Manter o foco sem organização não é uma tarefa simples, tanto que ler um texto como este, com pouco mais de mil palavras, pode demorar bem mais que os 7 minutos previstos e, ao final, você pode ter que retomar alguns pontos para ter a certeza de que compreendeu perfeitamente.
Isso acontece porque, no mundo contemporâneo, muitas coisas competem por nossa atenção – e algumas delas são interessantes demais para serem ignoradas, como uma nova notificação no celular, a conversa do colega da mesa ao lado e até mesmo o banner com uma promoção imperdível que pisca sem cessar na tela.
A verdade é que a organização é fundamental para conseguir manter o foco e a atenção na execução de tarefas diárias, garantindo, assim, a produtividade. Mas, como fazer isso em meio a tantos estímulos e distrações?
10 estratégias para ajudar o cérebro a manter o foco
Tecnicamente, este texto deveria ser estruturado de forma diferente: as 10 estratégias para manter o foco estariam listadas no bloco final, após você compreender melhor o funcionamento do cérebro e de que forma ele interfere na atenção. Mas, como elas são importantes demais e podem ser utilizadas por você para melhor compreendimento, estão aqui no começo.
As estratégias para manter o foco foram enumeradas pela especialista em neurociência e comunicação Melanie Retz, sócia-proprietária da Brain2B, também professora da Unesp e da Santa Casa de São Paulo.
Leia com atenção e coloque em prática. Depois, entenda por que tudo isso acontece.
1. Alimentação, exercício e sono
Alimente-se bem, pratique atividades físicas e tenha boas noites de sono. A recomendação pode parecer clichê, mas tem embasamento: o bom funcionamento do organismo tem relação direta com uma das redes atencionais do cérebro, a chamada rede de manutenção. “Se você está com fome, com sono, cansado ou indisposto fica mais difícil focar no que é preciso. Nossa atenção depende do nosso corpo”, explica Melanie Retz.
2. Verifique o estado de vigília
Preste atenção ao seu estado de vigília: se você estiver sentindo sono, cansaço ou euforia, tenha certeza, vai ser mais difícil manter o foco. Ajustar a luz do ambiente e dividir as tarefas em metas menores são estratégias que podem ajudar a reduzir o problema e melhorar a concentração.
“Faça blocos menores de foco atencional, com intervalo entre eles. Isso deve ajudar a manter o foco na tarefa. Além disso, é importante observar a luz do ambiente. Lugares escuros demais dão sono”, explica Retz.
3. Faça uma coisa de cada vez
Organize suas atividades e faça uma tarefa de cada vez. Isso deve garantir que a execução tenha mais qualidade e leve menos quantidade de tempo.
“Quando trocamos de tarefa para tarefa, queimamos mais glicose no córtex pré-frontal e em nosso estriado, região do cérebro que faz parte dos núcleos da base. Com isso, nos sentimos mentalmente cansados antes do que quando fazemos uma tarefa de cada vez”, justifica a especialista em neurociência.
4. Controle os estímulos e distratores do ambiente
Diminuir a exposição aos estímulos é outro truque que facilita o foco atencional. “Procure fechar as portas para diminuir o barulho, colocar o celular no modo avião e só checar a cada período de tempo e reduzir o número de janelas abertas no computador. Além disso, evite acessar outros gadgets enquanto executa uma tarefa”, enumera Melanie Retz.
5. Faça intervalos
A cada 40 minutos de trabalho, pare e descanse 5 minutos. Essa pausa ajuda a retomar a concentração na tarefa e descansa o cérebro. “Especialmente em tarefas chatas ou difíceis, que exigem muito esforço mental”, destaca a especialista em neurociência.
Além disso, se a atividade exigir mais tempo de dedicação, a cada 3 ou 4 horas faça intervalos maiores, de 20 minutos cada.
6. Organize o ambiente de trabalho
Organizar o espaço de trabalho, deixando à vista só o que é útil para a tarefa, o que ajuda a manter o foco, uma vez que elimina elementos que competem pela atenção.
7. Organize sua mente
Antes de começar o dia, liste as tarefas e organize-as por prioridade, definindo as que são mais relevantes ou importantes. “Quando você passa para o papel, você consegue liberar espaço na mente e focar no que precisa ser feito”, ensina Melanie Retz.
Outra dica é organizar as tarefas em atividades menores, dividindo-as por etapas. “Quando o cérebro entende que uma coisa é muito complicada, a gente tende a se autossabotar, a deixar para depois. Quando dividimos em metas menores, nosso cérebro aceita mais facilmente e faz com que tenhamos mais foco”, afirma.
Manter uma rotina também é importante e diminui o desgaste do cérebro. Isso porque ao executar tarefas novas, que requerem atenção, consciência, planejamento, raciocínio e estratégia, o córtex pré-frontal, área mais evoluída do cérebro, é demandado, o que exige muito esforço e, consequentemente, acentua o cansaço mental.
8. Gerencie e nomeie as emoções
Raiva, tristeza, ansiedade: essas e outras emoções têm implicação direta no foco. “Por isso é importante identificar e nomear os sentimentos. Ao fazer isso, você traz a emoção para a parte mais racional do cérebro, consegue lidar melhor com ela e também manter o foco”, explica a especialista em neurociência.
Além disso, a aplicação de técnicas de respiração também ajuda no gerenciamento das emoções. “Procure inspirar em quatro tempos, manter os pulmões cheios em quatro tempos e expirar em quatro tempos. Faça isso de quatro a dez vezes antes de iniciar uma tarefa. Essa técnica ajuda a equilibrar o grau de ansiedade e de estresse. Com ela, a gente consegue utilizar melhor o córtex pré-frontal e raciocinar bem”, pontua Melanie Retz.
