A Anatel decidiu recentemente suspender “por tempo indeterminado” a venda de internet por pacotes de dados. No entanto, o Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec) não vê a decisão como solução dos problemas sobre o assunto.
Segundo nota divulgada no site do Idec, a decisão do Conselho Diretor da Anatel foi tomada após as reações e protestos dos consumidores e indica um recuo estratégico da agência.
Para Rafael Zanatta, advogado e pesquisador em telecomunicações do Idec, a estratégia da agência é esfriar o debate que tomou o país. Em duas semanas, as campanhas “Internet Livre”, do Idec, “Internet Sem Limites” (organizada por gamers) e “Internet Justa” (de Youtubers) atingiram mais de 10 milhões de brasileiros. Além da indignação social, a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e os Procons reforçaram a argumentação do Idec na ação judicial contra a franquia de dados e afirmaram que os novos contratos de conexão à internet violam o Código de Defesa do Consumidor e o Marco Civil da Internet.
Ação do Idec
No último dia 14, o Idec entrou com uma Ação Civil Pública contra os maiores provedores de internet do Brasil para barrar a fixação de limite de tráfego de dados nos serviços de banda larga fixa. Segundo o especialista, o Idec viu na mudança a violação de três direitos: o artigo 39 do CDC, o artigo 7 do Marco Civil da Internet e na Lei de Crimes Econômicos (Lei 12,529/ 2011).
“O Código de Defesa do Consumidor proíbe que um fornecedor de serviços eleve sem justa causa o preço de um produto ou serviço. Na prática, anteriormente eles ofereciam aproximadamente internet de 10MB de velocidade e franquia de 300G por R$ 90,00. De forma arbitrária, sem justificativa técnica, passaram a oferecer franquias até 3X menores”, comenta Zanatta.
Para ele, essa é uma questão que, inclusive, não é levada em conta pela Anatel: as empresas não apresentaram nenhum estudo técnico que justifique a mudança na comercialização da internet.
Além de cobrar a exigência de explicações, o Idec defende que qualquer medida da Anatel sobre a franquia de dados na internet fixa deve ser precedida de Análise de Impacto Regulatório, como prevê o regimento interno da própria agência (Art. 62 da Resolução nº 612/2013). “Até o momento, a Anatel não avaliou quais são os grupos afetados pelas franquias de dados, quais as opções regulatórias consideradas e qual é a sua competência para atuar sobre o problema”, diz o advogado do Idec.
O que muda para o consumidor
Se as operadoras de fato mudarem o modelo de cobrança, a internet não mais será contratada por velocidade, mas por dados. “Isso é preocupante porque os consumidores de internet do Brasil estão acostumados a usar recursos intensivos em dados – publicar fotos e vídeos, assistir aulas, vídeos de tutoriais, jogar”, explica Rafael Zanatta. A mudança afeta diretamente esse usuário, que se tornou dependente do recurso internet.
“Pelas nossas pesquisas, em outros lugares do mundo, países com alto consumo, o número chega a ser maior, os planos mais populares preveem pelo menos franquias de 300G. Os mais populares vendidos por aqui, por exemplo, oferecem franquia de 10G”, revela Zanatta.
Por fim, ele toca no um aspecto social dessa mudança. “Do jeito que está sendo implementada, elas vai aprofundar desigualdades existentes. Os mais pobres não terão, por exemplo, acesso a cursos online, não vão desenvolver suas habilidades de programação, eles vão se limitar a uma experiência básica. A Internet nasceu como uma ampla rede cujo grande estimulo é a livre troca de informações”, conclui.