Muitas pessoas têm receio de que, ao iniciar um tratamento médico, o plano de saúde possa cancelar o serviço contratado. Mas, afinal, um plano de saúde pode cancelar o serviço de pacientes em tratamento?
Antes de responder essa pergunta, vale lembrar que a população brasileira está cada vez mais idosa. Prova disso está no último censo do IBGE, de 2022, que aponta uma mudança relevante na estrutura demográfica do país. O número de pessoas com 65 anos ou mais cresceu 57,4% em 12 anos, representando o maior salto de envelhecimento registrado entre dois censos desde 1940.
Ademais, a população brasileira também está cada vez mais doente. A Pesquisa Nacional de Saúde (PNS) revelou, em 2020, que 66 milhões de brasileiros adultos têm pelo menos uma doença crônica.
Problemas com o plano de saúde
E nesse contingente, está o casal de idosos Chang Der Lin e Chang Hsu Feng Chião, de 80 e 76 anos, respectivamente. No momento eles enfrentam uma situação delicada com seus planos de saúde.
Há anos, eles são beneficiários de um plano coletivo por adesão. Esse plano foi firmado em 2011, quando o casal possuía um comércio em São Paulo.
Hoje, a mulher Chang Hsu Feng Chião tem problemas renais e precisa realizar sessões de hemodiálise três vezes por semana. Se ela deixar de fazer o procedimento, está sujeita a complicações graves, incluindo derrames, infartos e morte súbita.
Já o homem teve Acidente Vascular Cerebral (AVC), a segunda maior causa de morte no Brasil. Mais comum do que se imagina, Chang Der Lin teve o segundo AVC. E depois o terceiro. Hoje ele repousa em um hospital de retaguarda, que oferece um atendimento diferenciado para pacientes com necessidades específicas recebendo cuidados paliativos.
Juntos, eles pagam uma mensalidade de R$ 14 mil ao plano de saúde.
Caso grave
Para agravar ainda mais a situação, no começo desse ano, o casal de idosos recebeu um comunicado, do plano de saúde, exigindo a comprovação de vínculo com a entidade de classe responsável pelo contrato com o convênio. O objetivo da ação seria uma suposta auditoria nos contratos.
Em suma, o propósito era identificar clientes que geram altos custos e demandam tratamentos específicos. A ação da operadora colocou o casal de idosos em uma encruzilhada.
Tudo porque, quando o plano de saúde do casal foi contratado, 13 anos atrás, o vínculo demandado hoje não era exigido. Chang Liang Hui, filha do casal, ainda explica que a operadora nunca procurou a família ao longo de todos esses anos com o contrato ativo. “Todos nós desconhecíamos a necessidade dos meus pais estarem vinculados a uma entidade de classe”.
O advogado Rafael Robba, sócio do Vilhena Silva Advogados, escritório especializado em direito à saúde, esclarece que tal postura das operadoras de planos de saúde não depende da longa relação com o beneficiário. A atenção, segundo o especialista, se voltou para beneficiários que tiveram alta de gastos, e a medida tomada foi exigir a comprovação de vínculo com a entidade de classe do plano coletivo por adesão. No entanto, Robba diz que o vínculo, na hora da contratação, era entre a administradora e a operadora.
Seleção de risco
Rafael Robba argumenta que, decerto, a conduta caracteriza seleção de risco e viola as leis do setor. O advogado, analisando o caso do casal de idosos, explica que, por mais de dez anos, a operadora não exigia comprovação de vínculo com entidades de classe, e os beneficiários não eram submetidos a questionamentos dessa natureza. E reforça que tem conhecimento de casos de pessoas de diferentes idades, que passam por tratamentos considerados custosos, que começaram a receber comunicados dos convênios.
Por analogia, a mudança de abordagem parece ser motivada pela busca desenfreada por redução de custos, de acordo com Rafael Robba. Em outras palavras, isso acaba negligenciando, inegavelmente, a garantia de assistência a pacientes em condições mais críticas.
Dessa maneira, Rafael questiona a ética dessa prática, ressaltando que, no passado, “a entrada livre de beneficiários era uma estratégia vantajosa para os planos, que tinha oportunidade de ampliar a base de clientes e, com toda a certeza, consequentemente, os lucros”.
O que diz a lei sobre seleção de risco?
A seleção de risco é proibida pelo artigo 14 da Lei n.º 9.656/1998, que dispõe sobre os planos e seguros privados de assistência à saúde. “Em razão da idade do consumidor ou da condição de pessoa com deficiência, ninguém pode ser impedido de participar de planos privados de assistência à saúde”. É isso que diz a lei.
A Agência Nacional de Saúde (ANS) proíbe a seleção de risco também em contratos coletivos. Nesse ínterim, tal negação está na Súmula Normativa n.º 27, de 2015. Na época, a autarquia reconheceu que muitas operadoras de planos de saúde estavam cometendo ilegalidade ao recusar a entrada de certos consumidores em suas apólices.
Em outras palavras, até então, as recusas por idade, deficiência e doença grave não eram claramente explicitadas. Mas era comum corretores de planos de saúde receberem claras instruções para não aceitar pessoas com esses perfis. A ANS expôs o seguinte, sobretudo: “As operadoras de planos de saúde são proibidas de praticar seleção de riscos na contratação de qualquer modalidade de plano privado de assistência à saúde”.
Código de Defesa do Consumidor
O Código de Defesa do Consumidor (CDC) proíbe a recusa de prestação de serviços a clientes dispostos a pagar por eles.
Para um plano de saúde cancelar o contrato de pacientes em tratamento, é necessário que haja uma justificativa plausível para a interrupção do serviço. Por exemplo, a falta de pagamento das mensalidades é uma delas. Ademais, outras causas pode ser o descumprimento de cláusulas contratuais por parte do paciente ou até mesmo a exclusão do plano da lista de convênios médicos.
Por isso, o paciente deve estar ciente dos seus direitos e das possíveis medidas legais que pode tomar caso a operadora de saúde cancele injustificadamente o contrato.
A Era do Diálogo
Diante da falta de atendimento adequado nas concessionárias de energia elétrica, a pergunta é: “Qual o futuro do atendimento e da defesa do consumidor sobre o prisma da IA?“
Esse questionamento será debatido – e respondido – durante A Era do Diálogo de 2024, que está na 12ª edição. O evento está programado para acontecer no dia 7 de maio, no Hotel Renaissance, em São Paulo. Seu objetivo é unir vozes para moldar o futuro das relações entre empresas, órgãos reguladores e o consumidor.
Assim, A Era do Diálogo é um espaço onde diversos elos da cadeia de prestação de serviço debaterão soluções para os desafios enfrentados em nível individual e coletivo. Saiba mais em: A Era do Diálogo