A segmentação por gerações tem sido uma prática comum no marketing, mas o estudo O Fim das Gerações, desenvolvido pela TroianoBranding em parceria com a DEZON, propõe uma abordagem diferente. Em vez de categorizar pessoas por idade, as empresas são convidadas a explorar os valores universais que conectam diferentes públicos, sem rótulos geracionais.
A ideia é que esse movimento, além de promover a inclusão, oferece uma base sólida para aprimorar o Customer Experience (CX) no varejo. “Hoje, se fala o quanto podemos ser tantas coisas. É como se a forma como as pessoas enxergam geração, até então, nos encaixotassem mais do que nos libertasse”, comenta Cecília Troiano, CEO da TroianoBranding.
O estudo mostra que usamos o marcador de gerações como uma caracterização definitiva do consumidor, o que por sua vez define o modo de ser de um indivíduo. Porém, atualmente, as pessoas são mais flexíveis do que isso: é possível um GenZ se identificar como um Millennial, ou uma pessoa da Geração X ter valores em comum com um Boomer, por exemplo. Ou seja, você pode ser de uma geração, e agir como outra. Diante disso, é necessária uma nova camada de leitura.
“Com cada vez mais encontros entre gerações, vamos também ver nichos em comum, por mais que não acreditamos ter tanta conexão”, frisa Iza Dezon, CEO da consultoria Dezon. “Gosto de lembrar que não porque é tendência que é para toda marca, ou para todo consumidor. Existe um trabalho de curadoria que precisa acontecer dentro da empresa para que conecte e direcione com quem ela quer falar. Quando saímos da geração, acabamos unindo as pessoas por seus hábitos”, acrescenta.
O desafio de romper com rótulos
O estudo parte de uma premissa fundamental: os marcadores geracionais não conseguem capturar as nuances das pessoas. Realizado com 1.000 participantes em todo o Brasil, combinando metodologia qualitativa e quantitativa, ele identifica que o comportamento do consumidor é mais influenciado por experiências de vida e valores do que por pertencimento a uma geração específica.
“O que propomos é olhar para esses consumidores por um estilo de vida. Esse estilo de vida, muitas vezes, vai atravessar gerações, porque temos essa tendência, com essa sociedade cada vez mais intergeracional”, pontua Iza.
Dessa forma, a Geração Z e os Baby Boomers, por exemplo, podem compartilhar aspirações semelhantes em temas como identidade e comunidade. As empresas que focam apenas nas diferenças geracionais correm o risco de perder oportunidades de criar conexões mais profundas com seus clientes.
“O primeiro ponto para não errar ao dividir os consumidores por gerações é conhecer pessoas, mas verdadeiramente. Essa compreensão de pessoas vai muito além de usar o termo ‘consumidor’, mas é conhecer gente, saber do que gostam”, reforça Cecília.
Os cinco temas estruturantes: a base do CX
Para ajudar as marcas a navegarem nesse cenário, o estudo apresenta cinco temas estruturantes que transcendem gerações. A primeira delas é a Identidade. A busca por autenticidade é universal. Consumidores querem se ver refletidos nas marcas que escolhem. Em seguida aparecem os Laços Afetivos, que são conexões baseadas em confiança e carinho que são valorizadas por todos.
O terceiro tema é chamado de Comunidade. Seja para construir novas conexões ou recuperar vínculos perdidos, o senso de pertencimento é essencial. Depois, o estudo apresenta o Crescimento, que diz respeito ao desejo de evoluir, aprender e alcançar novas realizações é compartilhado por todas as idades. Por último, aparece o Bem-Estar, como a busca por equilíbrio e momentos de tranquilidade ressoa em diferentes públicos.
“Se as marcas baterem apenas na tecla da geração, elas não vão conseguir essa inspiração, exatamente por essas múltiplas formas de ser dentro de uma geração”, reforça Cecília.
Esses pilares devem ser a base de qualquer estratégia de CX. Em vez de segmentar consumidores, as marcas precisam entender suas necessidades emocionais e aspirações. São temas estruturantes, e neles temos um encontro das gerações. Esses temas são universais, atemporais, e parte do que chamamos de “verdades humanas”. O que nos define e mobiliza são esses cinco aspectos.
“Às vezes, temos formas de expressar cada um desses temas, que é diferente, mas percebemos um equívoco ao confundir forma com conteúdo”, ressalta Cecília.
“O grande desafio, hoje, é falar a coisa certa, nos canais certos, para as pessoas certas”, completa Iza.
O que realmente importa: a fase da vida
Ao analisar conquistas profissionais, 48% dos Baby Boomers declararam estar satisfeitos com suas carreiras, contrastando com 31% da Geração Z. Esse dado evidencia que a satisfação não está relacionada à geração, mas à etapa de vida em que cada grupo se encontra. Enquanto jovens buscam afirmação profissional, os mais velhos celebram suas conquistas acumuladas.
A pesquisa ainda destaca a maturidade como fator chave. A Geração Z (50%) ainda se questiona sobre seus objetivos na vida, enquanto apenas 26% da Geração X compartilham dessa incerteza. Isso reflete o amadurecimento progressivo, em que dúvidas se transformam em certezas.
