A discussão sobre censura de livros no Brasil preocupa não só os consumidores em geral, mas toda a comunidade cultural e acadêmica. Isso porque, em primeiro lugar, a liberdade de expressão e a diversidade de pensamento são pilares fundamentais para o desenvolvimento de uma sociedade plural e democrática. Ademais, é essencial garantir que obras literárias de diferentes conteúdos e perspectivas possam ser acessadas por todos os cidadãos, respeitando a pluralidade de ideias e promovendo o debate saudável.
E, agora, mais uma nova polêmica sobre a censura de livros no Brasil surgiu, desta vez relacionada à obra “O Menino Marrom”, de Ziraldo. Tudo aconteceu porque a Secretaria Municipal de Educação de Conselheiro Lafaiete, em Minas Gerais, decidiu interromper as atividades que estavam sendo realizadas em sala de aula com os alunos do Ensino Fundamental sobre esse livro. A descontinuação do tema se deu por conta da pressão de alguns pais e mães, que consideram parte do conteúdo “extremamente agressivo”.
Livro de Ziraldo
A determinação da Secretaria ao livro de Ziraldo, publicado pela Editora Melhoramentos, provocou reações entre professores e especialistas, gerando intensa discussão na internet. Enquanto alguns indivíduos apoiam a decisão, outros a consideram preocupante, classificando-a como um ato de censura.
Em comunicado divulgado nas redes sociais, a Secretaria de Conselheiro Lafaiete declarou o apoio à importância do livro, salientando que “a narrativa, lançada em 1986, centrada na amizade entre o Menino Marrom e o Menino Branco, incentiva debates cruciais sobre respeito às diferenças e igualdade”. Entretanto, é finalizada com a seguinte afirmação: “em respeito às preocupações dos pais e da comunidade escolar, optou-se pela suspensão temporária das atividades relacionadas ao livro”.
A censura ao livro de Ziraldo, um dos maiores nomes da literatura infantojuvenil no Brasil, em escolas de Minas Gerais acende o debate sobre liberdade de expressão. Nos comentários, diversas pessoas expressaram sua oposição à decisão, argumentando, por exemplo, que é inaceitável censurar um livro, especialmente uma obra escrita por um mineiro tão renomado.
Impactos da censura de livros
Vale destacar que medidas que visam limitar ou censurar o acesso a determinados livros podem representar um retrocesso no processo de construção de uma sociedade mais inclusiva e tolerante. É fundamental proteger a liberdade de expressão e combater qualquer forma de censura que ameace os direitos fundamentais dos cidadãos. Essa é a visão das entidades do livro do Brasil, que repudiaram veementemente a censura.
No comunicado, seis instituições literárias afirmam que não só a censura do livro “Menino Marrom”, de Ziraldo, mas o recente recolhimento da obra “Meninas Sonhadoras, Mulheres Cientistas”, da juíza Flávia Martins de Carvalho e publicada pela Editora Mostarda, das salas de leitura da rede municipal pela prefeitura de São José dos Campos (SP), são atos inaceitáveis. “São condutas que configuram um claro ataque à liberdade de expressão, pilar fundamental para a democracia e o desenvolvimento de um país”.
Assinaram a nota de repúdio: Associação Brasileira da Indústria Gráfica (Abigraf), Associação Brasileira de Livros e Conteúdos Educacionais (Abrelivros), Associação Nacional de Livrarias (ANL), Câmara Brasileira do Livro (CBL), Liga Brasileira de Editoras (Libre), Sindicato Nacional de Editores de Livros (Snel). No documento, elas dizem que censurar livros é atacar a democracia e a formação de cidadãos e cidadãs. “O futuro do Brasil e o combate às desigualdades sociais dependem do crescimento intelectual de sua população, no qual o livro desempenha um papel imprescindível”.
Liberdade de expressão
A liberdade de expressão é um direito essencial previsto na Constituição Federal do Brasil, no artigo 9º. O dispositivo diz assim: “É livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença”.
A censura de livros, além de infringir a liberdade de expressão, prejudica igualmente o acesso ao conhecimento e à cultura.
Ziraldo nasceu no estado de Minas Gerais, na cidade de Caratinga, no mês de outubro de 1932. Ele faleceu em abril deste ano, aos 91 anos de idade. É um autor consagrado, que contribuiu significativamente, por décadas, para a consolidação da literatura infantil no Brasil e no mundo, conquistando milhões de leitores. Sua obra “Menino Marrom” aborda temas fundamentais, como diversidade e inclusão, que são cruciais para a formação de uma sociedade mais justa e igualitária.
O renomado escritor, desenhista, chargista, caricaturista e jornalista foi um dos criadores do jornal “O Pasquim” e se destacou como um dos principais escritores de livros infantis do Brasil. Sua obra mais famosa é “O Menino Maluquinho”, que também ganhou uma adaptação para o cinema.
Mais livros retirados
Assim como o livro “Meninas Sonhadoras, Mulheres Cientistas”, escrito pela juíza Flávia Martins de Carvalho, realça a importância de fomentar a igualdade de gênero e encorajar meninas a seguir carreiras na área da ciência. A proibição desse livro impede que jovens leitoras tenham acesso a narrativas inspiradoras que podem ter um impacto positivo em suas vidas e escolhas profissionais.
As organizações reiteram seu compromisso com a defesa da liberdade de expressão e com a promoção de um ambiente literário no qual todas as vozes possam ser ouvidas e respeitadas. Seguiremos combatendo qualquer forma de censura e defendendo o direito ao livre acesso à cultura e ao conhecimento.
A obra “O Avesso da Pele”, foi recentemente removida de bibliotecas públicas no Paraná, Goiás e Mato Grosso do Sul. O autor Jeferson Tenório expressou sua opinião nas redes sociais. Ele afirmou que os pais não devem ditar os planos de aula, pois isso é responsabilidade dos professores e da equipe pedagógica.
Tenório também afirmou que essas atitudes autoritárias buscam minar o desenvolvimento do pensamento crítico em crianças e adolescentes.
Após censurado, “O Avesso da Pele” registrou aumento de 1.400% nas vendas da Amazon.
Agenda 2030
O Objetivo de Desenvolvimento Sustentável (ODS) 4 fala sobre o acesso a uma educação “inclusiva, equitativa e de qualidade”. Em suma, esse ODS trata da promoção da igualdade de acesso à educação. Analogamente, ele estabelece a construção de ambientes educacionais seguros e inclusivos e valoriza o papel dos educadores.
Em outras palavras, o ODS busca garantir oportunidades de aprendizagem ao longo da vida para todos. E, para isso, se faz necessário a criação de programas de capacitação para docentes e a promoção da educação para o desenvolvimento sustentável. Concretizar tais metas requer o engajamento de governos, instituições educacionais, sociedade civil e setor privado em ações colaborativas e estratégicas.
A Organização das Nações Unidas (ONU) emitiu um alerta sobre a censura de livros. De acordo com Farida Shaheed, relatora da ONU, no Brasil, os temas mais comumente censurados estão relacionados a questões de gênero e sexualidade. Segundo ela, isso ocorre frequentemente para disseminar o pânico moral com base em notícias falsas.
O relatório também reúne informações sobre censura a livros por governos ao redor do mundo. Farid Shaheed apresentará o documento aos governos membros do Conselho de Direitos Humanos da ONU durante uma sessão de julho próximo.