Ele atirava em cães, tirava doces de crianças, desprezava mulheres, urinava em garrafas que atirava na rua, buzinava para velhinhas atravessarem a rua rapidamente. Era uma pessoa desprovida de qualquer tolerância e desrespeitava qualquer convenção. Sob qualquer ângulo, este homem era desprezível. Não, não estou falando de Donald Trump, mas de Coleman Sweeney. Um homem que viveu uma vida medíocre e ainda assim conquistou corações e mentes. Essa história inusitada e surpreendente foi contada no Cannes Lions no painel: “Eu me apaixonei por um escroto” da Martin Agency.
Mas afinal, qual é a história de Coleman F. Sweeney? Vejam o vídeo a seguir antes de prosseguir a leitura:
O painel no Cannes Lions reuniu Jenny Rooney, Editora da CMO Network da Forbes Media,
Joe Alexander, Chief Creative Officer da Martin Agency, agência responsável pela criação da campanha, David Flemming, CEO da Donate Life, o cliente e Will Speck e Josh Gordon, diretores do filme. A agência e a produtora não cobraram nada pela criação e execução.
Toda a estrutura da campanha baseou-se no contraste que uma figura vil como Sweeney foi em vida, tornar-se um herói após sua morte. Uma ideia corajosa, que investe no cinismo tão próprio da geração millennial, para provocar a discussão. “Se até um idiota como Coleman Sweeney pode doar seus órgãos, por que você tem que pensar diferente?”. A fila de pessoas à espera de órgãos é um problema global, variando levemente em praticamente todos os países.
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Joe Alexander disse que o grande mérito de apostar em uma ideia tão aparentemente ultrajante foi acreditar que ela ajudaria a salvar pessoas. David Flemming hesitou muito e durante meses antes de apresentar a campanha para a instituição: “Joe me disse que a campanha poderia viralizar e ser realmente impactante ou passar despercebida. Mas que o risco era viável, uma vez que iríamos trabalhar na mídia social e não na mídia paga”. Toda a narrativa foi minuciosamente pensada para atingir os homens millennials, notoriamente refratários à publicidade convencional. Por isso, o filme foi veiculado apenas no YouTube e redes sociais. Os resultados da campanha falam por si. O filme gerou inacreditáveis US$ 450 milhões em mídia espontânea e foi visto mais de 80 milhões de vezes em 76 países. Mas o melhor foi a evolução consistente dos registros de doadores na Donate Life: de 149 para 1022 ao dia! Somente entre os homens millennials, o volume aumentou 127%.
“O nosso objetivo era fazer algo poderoso, tendo em vista essa causa particular, e o que fizemos foi um pouco assustador, nos deu no que pensar. Pensamos muito na hora de colocar a palavra ‘asshole’ (‘escroto’, em tradução livre), no filme, mas não havia definição melhor para alguém como Coleman Sweeney”, comentou Joe.
O medo e o receio foram os motivadores. Para Josh, o fato de tantos talentos terem doado seu tempo e recursos criou uma energia diferente do que aquela que haveria se o trabalho fosse pago. “Nós nós ajudamos na produção. Houve momentos em que o David nos ajudava a carregar os equipamentos e tudo isso criou uma forma diferente de dinâmica. E todos atuamos como um só organismo”, destacou. Mas Josh Gordon lembrou que “adora ser pago” (risos na plateia). “Já trabalhamos antes com a Martin e com eles tivemos grandes experiências criativas… O que eu quero dizer é que sendo parceiros de uma agência criativa e inteligente, nós podemos atuar de uma forma colaborativa, aberta e todos na mesa se respeitam”.
Para Joe Alexander, “a grande lição que tivemos desse processo é que acreditar no poder da criatividade traz uma série de escolhas difíceis, de noites sem dormir para assumir um risco… parece um clichê, mas é raro em nosso negócio termos a chance de realmente provocar uma mudança nesse nível”.
Uma ironia final: a Martin Agency tem uma pessoa chamada Coleman F. Sweeney, que é totalmente o oposto do personagem retratado na campanha. A graça foi usar um nome pomposo, meio tradicional, que provavelmente a mãe deu ao filho sem imaginar o que ele se tornaria, contribuiu com a química do filme.
David Flemming finalizou dizendo que muitos criativos e muitos diretores e chefes de marketing o cumprimentaram por ter acreditado na ideia. “Esses caras aqui me deixaram confortável para tomar a decisão correta encarando o medo e não escondendo esse medo. Não há liderança sem medo e eles me encorajaram. Talvez clientes de setores diversos usem essa campanha como exemplo. Claro, é necessário dar a eles todas as informações, dados e estratégia para deixá-los confortáveis para tomar a decisão certa e não a decisão mais popular”.
E assim, Coleman Sweeney, o escroto que viveu 365 dias por ano e 24 horas por dia sendo desprezível, além de ter se tornado um herói ao ser um doador de órgãos quando faleceu, é também um exemplo de como acreditar em uma ideia pode mudar a vida de milhares de pessoas. Um personagem que pode inspirar executivos do mundo inteiro a fazerem a diferença.