contra o COVID, a influenza e o H1N1.
Real-Time Data
Na era do imediatismo, tecnologias de monitoramento e visualização de dados em tempo real que permitem monitorar qualquer coisa: de ataques cibernéticos ao trânsito nas metrópoles. Todos os formatos de gráficos imagináveis, aplicativos e softwares utilizando Inteligência Artificial para detectar padrões e mostrar o que está acontecendo a cada instante.
Junto com o Real-Time Data, tecnologias de Data Visualization (Visualização de Dados) permitiam escolher como analisar cada conjunto de dados para entendê-los melhor e mais rapidamente.
IA aplicada a tudo
Falando em Inteligência Artificial, a sigla AI (Artificial Intelligence) aparecia em todos os lugares: plataformas conectadas à webcams para monitorar expressões faciais, sistemas de avaliação de vídeos baseados em micro expressões, plataformas que simulam pessoas reais realizando tarefas online, tudo baseado em Inteligência Artificial e Machine Learning, com a promessa de que os sistemas aprenderão a encontrar padrões e reconhecer se estamos gostando ou não de alguma coisa, se estamos prestando atenção ou se estamos distraídos.
Até um robô concierge que cumprimentava os passantes e servia de guia estava por lá, informando onde encontrar cada coisa e como chegar a cada pavilhão.
Subscription Everything
Depois do vídeo por streaming, da música por assinatura, de celulares por assinatura e até de carros e apartamentos por assinatura, agora o modelo de negócios se expande para todas as áreas. Tudo que puder ser transformado em um serviço será oferecido dessa forma. A tendência começou a ganhar relevância em 2015 e tem crescido ano após ano desde então. É a era do “Everything as a Service“.
Vi e ouvi falar de serviços de compartilhamento de propriedades, de carros de luxo, de imóveis de temporada e de moradia, equipamentos de alta tecnologia e tudo que precisa ser usado por alguém, mas não necessariamente adquirido para sempre.
O movimento da economia compartilhada encontra cada vez mais adeptos e mais mercados para explorar. O desafio de muitas startups ali era encontrar financiamento para poder gerenciar os bens e alcançar uma escala economicamente viável para suas ideias.
Trabalho Remoto 2.0
Ao longo dos quase dois anos de pandemia houve tempo suficiente para nos acostumarmos ao trabalho remoto e nos adaptarmos a ele, e agora surgem ferramentas para levá-lo a um novo nível. Sistemas de colaboração, de gestão, de interação e de co-autoria estão prometendo aquilo que nunca se acreditou possível até a pandemia se tornar uma realidade global: mais produtividade, menores custos e mais qualidade de vida para os trabalhadores.
Agora, com a pandemia mais controlada e a provável adoção do trabalho híbrido (parte no escritório e parte em casa), essas ferramentas prometem entregar o melhor dos dois mundos: produtividade, mensurabilidade e segurança de dados.
Reconhecimento de voz e de face
Tecnologias de reconhecimento de voz e de face também estiveram presentes em mais usos e integrações. Reconhecimento de padrões de comportamento, de eventos de stress e tecnologias para evitar a fadiga também estavam presentes. De um lado, aplicativos para meditação e relaxamento, de outro, formas de prevenir o burnout e o esgotamento por realizar múltiplas tarefas o tempo todo, sempre no mesmo ambiente e sem intervalos para descanso.
A pandemia trouxe novos desafios para o mundo corporativo e várias startups estão tentando melhorar a qualidade de vida das pessoas, reconhecendo padrões de voz, de expressões faciais e de comportamento.
Feedback, Suporte e Pesquisa
Por fim, uma última tendência forte é a criação de ferramentas de interação para medir e monitorar a experiência do cliente. Sistemas integrados de atendimento online, plataformas de feedback, recursos interativos de pesquisa de experiência e coleta de dados de satisfação dos clientes foram um destaque especial.
Em um mundo ultra competitivo no qual o poder está nas mãos dos clientes, dezenas de plataformas prometiam ajudar a tornar a vida deles mais fácil e deixá-los mais felizes.
Muitos debates com a cara do mercado Europeu
Quando se pensa no mercado europeu, a primeira coisa que vem à mente é a forte regulação e a seriedade com que LGPD, privacidade e o poder das BigTechs são tratados. Em um dos debates no palco principal, Pascal Saint-Amans, Diretor da OECD (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico) para Impostos e Taxações, afirmou que “o próximo grande projeto é taxar o carbono” para que a Europa e o mundo caminhem na direção de uma economia verde e reduza as emissões de carbono.
Saint-Amans também defende uma taxa comum de impostos de 15% em toda a Europa como forma de resolver a fuga de impostos de BigTechs e Multinacionais que usam subterfúgios legais para pagar taxas muito mais baixas que a maioria das empresas: “Se as empresas não pagam impostos, quem paga? Os outros contribuintes”.
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Discussões sobre uso de dados e privacidade
Frances Haugen, ex-funcionária do Facebook que acusou a empresa de dar prioridade aos lucros em detrimento da tomada de medidas para combater o discurso de ódio e desinformação na rede social, abriu o evento com falas fortes: “O Facebook não irá regulamentar a si próprio”.
Haugen afirmou que a empresa precisa de um novo CEO, focado em segurança, o que definitivamente não é a preocupação de Mark Zuckerberg : “As redes sociais precisam ser obrigadas a ter transparência e responsabilidade por seus atos”.
Na última fala no palco principal, antes do encerramento conduzido pelo simpático e sorridente Marcelo Rebelo de Sousa, presidente de Portugal, o criador da World Wide Web (WWW), Tim-Berners Lee, ressaltou que precisamos de uma nova versão da internet: “A privacidade é um dos direitos fundamentais e devemos lutar por ela”.
Mudança no mundo de Venture Capital
Com a crise econômica global e a estagnação ou recessão em muitos mercados, há muito dinheiro disponível para investimentos em startups, novas tecnologias e modelos de negócios. Doug Leone, da Sequoia Capital, afirmou em um painel de discussão que seu fundo está passando por uma grande reestruturação, uma mudança inédita no mundo de venture capital: “O que permitiu que a gente fizesse esse movimento foi o fato de que temos parceiros que são, em sua maioria, instituições que não visam lucro, como as fundações de Harvard, MIT e Stanford.”
A mudança na Sequoia deve puxar a fila de outros fundos também, liderando uma transformação no mercado de investimentos: “Não estamos mais presos ao ciclo de 10 anos do venture capital. Agora, podemos ficar com as empresas, sem vender nossas ações, por 25 anos ou mais.”
Enquanto o mercado de venture capital assiste a ciclos de investimentos cada vez maiores, a discussão também foi levantada por Rodrigo Baer, do SoftBank: “Acredito que estamos super financiando as empresas em um estágio muito inicial e ao colocar mais dinheiro, estamos colocando maior risco na mão dos empreendedores”.
A discussão ocorreu num painel coordenado pela FM/Derraik, escritório jurídico brasileiro especializado em investimentos em startups.
Ecossistema disputado
No rastro do ecossistema de tecnologia e inovação, Ibaneis Rocha, governador do Distrito Federal, esteve no evento para negociar a vinda do Web Summit para o Brasil, em Brasília. Também estão na disputa o Rio de Janeiro e Porto Alegre, de olho na movimentação de pessoas, empresas e investimentos. O organizador Paddy Cosgrave veio ao Brasil em novembro para conhecer as cidades e fechar a negociação.
Será que teremos uma edição brasileira do Web Summit? Agora é esperar para ver em 2022!
*Por Rafael Rez, Diretor de Marketing da Web Estratégica
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