Muito vem se discutindo sobre as novas gerações: como pensam, o que comem, o que creem, como se reproduzem. Uma curiosidade está aguçando a todos sobre como os nativos digitais irão impactar o futuro, como constroem suas moralidades, realizam sinapses e como irão abalar os sistemas.
Entendo que sim, esse grupo é diferente, mas tem uma questão a ser levantada: você não precisa de tantos estudos para entender esses grupos, eles estão aí perto de você, possivelmente dentro de um quarto na sua casa, convivendo em festas familiares ou estagiando na sua empresa.
O que percebo é uma grande preguiça das gerações mais velhas de sair da zona de conforto e se aproximar de forma empática desses meninos e meninas. Não queremos ver ao que eles assistem no YouTube ou Netflix, temos apatia para traçar pontes de conexão por meio do diálogo, destituímos o valor deles o tempo inteiro… Já parou pra pensar nisso? Que nós estamos mais propensos a ler um estudo de uma agência “XYZ” do que nos aproximar deles – esses jovens que estão ao nosso lado?
Aquela máxima de que “é coisa de jovem”, querendo aportar inconsistência e superficialidade, já foi uma grande verdade, mas devemos combater (de verdade) esse mantra “pseudofilosófico” que acha que explica tudo e não cumpre a promessa para entender de fato o que está acontecendo a nossa volta.
Não gosto de classificar pessoas aleatoriamente. A Antropologia me ensinou que, antes de tratar do lugar de fala (e os jovens estão ai se expressando à vera), é preciso abraçar o lugar de escuta. Apenas a partir dele poderemos entender e começar a traçar linhas de compreensão complexas e sofisticadas para não cair na armadilha das nomenclaturas rasas.
Um exemplo: estávamos eu e duas amigas (elas possuem filhos adolescentes) em uma brigaderia em São Paulo. O lugar estava lotado e a atendente pediu que pegássemos uma senha. Havia um poste com linguetas de papel numerado destacável no canto do balcão. Uma menina de uns 17 anos estava a minha frente. Ela se atrapalhou com a tira de papel, puxou várias senhas sem parar até que, de repente, olhou para trás como num pedido de salvação e disse “eu não sei mexer nisso para pegar a senha, como é que faz?”.
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Sem pensar muito, tomei o papel de “posso te ajudar”: me posicionei ao lado do cospe senha, ensinei como fazer para destacar o papel e distribuí os números por toda loja. Naquele momento, uma coisa passou pela minha cabeça: se aquela moça não sabia o que era um aparelho de senha é porque ela nunca foi a um banco, aos correios, INSS ou qualquer órgão público tradicional. Confesso que o primeiro sentimento foi de julgamento. “Nossa, na idade dela eu já resolvia tudo da minha vida”, pensei.
Não satisfeita com esse pensamento preconceituoso, parei para pensar e me coloquei no lugar dela. Quem disse que ela não resolve problemas cotidianos? Ela pode ter internet banking, pode resolver qualquer coisa pelo celular e, só aí, eu entendi que talvez quem estivesse atrasada era a loja, que ainda se valia de senhas de papel. Ou, ainda, eu, com meu pensamento antigo, me tomando como referência de duas décadas atrás, quando eu tinha a idade dela!
Os tempos são outros e o exercício da relativização se faz necessário em todos os momentos. Aprender lições com os mais jovens pode ser um caminho frutífero. Em vez de questionar o tempo todo, saiba perguntar, busque o caminho da empatia e pratique. Porque tudo isso é sobre treino. Que tipo de treino você prefere ter?