9. Alterne entre a atenção focada e difusa
Ter momentos de concentração e também de relaxamento é importante para não sobrecarregar a mente e conseguir manter a criatividade. É nos momentos de divagação que o cérebro realiza a conexão de ideias, importante para a realização de tarefas
“Não dá pra ficar focado o tempo todo. Nosso cérebro precisa do movimento sanfona, focar e desfocar. É nos momentos de relaxamento da mente, com atenção difusa, que fazemos as conexões mais amplas, que favorecem o surgimento de ideias e insights”, alerta Melanie Retz.
10. Encontre motivação para a tarefa
O interesse é a maior chave para manter o foco atencional. Por isso, se a tarefa for difícil ou entediante demais, vale adicionar um interesse extra relacionado à sua conclusão, como uma recompensa.
“Pode ser assistir a uma série, tomar um sorvete… A motivação é a mobilizadora da atenção”, afirma a sócia-proprietária da Brain2B.
11. Bônus
Mindfullness, meditação e atividades físicas regulares também podem contribuir com o foco e seus efeitos podem ser sentidos em longo prazo. “Existem muitos estudos que comprovam que essas práticas ajudam muito nos mecanismos atencionais e melhoram o funcionamento do cérebro”, pontua Melanie Retz.
A culpa é do cérebro, mas o problema é seu
O cérebro é o grande responsável pela capacidade de manter o foco. Dentro dele há três redes que funcionam com esse objetivo, as chamadas redes atencionais.
“A primeira delas é a rede de manutenção e está muito ligada ao nosso estado de vigília e ao bom funcionamento do nosso organismo. Se estamos com sono, cansados, com fome, com vontade de fazer xixi… tudo isso interfere em nossa atenção”, explica Melanie Retz, que completa: “Reuniões importantes na hora do almoço, por exemplo, não são recomendadas porque estamos liberando grelina no sangue e o organismo está avisando: está na hora de comer, está na hora de comer. A gente não consegue se concentrar adequadamente”. O mesmo, certamente, vale para reuniões às sextas-feiras, no fim do expediente.
A segunda rede atencional é a de seleção, que trabalha selecionando estímulos do ambiente e direcionando nossa atenção. Assim como a rede de manutenção, ela é involuntária, por isso, não é possível ter controle sobre ela.
“É natural: qualquer estímulo do ambiente chama a atenção do nosso cérebro e atrapalha nossa concentração, pode ser uma luz, um barulho, o cachorro que late, o pedreiro da construção do lado… Por isso, reduzir os estímulos e organizar o ambiente ajuda a focar no que é preciso, a executar uma coisa de cada vez e, assim, aumentar a produtividade”, ensina a professora.
Já a terceira rede de atenção – chamada executiva – é a única voluntária, sobre a qual é possível ter controle. “Ela permite escolher onde vamos depositar nosso foco”, pontua Melanie Retz.
A especialista em neurociência ensina que, quando não conseguimos focar em uma tarefa, entender o quanto ela é entediante ou difícil e traçar estratégias para manter a atenção é uma excelente estratégia. “Tendo essa consciência é possível fazer descansos intervalados ou mesmo buscar uma motivação para o cérebro, como uma recompensa, por exemplo, para conseguir finalizar aquela tarefa e não ficar procrastinando, o que é tendência.”
Mobilizar as três redes atencionais não é tarefa fácil, especialmente em meio a tantos estímulos. Isso porque a busca por informação e por novidade é um comportamento impulsivo natural do ser humano.
“Quando vemos uma novidade, adicionamos no nosso cérebro um sistema de recompensa e sentimos prazer com isso. Com a internet, esse comportamento se acentuou ainda mais. Isso vicia nosso cérebro em buscar novos estímulos e também nos vicia em trocar o foco, mudar de tela, acessar outra coisa. Não à toa, cada vez mais temos dificuldade de ler um texto mais extenso, assistir a um filme mais longo, realizar tarefas mais complexas e que exijam concentração… nosso cérebro fica alternando nossa atenção de uma coisa pra outra”, justifica a especialista em neurociência.
Ficar muito tempo nas redes sociais ou fazer muitas coisas ao mesmo tempo é ruim para nosso cérebro, lógico que às vezes é necessário, mas o cérebro não é multitarefa, nós realizamos melhor uma tarefa de cada vez. Quando alternamos entre uma tarefa e outra há um custo cognitivo, a gente se cansa mais, temos rendimento menor e qualidade pior e tempo maior quando fazemos duas coisas ao mesmo tempo. Fazer uma coisa de cada vez aumenta a produtividade e o foco.
Apesar de o cérebro não colaborar com a missão de manter o foco, encontrar formas de gerenciar a atenção e evitar distrações é fundamental para garantir a produtividade e a execução de tarefas diárias. Do contrário, problemas no trabalho e nos relacionamentos pessoais certamente devem aparecer.
“Sem atenção a gente não registra a informação no cérebro de maneira adequada e, consequentemente, acabamos cometendo muitos erros de comunicação. Quantas vezes você já viu essa cena: alguém fala alguma coisa para uma pessoa que está no computador, ela responde e depois não se lembra?”, pergunta Melanie Retz.
Além disso, o foco é indispensável para a aprendizagem eficiente e sua falta compromete a absorção de conhecimentos e o término de tarefas e acentua a tendência à procrastinação.
+ Notícias
Como a fábrica de memes brasileira ajuda a lidar com os problemas vividos no País