Quando falamos sobre “o futuro do trabalho“, pensamos em robôs e realidades imersivas. Mas pensamos também em home office, em qualidade de vida, em burnout e em ambientes tóxicos e na necessidade de inclusão. Um assunto sob medida para o SXSW 2023.
No painel sobre “Futuro do trabalho”, a editora-sênior da Fortune, Ellen McGirt, e o CEO da Indeed, Chris Hyams, falaram sobre um elenco de forças transformadoras que se alinham para modificar nossas percepções sobre produção, ocupação e valor.
Estamos diante de um ChatGPT e seu impacto na indústria criativa, sobre veículos veículos autônomos e ainda sobre os efeitos mais permanentes da pandemia, como inflação, recessão e e da grande insatisfação com os rumos profissionais, que levou ao processo de “grande demissão”.
Logo, o “futuro do trabalho” é, na verdade, um reflexão sobre o hoje. Como adeptos de tecnologia, ignoramos as perturbações das disrupções e tendemos a ver apenas o lado negativo dessa evolução, sem ponderar os ganhos em termos de valor e criação de atividades libertadoras do espírito humano.
Podemos pensar que muitos serão marginalizados, mas, também poderemos resgatar esses “excluídos” da revolução digital e, logicamente, estimular uma nova equidade e um novo modelo de trabalho mais humanizado e inteligente.
Chris Hyams dedica-se trabalho a entender e ressignificar o trabalho. Ele conta que nosso smartphone assumiu o trabalho e as atividades de 15 outros aparelhos, do walkman ao telefone, da TV às secretárias eletrônicas. Sua abordagem é a de destruição significativa de empregos a partir da digitalização, mas é curioso, pois as taxas de contratação não diminuíram da década de 90 para cá, ao contrário, mais e mais pessoas trabalham hoje do que há 30 anos.
Hyams acredita que a indústria de software tem o poder de “uma arma” criada por Oppenheimer, o que é claramente um exagero. Ellen McGirt, por sua vez, questiona quais as consequências dessa mudança nos formatos de trabalho considerando um ecossistema que hoje engloba investidores, desenvolvedores, bancos e universidades.
Chris também destaca como o segmento de saúde, com uso intenso de ferramentas digitais, enfrenta novas questões éticas, a partir de seu juramento de proteger a vida, acumulando dados e enfrentando problemas de privacidade com o uso desses mesmos dados.
Chris defende que há uma “obrigação coletiva” de educar as pessoas sobre o uso das tecnologias. Sobre como elas podem ser moldadas para reproduzir preconceitos, enfatizando mais faces associadas a uma norma de pessoas brancas com determinados padrões de beleza. Ou seja, as novas tecnologias demandam um olhar mais cuidadoso dos desenvolvedores para evitar que reproduzam os vícios e vieses humanos.
Uma comunidade trabalhadores e empresas
“Onde você enxerga um traficante, eu posso ver um empreendedor, que entende de logística, distribuição, preço e customização”, comenta Chris Hyams. Sua perspectiva é a de como criar oportunidades a partir de visões mais amplas de beleza, de serviço e de transporte. Até que ponto não estamos sendo reducionistas sobre as possibilidades e formatos de trabalho?
Há mais de 350 milhões de pessoas procurando por um novo emprego ou por uma ocupação. À frente da Indeed, Chris constrói oportunidades para pessoas cadastradas, procurando criar conexões reais entre empresas e potenciais empregados. A ideia é fazer com que as partes colaborem. Durante a pandemia, em 2020, o número de entrevistas realizadas entre empresas e candidatos aumentou 1600%, evidentemente utilizando plataformas de vídeo. A Indeed quer funcionar como uma comunidade que harmoniza as relações entre empresas e trabalhadores.
O mundo do trabalho está de cabeça para baixo, porque os candidatos estão a procura de empregos diferentes, capaz de conciliar uma vida pessoal atribulada e atividades profissionais
Claro, a Indeed nasceu a partir da constatação de que o trabalho está mudando. “O mundo do trabalho está de cabeça para baixo, porque os candidatos estão a procura de empregos diferentes, capaz de conciliar uma vida pessoal atribulada e atividades profissionais. Existem circunstâncias extremas e desconfortáveis, impossibilidades e que limitam a capacidade das pessoas trabalharem de forma produtiva”, afirma Chris.
Mais de um milhão de pessoas pediu demissão das indústrias e não voltarão a essas empresas. As relações entre empresas e colaboradores são assimétricas e, exatamente por isso, há uma grande movimentação de pessoas em busca de novas oportunidades e perspectivas.
E qual o alcance das IAs nesse panorama atual do trabalho? Estamos vivendo em sociedades que falham em prever e planejar o futuro próximo. Se os veículos autônomos realmente ganharem as ruas, não serão apenas os motoristas que poderão perder seus empregos, toda a indústria de seguros poderá ser afetada. O risco de colisões será dramaticamente reduzido e o seguro, contratado on-line, em tempo real, será de acordo com a complexidade de um trajeto. E quais os filósofos e lideranças que estão pensando no futuro do trabalho diante de tal impacto provocado pelas IAs?
Os desafios de mudança de mentalidade
É possível trazer as organizações para pensar e desenvolver novos formatos de trabalho que sejam sustentáveis, abertos e motivadores da curiosidade? Como podemos trabalhar para mudar uma mentalidade refratária a um trabalho mais colaborativo, equilibrado e que seja capaz de gerar valor compartilhado?
A questão levantada por Ellen pede basicamente uma resposta baseada em testes e uma atitude orientada a design. “É necessário medir constantemente os resultados dos testes -, muitos testes que envolvam novas formas de organizar e distribuir trabalho. A natureza do trabalho não muda sem testes e sem o apoio da liderança para que essa exploração curiosa produza resultados”, diz.
Sim, adaptar culturas consolidadas acerca de trabalhadores remotos, redução de pressões desmedidas, empatia e transparência não é exatamente uma tarefa cotidiana ou rotineira. É um desafio, que pressupõe engajamento da liderança e apoio à uma nova cultura baseada em colaboração e cocriação.
Negar ou limitar o uso da tecnologia é simplesmente negar às pessoas novas possibilidades de trabalho mais rápido e gratificante
Evidentemente falamos de um “redesign” de culturas, que reduza a influência de vieses na definição de processos, contratações baseadas em estereótipos e que priorize diversidade de ideias, conversas e escuta ativa.
Enfim, o trabalho está mudando e é necessário encarar essa experiência tendo em mente a perenidade das empresas e o valor que ela pode gerar a partir de uma organização de atividades mais racional e menos opressiva.
Ainda há muito trabalho pela frente e será necessário utilizar todo talento humano para desenharmos uma sociedade na qual médicos, advogados, engenheiros e publicitários utilizem Inteligências Artificiais de modo que traga mais benefícios para as sociedades de maneira geral. Negar ou limitar o uso da tecnologia é simplesmente negar às pessoas novas possibilidades de trabalho mais rápido e gratificante.
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