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Plano Safra cresce, mas juros altos e reformas fiscais preocupam o agronegócio

Plano Safra cresce, mas juros altos e reformas fiscais preocupam o agronegócio

Especialistas alertam para riscos de endividamento e impacto das reformas fiscais em meio a crédito mais restritivo no campo.

Nesta semana, o governo federal anunciou o maior Plano Safra da história, com R$ 516,2 bilhões destinados à agricultura empresarial para o ciclo 2025/2026. Embora o montante seja recorde, especialistas chamam atenção para o encarecimento das linhas de crédito, causado pela manutenção da Selic em 15% ao ano e pelas novas exigências fiscais que impactam diretamente o setor.

As condições anunciadas acenderam o sinal de alerta entre entidades do agro. A avaliação é de que o crédito está se tornando inacessível para uma parcela dos agricultores, sobretudo os mais alavancados financeiramente. A situação pode se agravar com o atual cenário de transição fiscal e a complexidade da reforma tributária.

As taxas de juros nos últimos dois anos variaram entre 6% e 12% ao ano, dependendo da linha de crédito. Agora, o governo elevou as taxas de juros do Plano Safra 2025/26 empresarial entre 1,5 ponto porcentual e 2 pontos porcentuais, para 8,5% ao ano a 14% ao ano.

Custo do crédito e impacto estrutural

Para Luiz Felipe Baggio, consultor jurídico e diretor de operações na Evoinc, o impacto do crédito caro vai além do momento atual. “Grande parte do agronegócio brasileiro opera alavancado. Quando temos uma taxa de juros real tão alta, o produtor que depende de crédito, mesmo com condições melhores que a média, ainda enfrenta um custo financeiro extremamente elevado”, afirma.

Segundo ele, o ambiente de reformas, como a tributária, a possível mudança no imposto de renda, no Código Civil e nas regras de sucessão patrimonial, amplia os desafios. “Tudo isso afeta diretamente o custo operacional e a atratividade do investimento no Brasil, o que pode pressionar ainda mais os juros”, explica.

Baggio acrescenta que a reforma pode penalizar produtores que não se prepararem. “O modelo de split payment, por exemplo, exigirá uma reformulação do negócio, com revisão de contratos, fluxo de caixa, prazos de recebimento e pagamento. Não basta uma assessoria jurídica convencional: é necessário um planejamento multidisciplinar.”

A visão é compartilhada por Luís Garcia, advogado tributarista e sócio do Tax Group. Para ele, o novo Plano Safra evidencia os efeitos da atual política fiscal. “A recente redução no volume de recursos do Plano Safra, acompanhada do aumento da respectiva taxa de juros, torna ainda mais evidentes os efeitos catastróficos da temerária política fiscal do atual governo. Os visíveis problemas de caixa limitam ainda mais a capacidade de investimento de um setor fundamental da economia, gerando desemprego, inflação e reduzindo a arrecadação futura. Vai se desenhando assim um ciclo vicioso rumo à recessão econômica”, avalia.

Efeitos da política fiscal

O alerta também vale para produtores de menor porte. Fabiano Jantalia, especialista em Direito Econômico, afirma que o momento exige cautela na contratação de crédito. “Apesar do volume expressivo de recursos, é fundamental observar o custo desse dinheiro e o risco de endividamento num cenário de Selic ainda elevada”, explica.

Segundo o Ministério da Agricultura e Pecuária, o Plano mantém juros abaixo dos praticados no mercado, mesmo com a Selic em 15% ao ano. Para produtores enquadrados no Programa Nacional de Apoio ao Médio Produtor Rural (Pronamp), por exemplo, a taxa é de 10% ao ano (aumento de 2 pontos percentuais, saindo de 8% na edição anterior para 10% na safra atual), enquanto no mercado os juros chegam a 18% ou mais. Também houve ampliação do limite de renda bruta anual para acesso ao Pronamp, que passou de R$ 3 milhões para R$ 3,5 milhões, permitindo que mais médios produtores acessem o crédito.

Jantalia reforça a necessidade de regularidade documental e ambiental. “O produtor precisa estar com tudo em dia, CAR, certidões fiscais e regularidade ambiental, para não perder acesso às melhores condições do Plano Safra”, afirma.

Assim, o crédito rural precisa ser acompanhado de estratégia. “O recurso está disponível, mas cabe ao produtor tomar decisões conscientes. O financiamento só cumpre seu papel quando é usado com planejamento e informação”, conclui Jantalia.

Financiamento estável

Por outro lado, mesmo diante do atual cenário de alta da taxa Selic, que alcança 15% ao ano, Welinton Silva, coordenador de Desenvolvimento de Rede da YANMAR South America, fabricante de motores a disel, diz que as taxas de financiamento destinadas aos pequenos produtores se mantêm estáveis, ou até reduzidas. O que, por sua vez, evidencia o compromisso do governo com a produção sustentável e o acesso democrático às ferramentas de mecanização agrícola.

“Mais de 75% do nosso portfólio agrícola é voltado para o público pronafiano, e essa atualização do Plano Safra chega em um momento decisivo”, afirma Welinton Silva. “O mercado está 24% mais aquecido em relação ao mesmo período do ano passado, e o produtor está disposto a investir. Com crédito acessível e taxas como os 2,5% para produtos até R$ 100 mil, conseguimos ampliar o acesso à mecanização e entregar soluções reais para o campo.”

Taxar LCIs e LCAs 

Outra nova proposta do Governo Federal de taxar os rendimentos de Letras de Crédito Imobiliário (LCIs) e Letras de Crédito do Agronegócio (LCAs) também tem gerado preocupação entre especialistas. O impacto pode ir além do mercado financeiro, atingindo diretamente o bolso do consumidor e toda a cadeia produtiva do agronegócio. “Essa medida pode desestruturar o financiamento agrícola e afetar toda a cadeia produtiva, do campo à mesa do consumidor”, diz Márcia de Alcântara advogada especialista em Direito Agrário e do Agronegócio do escritório Celso Cândido de Souza Advogados.

As LCIs e LCAs são títulos de renda fixa emitidos por instituições financeiras para captar recursos destinados, respectivamente, aos setores imobiliário e agropecuário. No caso das LCAs, o funcionamento é simples: o investidor empresta dinheiro ao banco, que o repassa em forma de crédito a produtores rurais, cooperativas e empresas do agronegócio.

A Associação Brasileira do Agronegócio (ABAG) manifestou preocupação com a proposta de fim da isenção de IR para investidores de Letras de Crédito do Agronegócio (LCA), demais títulos privados e do FIAGRO.

“A medida, se confirmada, deve comprometer uma das principais fontes de financiamento privado a um dos maiores setores da economia brasileira – que representa ¼ do PIB e 26% dos empregos –, afetando diretamente a competitividade, a previsibilidade e a segurança financeira dos produtores rurais e das cadeias produtivas como um todo”, diz em comunicado.

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