O prazo para efetuar compras sem a referida “taxa das blusinhas” está se aproximando do fim. Isso porque o novo imposto de importação será aplicado sobre aquisições internacionais de até US$ 50. Segundo o texto da Medida Provisória (MP) n.º 1.236/2024, as novas regras tributárias devem entrar em vigor a partir de 1° de agosto. Contudo, um intervalo no registro da Declaração de Importação de Remessas (DIR) pode antecipar essa data.
As novas diretrizes estipulam que todas as compras internacionais com valor até US$ 50 serão taxadas, o que pode impactar significativamente o comportamento dos consumidores e o comércio eletrônico. A expectativa do governo é aumentar a arrecadação tributária, o que, por sua vez, pode gerar recursos adicionais para investimentos em infraestrutura e serviços públicos.
É importante que os consumidores fiquem atentos às possíveis mudanças nos preços dos produtos importados, uma vez que a inclusão da taxa pode alterar a competitividade entre produtos nacionais e importados. Os comerciantes também devem se preparar para informar seus clientes sobre essas alterações e adequar suas estratégias de vendas.
Além disso, o novo imposto pode gerar uma onda de questionamentos sobre a regularidade das importações e sobre como o consumidor poderá acessar informações claras e precisas sobre suas compras.
Declaração
Geralmente, há um intervalo de tempo entre a compra feita pelo consumidor e o registro da operação pela empresa na Declaração de Importação de Remessa (DIR). Esse documento abrange informações sobre o pedido, óbvio, mas também sobre o remetente, o destinatário e a forma de tributação do produto.
Segundo a Receita Federal, a DIR deve ser registrada em até 72 horas pelas empresas de courier (companhias responsáveis pelo transporte de mercadorias internacionais até o comprador). Neste sentido, dado que pode haver alguns dias de diferença entre a compra e o registro da DIR, consumidores correm o risco de ter seus produtos tributados, mesmo que tenham sido adquiridos antes do dia 1° de agosto.
Taxação no sábado, 27
A decisão de antecipar a taxação foi tomada pelas empresas envolvidas. No caso da AliExpress, essa antecipação ocorrerá em razão do tempo necessário para os ajustes na Declaração de Importação de Remessas (DIR).
Em comunicado, a empresa informou que a cobrança será divulgada aos clientes e parceiros por meio dos canais oficiais do e-commerce ao longo das etapas de compra.
A Shein declarou que irá cumprir rigorosamente a legislação.
A lei, que ficou conhecida como “taxa das blusinhas”, estabelecida no final de junho deste ano, determina que as compras de até US$ 50 estarão sujeitas a uma taxa de 20% de Imposto de Importação, além do ICMS cobrado pelos estados. Por outro lado, os produtos que custam entre US$ 50 e US$ 3.000 continuarão a ser tributados em 60% de Imposto de Importação.
Importante destacar que a norma determina a entrada em vigor da nova alíquota do imposto de importação a partir das 0h do dia 1º de agosto, durante o processo de registro da declaração de importação junto à Aduana. Entretanto, a empresa esclarece que, na prática, as compras realizadas até dois ou três dias antes dessa data poderão ser sujeitas ao novo imposto de importação, uma vez que há um intervalo entre o momento da aquisição e a declaração à Aduana.
Murillo Torelli, professor de Ciências Contábeis do Centro de Ciências Sociais e Aplicadas (CCSA) da Universidade Presbiteriana Mackenzie, comenta o reflexo da legislação para o consumidor final: “a nova taxa de 20% sobre compras internacionais de até US$ 50 resulta em uma carga tributária total de 44,5%, considerando o ICMS atual de 17% somado ao imposto de importação (20%)”.
Imposto por dentro
Segundo ele, o cálculo, que parece distorcido, em que 20% + 17% geram um total de 44,5%, é resultado do artifício matemático conhecido como “imposto por dentro”. Essa é uma estratégia fiscal brasileira que eleva a alíquota efetiva.
Murillo Torelli então garante que, com a introdução da nova taxa, o preço das compras internacionais aumentará consideravelmente. Por exemplo, uma blusa que custa US$ 30, que atualmente tributa apenas com o ICMS de 17%, aumentará para US$ 36,15.
“Mas, agora vem o pior: com a nova taxa de importação, o preço da blusa subirá ainda mais, chegando a US$ 43,38. Considerando um câmbio de R$ 5,60, os preços em reais ficariam R$ 168,00 sem tributos, R$ 202,45 com ICMS e R$ 242,93 com ICMS e a nova taxa federal”, explica Murillo. Assim, os tributos adicionam quase R$ 75,00 ao preço de um produto de 30 dólares. A decisão trará um impacto considerável no orçamento das famílias de baixa renda, que se acostumavam a adquirir itens a preços mais acessíveis.