Nos laços afetivos, jovens da Geração Z se mostram mais propensos a buscar novas amizades (44%), ao passo que os Baby Boomers (32%) já consolidaram suas relações. Contudo, a necessidade de conexão se mantém viva: 68% dos entrevistados da Geração Z buscam se relacionar com pessoas de interesses semelhantes, acompanhando de perto a Geração X (69%), provando que a construção de comunidades é universal.
Aplicando os insights ao CX
Outro ponto relevante da pesquisa foi a identificação das marcas favoritas de cada geração. O Boticário, Samsung, Natura e Nike se destacaram em todas as faixas etárias e mostraram que a relevância dessas marcas transcende o conceito de gerações. A transversalidade ocorre porque essas empresas se baseiam em valores humanos universais e adaptam suas expressões para dialogar com diferentes públicos, sem perder a essência.
Para as empresas de consumo e varejo, compreender esses temas é essencial para melhorar o CX. Para isso, existem algumas ações práticas, como conexões autênticas. É importante investir em narrativas que evoquem pertencimento e autenticidade. A marca O Boticário, mencionada no estudo, é um exemplo de como a valorização da diversidade e da inclusão pode ressoar com públicos variados.
É essencial pensar também nas experiências personalizadas. Personalizar a comunicação e os serviços com base nos valores estruturantes, e não na idade, permite que os consumidores se sintam verdadeiramente compreendidos. Além disso, é importante promover a comunicação intergeracional. Mensagens que promovam solidariedade e união entre diferentes grupos etários têm maior potencial de impacto.
Segundo Cecília, é necessário, cada vez mais, entender as pessoas e as múltiplas plataformas que elas utilizam. “Como eu mobilizo as pessoas através de cada uma dessas formas de acesso? Tem algo de personalização e um saber do que faz sentido para aquele grupo de pessoas. Não quer dizer estar em todos os lugares, para todo mundo. Assim, a personalização se torna ainda mais importante. Conhecer pessoas e customizar essa entrega é fundamental. Quanto mais múltiplo você fica, mais você tem que entender ou outros”, destaca.
Macrotendências: um olhar para o futuro
O estudo também destaca seis macrotendências que moldarão o comportamento do consumidor nos próximos anos:
- Afirmando nossa liberdade: consumidores buscam flexibilidade e autenticidade, rompendo com estereótipos;
- Remodelando o amor: novos modelos familiares e relações intergeracionais estão em alta, promovendo diversidade e inclusão;
- Em comunhão com o todo: enquanto a individualização tem causado diversos impactos na saúde mental de todas as gerações, é urgente reencontrar um senso comunitário ao redor do conceito de cuidado;
- Apostando na longevidade: uma visão mais lúcida sobre longevidade aliada aos novos avanços tecnológicos e pesquisas científicas, gerando comportamentos mais livres, focados no presente e no prazer;
- Todos pelo planeta: a sustentabilidade não é uma tendência, mas uma necessidade urgente. Marcas comprometidas com o meio ambiente terão vantagem competitiva;
- A era das ebulições: a preocupação com o futuro se tornou algo imprescindível para entender o impacto das ações hoje para as gerações futuras, e desenvolver uma sociedade engajada na promoção da inclusão intergeracional pode representar oportunidades de investimentos e inovação.
Essas tendências revelam que o consumidor contemporâneo valoriza marcas que se alinham a seus valores mais profundos, e não apenas às suas necessidades imediatas.
Oportunidades para o varejo
No setor de varejo, aplicar os insights do estudo pode transformar a experiência de compra. Espaços físicos e digitais devem ser projetados para promover pertencimento e conexão. Campanhas publicitárias podem explorar narrativas que englobam diferentes idades, mas que ressoem com valores universais.
“Existe um lugar de romper com tantos estereótipos que fomos criando, que geram falta de identificação e distanciam as marcas que tentam ser muito clichês”, pontua Iza.
O estudo é um chamado para que as marcas abandonem rótulos limitantes e abracem uma visão mais inclusiva e conectada. Na prática, isso significa colocar os temas estruturantes no centro de suas estratégias de CX, reconhecendo a humanidade compartilhada entre diferentes públicos.
Em um mundo onde a fluidez é a norma, as marcas que conseguem traduzir valores universais em ações concretas não apenas atendem às expectativas dos consumidores, mas também constroem relacionamentos duradouros. Afinal, na era do marketing de estilo de vida, a verdadeira conexão está em reconhecer o que nos une – e não o que nos separa.
“Ouse inovar, pensar fora dessas caixas, reconstruir e repensar um pouco as estratégias, até por uma discussão da longevidade da sua marca e da relevância”, afirma Iza. “Uma das coisas que temos mais dificuldade é entender que isso é mudança na estrutura. Quando fizemos esse estudo, entendemos que isso afeta o produto, o serviço da empresa, as campanhas, a comunicação, a narrativa, o desenvolvimento etc.”, comenta Iza. “O grande desafio da longevidade, numa população que tende a envelhecer é ter uma intergeracionalidade interna das marcas. Quando falamos de idade, isso requer pensar internamente”.
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