Preocupação
Analisando com profundidade o cenário fiscal do país no consumo, o professor considera “preocupante” o fato de o governo optar por implementar essa nova penalização, especialmente em um período de crise econômica, em que as classes mais vulneráveis já enfrentam o aumento do custo de vida.
“A ‘taxa das blusinhas’ é apenas mais um exemplo de como os governantes parecem distantes da realidade da população. Em vez de buscar soluções que estimulem o consumo, o crescimento econômico e a criação de empregos, as autoridades preferem aumentar impostos de forma indiscriminada. Os mais necessitados serão os mais prejudicados”, analisa Murillo.
Ademais, o especialista especifica que o Brasil demanda urgentemente uma reforma tributária justa, capaz de aliviar a carga sobre os mais pobres e incentivar a produção e o consumo. “No entanto, o atual governo parece focado em aumentar a arrecadação às custas do trabalhador. Chegou o momento de repensar essas políticas e buscar alternativas que realmente beneficiem a população em geral, e não apenas os interesses de uma minoria”.
Legislação
A Lei n.º 14.902, publicada no Diário Oficial da União de 28 de junho de 2024, é a responsável por incluir a taxa de importação de 20% para compras internacionais de até US$ 50. Mas engana-se quem pensa que é só.
A legislação também estabelece o Programa Mobilidade Verde e Inovação (Mover). O objetivo é fomentar a pesquisa e o desenvolvimento de soluções tecnológicas sustentáveis e a produção de veículos de baixa emissão de gases do efeito estufa.
Ademais, a normativa propõe incentivos financeiros de R$ 19,3 bilhões ao longo de cinco anos e a redução do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI).
O impacto da lei
“A primeira vista, embora essa medida proteja a indústria nacional, na verdade, ela esconde uma série de interesses opostos que ameaçam a integridade do nosso sistema econômico”. A afirmação é de Faustino da Rosa Junior, advogado especializado em direito digital.
Em suma, o especialista lembra que a taxa das blusinhas foi uma manobra política conhecida como “jabuti”.
A Câmara dos Deputados introduziu a taxação e a aprovou em abril. Isso se deu após um acordo entre o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e o presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva. Contudo, durante a tramitação no Senado, o relator excluiu parte do texto. Assim sendo, houve uma tensão política que resultou na apresentação de um destaque pelas lideranças do governo. E a taxa das blusinhas teve votação separada.
“O que estamos testemunhando é um jogo de poder que ignora as reais necessidades dos cidadãos brasileiros, especialmente os mais pobres”, comenta o Dr. Faustino.
Durante a tramitação no Senado, o projeto do Mover passou por novas modificações, incluindo a remoção de dois “jabutis” pelo relator. Em primeiro lugar, estava o jabuti, que abordava regras de conteúdo local para a indústria de petróleo e gás. Em segundo lugar, outro oferecia incentivos fiscais para a fabricação de bicicletas. Com essas alterações, a Câmara dos Deputados precisou analisar novamente o texto.
“A elevação dos impostos sobre compras internacionais responde a uma demanda antiga dos empresários brasileiros. Esse público, de forma paradoxal, critica a concorrência dos produtos chineses. Entretanto, ao mesmo tempo, eles mesmos revendem esses mesmos produtos a preços elevados”, comenta o Dr. Faustino.
Desestímulo
A decisão do governo desestimula o investimento internacional no país. “Por consequência, isso fará com que o Brasil tenha uma das maiores alíquotas para compras internacionais do mundo,” adverte o Dr. Faustino.
Os varejistas também expressam preocupação com os efeitos da entrada da TEMU, o maior marketplace do mundo, no Brasil. “A hipocrisia antidemocrática vai além das mudanças e da má-fé dos grandes varejistas nacionais, que buscam monopolizar o consumo”, comenta Faustino. O limite de compras no exterior é de US$ 1.000, enquanto os mais pobres terão que pagar impostos sobre compras de até cinquenta dólares.
“O governo e os empresários deveriam trabalhar para criar um ambiente favorável à reindustrialização nacional. O melhor a ser feito seria deixar esse cenário em condições competitivas com o mercado internacional. Mas, não: o preferível foi a implantação de um protecionismo antidemocrático do consumo”, conclui o Dr. Faustino.
Leia, na íntegra, a Medida Provisória que trata da Taxa das Blusinhas clicando nesse link.